“É uma forma muito superficial de limitar o acesso à profissão e à pratica clínica e não acreditamos, de todo, que os argumentos apresentados sejam válidos.” É assim que Francisco Mourão, presidente da Associação de Estudantes da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (AEFMUP), define o anúncio do bastonário da Ordem dos Médicos de que está a ser estudada a hipótese da inclusão de um exame de acesso à profissão.
A proposta de José Manuel Silva surgiu na sequência do anúncio do ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, de que o governo está a ponderar uma revisão legislativa para “harmonizar” a lei que regulamenta as ordens e câmaras profissionais.
“Neste momento, temos cursos de Medicina de quatro anos em Portugal e temos alguma reserva sobre a qualificação desses mestres. Têm um primeiro ciclo que não tem nada a ver com medicina, depois fazem um segundo ciclo de quatro anos e saem médicos. É diferente uma formação de quatro anos e uma formação de seis anos”, disse à agência Lusa o bastonário da Ordem dos Médicos. “Queremos analisar essa questão e, se calhar, esta é uma boa oportunidade para o fazermos. É uma análise que vai decorrer do diálogo com o ministério da Economia”, acrescentou.
Até agora não existe qualquer exame de acesso à carreira médica em Portugal e a entrada na Ordem é automaticamente garantida pela detenção de um diploma em Medicina, atribuindo-se às universidades o reconhecimento da validade dos mesmos.
Estudantes consideram a proposta “demagógica”
“A questão prende-se com aquilo que é o argumento apresentado pela Ordem. Em primeiro lugar, é o facto de haver um número excessivo de estudantes de Medicina e acreditam que isso, potencialmente, pode prejudicar a qualidade da sua formação. A solução é óbvia: passa por reduzir o número de estudantes nas faculdades e garantir a qualidade da formação. Estando isto assegurado, não há necessidade para um exame”, defende Francisco Mourão.
Manuel Abecasis, presidente da Associação Nacional de Estudantes de Medicina (ANEM), partilha da mesma opinião. “Consideramos demagógica esta atitude de dizer que vai qualificar a profissão com um exame de acesso”, afirma. “Nós sabemos o que se faz a nível de formação médica, quer a nível nacional quer internacional, e sabemos que não é um exame, num momento único, que permite dizer que as pessoas que o passem têm mais qualidade”, refere.
“Neste momento, quem termina o curso de medicina só o consegue depois de passar por uma série de avaliações. Ninguém termina o seu curso sem ter obtido aprovação em todas as unidades curriculares que lhe conferiram competências e conhecimentos necessários”, argumenta Francisco Mourão. “Não acredito que compita à Ordem, mais tarde, impor uma limitação que vai ser potencialmente desastrosa para os estudantes de Medicina e que nos está a deixar muito preocupados”, reiterou o presidente da AEFMUP.
Manuel Abecasis acrescenta, ainda, que esta medida pode ser considerada uma desvalorização do sistema de ensino médico em Portugal e que a qualificação dos médicos deve ser “integrada nos planos de formação”. “O que acreditamos é que o sistema de formação médica em Portugal está bastante comparável aos restantes países europeus. O que não está totalmente implementado são sistemas de acreditação dos cursos. Já há um plano de uma agência de acreditação, a A3ES, mas ainda não está totalmente aplicado. A garantia da qualidade ainda não está totalmente feita, mas a aposta tem de ser precisamente por aí”, considera o presidente da ANEM.