Nascido no ano letivo de 2005/2006, o mestrado integrado em Bioengenharia (MIB) da Universidade do Porto (UP) foi, na altura, um projeto pioneiro. O curso de cinco anos foi criado através do trabalho conjunto da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) e conta com a participação de vários departamentos destas duas instituições, tendo em vista a preparação de futuros engenheiros biológicos e biomédicos.
Apesar do curso ser recente, a Universidade do Porto desde cedo se mostrou atenta a esta área do saber. Em 1989 foi inaugurado o Instituto de Engenharia Biomédica (INEB), um ano depois de a UP ter organizado a primeira Conferência Nacional de Engenharia Biomédica do país.
Alexandre Quintanilha, professor do ICBAS, foi um dos fundadores do MIB e é, atualmente, um dos diretores do curso, juntamente com Luís de Melo, professor da FEUP. O cientista explicou ao JPN que, tanto o ICBAS como a FEUP colaboram há muitos anos na aplicação da engenharia à medicina e à biologia. “Face a isto, era natural que avançássemos para a ideia de um curso de nível pré-graduado”, atenta.
Um curso multidisciplinar
O MIB inicia-se com um tronco comum de dois anos, após os quais os alunos optam por um de três ramos: Engenharia Biomédica, virado para a conceção de próteses e outros dispositivos médicos e biónicos; Engenharia Biológica, focado nos materiais naturais para fins farmacêuticos, alimentares ou cosméticos; e, por fim, a Biotecnologia Molecular, preocupada em desenvolver produtos de base atómica.
Rodrigo Soares foi um dos 60 estudantes que ingressaram, este ano letivo, no MIB. Durante o secundário, o jovem sempre teve em mente candidatar-se a Medicina, mas a nota de ingresso fez com que acabasse por enveredar pela Bioengenharia. Contudo, Rodrigo não demonstra estar arrependido. “Estou a aprender os mecanismos que fazem os mais diversos fenómenos acontecer, no sentido de tornar a vida mais fácil e eficiente”, explica.
Pedro Costa, aluno do 3.º ano, também se encontra satisfeito com o curso. Devido ao gosto pela biónica, escolheu o ramo da Engenharia Biomédica e confessa que o mestrado integrado tem superado as suas expetativas. “Há quem julgue que este curso é semelhante ao de Medicina mas não tem nada a ver. É engenharia pura”, afirma.
Já Francisco Coelho, aluno do 3.º ano do ramo da Biotecnologia Molecular, entrou neste curso porque “não tinha uma ideia perfeitamente definida sobre aquilo que queria seguir”, o que o levou a apostar no MIB pela sua multidisciplinariedade. Francisco ressalva ainda a dificuldade do curso, que se está a mostrar mais trabalhoso do que aquilo que imaginava. “Às vezes não temos noção do quão profundo cada área pode ir”, confessa.
Este país é para bioengenheiros?
O facto de o curso ainda ter poucos anos de vida faz com que ainda haja muitas incertezas relativamente à existência de emprego para os futuros bioengenheiros. Apesar da Bioengenharia ser uma área em expansão à escala global, nenhum aluno se arrisca a dizer que terá espaço no mercado de trabalho e quase todos apostam em trabalhar no estrangeiro, para combater a falta de investimento neste ramo, em Portugal.
“Já ouvi dizer que dificilmente vamos arranjar trabalho em Portugal”, lamenta Francisco Coelho, que não descarta a ideia de trabalhar fora do país. Nuno Leitão, finalista do mestrado, no ramo de Biotecnologia Molecular, também concorda que Portugal se encontra atrasado nesta área. “Eu vejo imensas empresas de biotecnologia molecular, mas pouquíssimas no nosso país”, refere o estudante, que destaca a Suécia, a Noruega, a Dinamarca e a Alemanha como os países mais promissores.
Alexandre Quintanilha culpa a mutabilidade do mercado de trabalho, que faz com que seja muito complicado delinear se é possível oferecer emprego a todos os estudantes do curso. “Aquilo que hoje permite atrair grandes empreendimentos, muda com uma rapidez enorme”, refere o professor catedrático, que prefere valorizar a capacidade de pensar dos jovens, esperando que estes não tenham medo de seguir por caminhos novos. “Eu não estou envolvido neste curso com o objetivo de garantir que haja emprego”, esclarece.
Maioria dos bioengenheiros opta pelo doutoramento
No ano passado, saiu a primeira fornada de bioengenheiros do curso. Os cerca de 20 formados que acabaram o mestrado integrado estão, na sua maior parte, a fazer doutoramento com bolsas de investigação, sendo poucos os que já estão empregados.
Joana Xavier foi uma das primeiras formadas no MIB. A bioengenheira encontra-se a tirar doutoramento através de uma bolsa mista com a Universidade do Minho (UM) e a instituição alemã European Molecular Biology Laboratory (EMBL). Joana revela não estar arrependida de ter tirado o curso de Bioengenharia na UP, pois considera-o bastante abrangente. “Temos bases de engenharia que são muito boas para nos diferenciar no mercado”, refere a ex-aluna do MIB, que considera que o curso só não é viável “para quem não quer sair do país.”
Inês Pinho foi outra das finalistas do curso, no ano passado. Hoje encontra-se a trabalhar na fábrica da Nestlé, em Avanca, onde é responsável pelo controlo de qualidade dos produtos. Apesar de achar que Portugal ainda se encontra atrasado em relação aos outros países nesta área, tem esperança que o contexto possa melhorar no futuro e também se mostra satisfeita com as bases que os estudos lhe deram. “O curso deu-me alguns conhecimentos teóricos que agora estou a aplicar naquilo que desempenho e desenvolveu-me algumas ferramentas que me permitem ter novas aprendizagens”, afirma.
Apesar das incertezas dos estudantes e mesmo daqueles que já terminaram o curso, Alexandre Quintanilha tem esperança na aposta na investigação por parte do país. “A nível científico, há 20 anos estávamos na cauda do mundo e hoje estamos, mais ou menos, na média europeia”, diz o cientista, que tem apenas receio de que, “devido à crise que estamos a atravessar, possamos retroceder um pouco em relação àquilo que já conquistamos”.