Uma pessoa, em idade adulta, tem cerca de cinco a seis litros de sangue a percorrer-lhe o corpo. Numa recolha de sangue para doação, apenas 450 mililitros são recolhidos, menos 10% do volume total de sangue no organismo e uma quantidade que se repõe nas horas seguintes ao ato solidário.

Maria Cruz tem 22 anos e está no 4.º ano na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP). Aos 18 anos, foi dar sangue pela primeira vez. Foi uma decisão consciente mas confessa que também foi “um bocadinho influenciada por uma pessoa mais velha” que também era dador e já lhe “tinha falado bastante nisso”. Sentiu “algum medo porque não sabia bem como é que era”, apesar de sempre lhe terem dito “que não doía nada”.

Natália Oliveira diz que “nunca teve medo de ir dar sangue”, porque não via motivo para tal. É filha de um dador de sangue mas, independemente disso, sempre pensou que, se pudesse, era algo que gostaria de fazer. Por esse motivo, logo aos 18 anos foi a uma recolha de sangue. Agora, com 20 anos e estudante de Audiologia na Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto (ESTSP), não entende por que não existem mais jovens a doar sangue. “Tavez seja um bocado de desinteresse do tipo ‘só acontece aos outros então nunca vou precisar'”, justifica.

Algumas pessoas ainda têm medo e “não lidam muito bem com estas situações médicas de tirar sangue”, nas palavras de Maria Cruz. Depois existem as outras que Maria retrata com o exemplo de uma pessoa sua conhecida que diz: “o sangue é meu, não o vou dar a ninguém, preciso dele”. Estas são opiniões ainda muito assentes em “mitos de que podemos precisar do sangue [e não o ter]”. Natália Oliveira também conhece “muita gente que tem um bocado de receio” de dar sangue, além dos que “não têm peso ou têm outros problemas” que os impedem de dar “porque há medidas muito rígidas quanto a ser dador de sangue”.

Mas o que os leva a ser dadores de sangue? Para Natália, é a vontade de “querer ajudar os outros”. “Se eu precisar, gostava que alguém fizesse por mim ou alguém que eu conheça”, diz. Princípios também partilhados por Maria Cruz, que descreve a dádiva de sangue como “uma sensação de bem-estar” e o “saber que podemos ser úteis” a alguém que precisa.

Apesar de serem jovens dadores, já têm consciência da responsabilidade da dádiva de sangue e da importância de existirem dadores suficientes para assegurarem as necessidades imediatas. Até porque, como destaca Natália Oliveira, “um dia podíamos ser nós a precisar dele e se não houver pessoas a dar o que é que nos vai acontecer?”.

Jovens também fazem doação de medula óssea

Susana Sousa é doadora de medula óssea, mas não só ao nível de inscrição. Aos 21 anos, já salvou uma vida ao doar células da sua medula óssea a um doente que necessitava de um dador compatível. “Foi uma brigada à faculdade fazer uma colheita e eu, como muitos outros colegas, inscrevi-me”, explica. Fez a colheita de sangue e, depois, passado algum tempo, foi contactada pelo Centro de Histocompatibilidade do Norte (CHN) com a informação de que era compatível com um doente e a perguntar se estaria disposta a avançar com o processo. A reação? Não hesitou e, “toda contente, disse logo que sim”.

O objetivo era poder ajudar alguém, principalmente porque é “um processo extremamente complicado” arranjar uma pessoa compatível e, muitas vezes, “nem mesmo a família mais chegada é”. Apesar de ter ficado muito contente com a oportunidade, não esconde que teve um bocado de receio porque “sabia o que era doar a medula, mas não sabia exatamente todo o processo“, que se revelou bastante simples.

Uma doação pode fazer a diferença na vida de um doente e Susana sente-se “uma heroína depois de ter ido doar a medula” e fazer parte “dessa diferença”. “Um bocadinho de nós não custa, não nos faz falta e, realmente, pode salvar vidas”, ressalta.

Luís Fernandes tem 21 anos e está no último ano da licenciatura em Design Industrial na Escola Superior de Artes e Design (ESAD). Na altura em que fez 18 anos estavam a “recolher dadores de medula” na sua zona de residência, tentou informar-se sobre a recolha e descobriu que “não era um processo nada complicado”. Decidiu, então, tornar-se um potencial dador de medula óssea.

A opinião de Susana é que “as pessoas já estão mais sensibilizadas para ajudar” porque “se fala mais no assunto”. Mas Luís pensa que “os jovens estão pouco sensibilizados” para esta doação, cuja sensibilização parece ser feita por fases. “Há alturas em que fazem uma campanha bastante agressiva”, mas depois “ela torna-se outra vez moderada”, explica.

Acima de tudo, as pessoas ainda parecem estar pouco esclarecidas sobre o assunto da doação de medula óssea. Susana Sousa conta que, em algumas ocasiões, referiu que já tinha realizado o processo de doação propriamente dito e “algumas pessoas, às vezes médicos e tudo”, não acreditam que já o tenha feito e ficam surpreendidas.

“O próprio nome não está muito bem esclarecido e, se calhar, não é muito explícito”, pois algumas pessoas ainda pensam que a doação de medula óssea implica algum tipo de intervenção cirúrgica. E não foram raras as vezes em que lhe perguntaram se lhe tinha sido retirado um órgão “ou qualquer coisa que vai fazer falta”. “Eu digo que não e que as células que me retiraram não me fazem falta”, conta.

Susana esclarece que a recolha feita na doação de medula óssea “é uma coisa que se renova”, que “não faz falta, porque se fizesse eles nunca iriam retirar-me a mim e prejudicar a minha vida”. E como refere Luís Fernandes, quem faz doação fá-lo por gosto, baseado na premissa de ser “feliz por estar a ajudar outra pessoa”.