A luta pela independência de Timor Leste foi longa e nem sempre a cobertura noticiosa portuguesa esteve em cima do acontecimento. Em entrevista ao JPN, Adelino Gomes, ex-repórter da RTP, RDP e do “Público”, que esteve no terreno, como jornalista, várias vezes a partir de 1975, recorda que “foi uma cobertura muito longa, com capítulos muito diferentes”.

Em 1975, altura da auto-proclamação de independência e da consequente invasão indonésia, apenas a RTP enviou equipa para o terreno, para uma “cobertura simplesmente noticiosa”. Foi a primeira vez que Adelino Gomes esteve em Timor. Entre 1976 e 1982 nenhum jornalista português pôde estar lá. “A cobertura era feita em função de informações que chegavam via meios australianos, sobretudo ONG, e também fontes da resistência timorense”, refere Adelino Gomes.

Rui Araújo, jornalista da RTP, conseguiu entrar em Timor no ano de 1982, autorizado por governador e autoridades. Para Adelino Gomes, foi “a primeira vez que o olhar do povo português incide no conflito – até porque ele conseguiu falar com os presos na ilha de Ataúro e conseguiu testemunhos importantes”.

Todavia, entre 1982 e 1991, deu-se mais um período escasso em informações. “As únicas informações vinham de entrevistas feitas aqui em Portugal – até porque a resistência timorense estava na montanha. Até ao massacre de Santa Cruz, era uma cobertura quase em terceiro grau. Nem sequer eram as pessoas que viam, eram pessoas que ouviam dizer e transmitiam “, recorda o jornalista.

“O massacre de Santa Cruz criou muita emoção entre as pessoas, que ainda hoje não sei se foi criada pelos factos ou pelos média. Foi a partir daí que os meios de comunicação começaram a olhar para o que estava a acontecer como uma causa, mas sem saber muito bem aquilo que estavam a escrever”, defende o jornalista.

Foi assim até 1999, quando ONU, Portugal e Indonésia chegam a acordo para o referendo da independência timorense. “Em 1999, é a primeira vez que vários jornalistas portugueses foram para Timor”, diz.

Jornalismo português limitou-se a cumprir a missão de informar

Adelino Gomes é da opinião de que o jornalismo português se limitou a cumprir a sua missão de informar e de relatar o que estava a acontecer e que não teve influência direta na resolução do conflito. “Foram 24 anos de luta, portanto pouco terá contribuído. As pessoas pensam muito no ano de 1999, quando a independência era uma situação já imparável”, refere.

Para Adelino Gomes, não se tratou de uma cobertura causada pelos interesses nacionais. “A situação lá acabou por se revestir de valor-notícia só por si. Daí órgãos como a BBC, a ‘Newsweek’, a ‘Times’, entre outros, terem estado lá.”

Para o jornalista, “Portugal protagonizou um papel importante, não os média”. “Até porque a Constituição defendia que apenas quando todas as parcelas do antigo império português fossem livres é que se podia considerar que havia uma descolonização”, recorda.

Ainda assim, para Adelino Gomes, Portugal desempenhou um pequeno papel. Para o jornalista que viveu esta luta pela independência, a inabalável resistência dos timorenses nas montanhas foi o que deu a independência a este povo. “Se eles tivessem desistido, tanto fazia que estivessem lá todos os órgãos de comunicação do mundo a apoiar e a relatar os acontecimentos”.

A poucos quilómetros da primeira invasão indonésia

Adelino Gomes refere que o momento mais intenso que viveu em Timor deu-se na sua primeira deslocação, em 1975, quando integrava a equipa da RTP. “Primeiro estivémos na ilha de Ataúro, com os militares portugueses. Depois, seguiram-se 10 dias em Dili, que passaram muito rápido. Poucas horas depois de sairmos de Balibo, a 15 de outubro de 1975, começou a invasão terrestre indonésia.”

Nesse momento, recorda o jornalista, ainda estavam em Maligana, a seis ou sete quilómetros. “Vimos o combate à distância e passámos três dias a fugir a pé, até sermos resgatados por um carro que nos levou para Dili. Soubemos lá que os mesmos jornalistas australianos com que tínhamos convivido foram as primeiras vítimas mortais da invasão”.

“O que se passava na altura era que as autoridades indonésias andavam a espalhar internacionalmente que o conflito se prendia com uma guerra civil entre as várias fações dos partidos timorenses. Os jornalistas iriam contraiar esta versão depois de estar no terreno e, por isso, foram mortos”, diz.