Ligado à música e à dança desde que se conhece, José Afonso fez um casting para testar a sua qualidade e ficou surpreendido quando foi selecionado para usufruir de uma bolsa de três anos na Northern Ballet School, em Manchester. Há quatro meses no Reino Unido, deixou para trás a namorada, familiares e amigos para viver um sonho há muito esperado. De passagem por Portugal, Zeca, como é conhecido entre os que lhe são mais próximos, falou ao JPN da realidade do mundo da dança.

O jovem gaiense de 17 anos vê na arte “uma maneira da pessoa se exprimir, de aproveitar o momento”. No palco, o ballet consegue mudar a personalidade do ser humano e a prova evidente disso é o facto de que, no dia-a-dia, Zeca sente-se mais extrovertido. Faltam-lhe as palavras quando questionado sobre a importância da dança na sua vida: “Não dá para explicar. É um modo de vida diferente”.

A importância da família

Ao contrário de Billy Elliot, Zeca não teve de lutar contra tudo e contra todos para alcançar o sonho. Contou sempre com o apoio de familiares e amigos, numa arte que “é muito mais que um desporto e que deixou há muito de ser um hobbie”, refere, enquanto recorda os primeiros anos na aventura do ballet

Aos 3 anos, teve o primeiro contacto com a música, na Academia de Música Vilar do Paraíso. Primeiro no piano, mais tarde na flauta. Aos 6, surgiu o ballet e a paixão pela dança. Zeca nunca se sentiu discriminado por praticar uma modalidade de “meninas”, mas admite que, fora do meio artístico, ainda “possa haver um bocado de preconceito”. Em 2013, as pessoas reagem melhor, dão mais atenção, aderem mais e “estão mais disponíveis para aceitar”, acrescenta.

Saudades do sol de Portugal, mas vontade de ir para a Rússia

Desde setembro de 2012 em Manchester, o bailarino já sente saudades de Portugal. A chuva, o frio e o céu cinzento da cidade inglesa fazem com que dê mais valor ao sol e ao calor humano dos portugueses. Apesar da barreira da língua, a oportunidade não poderia ser desperdiçada: “Na dança não é preciso falar muito. É uma linguagem universal. Não poderia desperdiçar esta oportunidade e a bolsa foi uma motivação extra, principalmente porque os cursos de dança são muito caros. De outra forma não poderia ir”.

Os portugueses da NBS

José Afonso, Daniela Pinto e Bernardo Ribeiro fizeram as provas de acesso no Porto, em maio de 2012. Em setembro, juntaram-se a Telma Dunkel (à esquerda), há já dois anos naquela escola. Aprendem com os melhores do mundo e trabalham todos os dias para alcançarem o sucesso

Sobre o futuro, Zeca não tem resposta. Mostra-se indignado com a falta de apoio e de oportunidades que Portugal oferece. Diz apenas: “Se Portugal continuar assim, não devo ficar por cá. Pelo menos, não quero, a menos que a situação melhore”. Não compreende como Portugal desperdiça tanto potencial. Comenta que, em 2012, dos seis portugueses candidatos (ver caixa) à Northern Ballet School (NBS) ficaram cinco: “Em nenhum outro país a percentagem de entrada foi tão elevada”.

José Afonso vê em Portugal um destino para férias: “Pelo caminho que as coisas estão a tomar, acho que ninguém quer continuar em Portugal porque as oportunidades não são muitas”. Reconhece que este país foi um bom ponto de partida, mas quer voar mais alto e atingir o topo. O sonho é concluir o curso e conseguir integrar uma companhia de bailado: “Se possível, na Rússia…mas é muito difícil. Tenho de trabalhar muito”, confessa.