Que vos passa pela cabeça nos cinco minutos em que esperam o metro? As reflexões que se podem fazer nesse curto espaço de tempo foram o ponto de partida para Nuno Cardoso criar “Porto S. Bento”. Esta peça de teatro é feita por moradores do Porto, com pouca ou nenhuma experiência em representação, que se basearam nas suas próprias vidas para criar personagens e improvisar diálogos.

O projecto, da associação cultural Ao Cabo Teatro, e inserido no programa Manobras do Porto, começou a ser pensado há um ano. “A ideia era criar uma partitura sobre os cinco minutos em que as pessoas estão à espera do metro, o que lhes passa pela cabeça”, começa por descrever Nuno Cardoso.

E para retratar o tempo de espera, o encenador quis “voltar aos teatros de rua, com não-actores”. “Por que não lançar um repto às pessoas que usam, mesmo, o metro para, de alguma forma, recriarmos uma história sobre esses cinco minutos em que elas pesam a sua vida?”

“Os não-actores”

Assim, “Porto S. Bento” é representado por 15 moradores da cidade do Porto, com a grande maioria do elenco a ser composta por pessoas que nunca representaram ou que não têm qualquer formação artística profissional.

O trabalho desenvolvido com estes “não-actores” permitiu criar uma narrativa e personagens a partir de improvisações baseadas na história real dos próprios participantes. “Começou por algo muito simples como: ‘Gosto de tomar café num determinado local’, até chegarmos a um personagem”, recorda Ana Sousa, uma das integrantes da peça.

Neste ano lectivo, esta professora de 31 anos não ficou colocada e criou um projecto de visitas guiadas não-oficiais para turistas que ficam em “hostels” da cidade. Também na peça, Ana Sousa é uma guia turística, e está à espera do metro, muito cansada. “Estou a fazer estas actividades com os turistas todos os dias e o Verão foi muito intenso. Eu quase não dormia”, explica.

O teatro cria uma comunidade pensante

Ana Sousa já teve experiências anteriores em teatro e reconhece que os encenadores têm tido paciência com todo o elenco, que acaba por “entrar um bocadinho no espírito de brincadeira”.

Para outra das participantes, Maria de Lurdes, os encenadores auxiliaram na dicção e na postura. “Eu entrei, nas primeiras vezes em palco, tipo vassoura: hirta, dura!” Com 67 anos, Maria de Lurdes, que sempre viveu no Porto, nunca tinha representado. “Temos uma preparação no início de cada ensaio”, para descontrair. “Ajuda imenso para quem não tem prática nenhuma, que é o meu caso”, conta.

Nuno Cardoso admite que o trabalho com estes participantes “é substancialmente diferente”. Contudo, destaca que, “ao fim de cada ensaio, se cumpre a função base do teatro, que é criar uma comunidade pensante, connosco e com as pessoas que nos irão ver.”

A criação dessa comunidade já foi trabalhada com os actores integrados numa situação real. A estreia da peça foi antecipada com três performances realizadas na estação de metro de São Bento, na qual os actores contaram aos utentes a história das suas personagens e, consequentemente, um pouco das suas.

“Porto S. Bento” estreia no dia 18 de Outubro, no Teatro Nacional São João, e vai estar em cena até dia 28.