Eduardo Vasconcelos tem 57 anos e é um autêntico Pai Natal. A voz corresponde ao imaginário dos mais novos e a barriguinha também. As barbas são emprestadas, mas a dedicação às crianças é genuína. Quem tentasse adivinhar, não diria que este é o primeiro ano em que faz do conhecido velhote de barbas brancas. Mas por baixo dos óculos e do aspeto fofinho, esconde-se um desempregado descontente com a situação do país e praticante de karaté.

Muito não se sabe sobre este Pai Natal que alegrou as vidas das crianças desde o início do mês num shopping da cidade. Fotografias para lá e fotografias para cá, pedidos e mais pedidos, perguntas difíceis de responder… e a santa paciência de Eduardo, que se tornou o amigo imaginário com que muitas crianças sonham durante o resto do ano, quando respondeu a um simples anúncio de emprego.

O pai, avô e desempregado, que ensina os miúdos a comer a sopa

“É fantástico! Querem mexer na roupa, nas luvas, na barba… é um formigueiro terrível”, conta, com um sorriso. Mas garante que não é tarefa difícil: “Basta colocarmo-nos no lado das crianças”, aliás, “é essa a posição que devíamos tomar sempre na vida”, aconselha o Pai Natal Eduardo.

Este Pai Natal não veio da Lapónia, mas de Gaia. Vive de trabalhos temporários, já que “arranjar emprego a sério parece impossível”, depois de ser dispensado de uma carreira na área comercial. “Estamos num país terrível, entregue à bicharada. Quando uma pessoa tem determinada idade, não tem a mínima hipótese de ter emprego”. Por isso, era essa a prendinha que escolhia para o próprio sapatinho. “Para mim, mudava muita coisa”, garante.

Com um netinho e cinco filhos, que vão dos 13 aos 32 anos, as crianças não são novidade para ele e o papel de Pai Natal, já o assumia lá por casa. O que o motivou essencialmente foi o dinheiro, mas, agora, admite que está a ser uma experiência “muito interessante e gratificante”.

Mas a maior vitória é “converter” as criancinhas: fazer com que as que têm medo do Pai Natal deixem de ter e pôr os miúdos todos a comer a sopa, a portarem-se bem ou até a largar a chupeta – os pais agradecem. A adoração pela personagem já se entranhou de tal forma que agora faria o mesmo novamente, nem que fosse como voluntário, como faz José Rocha.

O rapaz de 20 anos que se “apaixonou” pelo Pai Natal

O Pai Natal de Gondomar tem 37 anos, mas já não é novo nestas andanças. Desde os 20 anos que gosta de entrar na pele da personagem: fê-lo porque “teve de ser” e apaixonou-se “completamente”. Um Pai Natal mais novinho, que não passa despercebido, com uma barriga “de aluguer” e uma barba a sério, cerrada e preta, escondida entre a postiça, branca e fofinha.

Os pedidos dos mais pequenos

Paz e amor ou felicidade são pedidos incomuns para os de tenra idade, mas que de vez em quando lá surpreendem o Pai Natal. “Já tive miúdos a dizer que não queriam nada, que preferiam dar aos meninos pobres. Isso para nós é de arrepiar”, diz José. A palavra “crise” também já lhes começa a ser familiar. “Este ano os miúdos não pedem trezentas prendas, dizem só querem uma. Muitos deles até dizem: se tu não trouxeres não ficamos tristes”.

No resto do ano, apesar de ser trabalhador por conta própria, José Rocha não faz presentes com os duendes. Tem uma empresa de sistemas de tratamento de águas e dedica-se ao hobbie do natal por gosto. “Gosto de estar com os miúdos, ouvir as opiniões que eles têm… às vezes dá para a gente chorar, até”. “Este ano, foi um miúdo, que esteve ali, encostado ao pilar a olhar para mim durante quase uma hora”, conta.

Com duas filhas, de 9 e 3 anos, chegou a tirar fotografias sem elas saberem que estavam ao colo do pai. Mas, em casa, a presença do Pai Natal não é assídua. “Em casa faço à moda antiga: deitamo-nos e de manhã é que abrimos as prendinhas que estão no sapatinho”. É que apesar de ser “apaixonado” pela personagem, na sua infância ela também não existia e José gosta de “manter a tradição”.

Ainda assim, tinha um pedido muito especial para o velho de barbas brancas e acredita que “o Natal tem de ser todos os dias” – a solidariedade não se deve esgotar nesta época.