A roupa é lavada à parte, têm talheres diferentes, os lençóis e as toalhas de banho não podem ser partilhados. Esta ainda é a realidade de muitas famílias onde existe um membro infetado pelo VIH (vírus da imunodeficiência humana). O desconhecimento relativamente aos meios de transmissão da doença é um dos principais motivos para a discriminação e há ainda um longo caminho a percorrer nesse sentido. Muitos casais seropositivos, por exemplo, acham que por serem ambos portadores da doença já não precisam de se proteger, mas o uso do preservativo, mesmo nestes casos, previne a reinfeção e a mutação do vírus.

O VIH continua ainda a estar associado a determinados grupos como é o caso dos homossexuais, dos toxicodependentes ou dos profissionais do sexo. Efetivamente, os números revelam que a maioria dos casos aparece nos referidos grupos, mas qualquer pessoa que tenha um comportamento de risco pode estar sujeito à infeção.

Associação Abraço apoia 70 famílias

A Associação Abraço é uma das que luta diariamente contra essa rejeição. Atualmente, apoia cerca de 70 famílias, mas novos casos aparecem todos os dias. A ajuda passa não só pelo apoio às pessoas infetadas mas também pelos afetados, ou seja, familiares e amigos. Além das questões diretamente relacionadas com a doença, a Abraço presta ainda auxílio económico, como no pagamento de rendas em atraso, na alimentação, medicamentos e roupa.

Assistente social na Abraço, Edite Coelho conta que as pessoas descobrem a associação das mais diversas formas: “boca-a-boca, um amigo que diz a um amigo, através dos hospitais que encaminham os doentes para aqui ou por outras instituições”. Aqueles que não se querem identificar optam pelo contacto telefónico para tirar dúvidas – a maioria dos casos, porque tiveram comportamentos de risco.

“São os únicos que não me apontam o dedo”

Maria (nome fictício) tem 39 anos e foi infetada pelo marido. Sente diariamente a discriminação, por isso opta por se esconder. À semelhança de muitos infetados, a utente confessa que prefere fechar-se em quatro paredes, e que o seu maior apoio “é a família”, conta. Contudo, encontrou na Abraço “uma grande amizade” – “são os únicos que não me apontam o dedo”, afirma. Apesar do choque inicial e da reação abrupta, no início, Maria não sente grandes mudanças no seu dia-a-dia. Continua a viver com o marido e com as duas filhas seronegativas.

Edite Coelho afirma que os casos mais complicados de gerir são os que envolvem crianças e adolescentes. “Temos agora o caso de três adolescentes que já nasceram seropositivas mas que ainda não sabem. Como é que se diz a um adolescente que tem VIH? É muito complicado”.
A assistente social fala ainda de uma criança que, depois de ter sido descoberto que era portadora do vírus, foi rejeitada pelos pais dos outros alunos – que exigiam a sua expulsão.

Desde a década de 80 foram registados em Portugal 42 350 casos de infeção por VIH. Nos últimos cinco anos surgiram dez mil novos infetados.