“É verdade. A crise também chegou à vinicultura”. Quem o diz é José Maria Soares Franco, responsável pela empresa Duorum, produtora de vinhos no Douro. O projeto, com apenas cinco anos, já é um caso de sucesso. Marca presença em vinte e quatro mercados e aumenta as vendas de ano para ano.

“É evidente que a crise chegou. Mas a agricultura está diretamente ligada àquilo que é mais indispensável à vida das pessoas, por isso, será o último local onde a capacidade do poder de compra das pessoas será afetado”, afirma.

Também José Maria Calém, proprietário da Quinta do Sagrado, admite a chegada da crise ao setor vinícola. Todavia, para o empresário, os vinhos mais afetados são os mais caros, de maior qualidade: “No ano passado, Portugal aumentou a exportação dos vinhos mais baratos, mas o problema centra-se nos vinhos mais caros. Aí nota-se. Os rendimentos disponíveis são inferiores e, portanto, as pessoas consomem vinho mais barato”, explica.

Vinho do Porto em crise?

“O vinho do Porto tem um pequeno problema”, começa José Maria Calém. “Geralmente, em Portugal era consumido no fim da refeição. Provavelmente o melhor vinho de sobremesa do mundo, seja para o queijo seja para o doce. Mas tem sofrido nos últimos anos com as alterações dos estilos de vida. As pessoas não comem como comiam antes e portanto também não bebem como bebiam antes. E se tem que sacrificar algum dos vinhos que faz parte da sua refeição, o primeiro é o vinho do Porto. Tenderá a ser uma coisa mais utilizada em ocasiões especiais. Para piorar, também não se tem levado o vinho do Porto até às novas gerações.

Soares Franco, da Duorum, chega mesmo a dizer que “as pessoas trocaram os vinhos mais caros por vinhos mais baratos”. E houve ainda “outros consumidores que trocaram os vinhos mais baratos pela cerveja e pela água”.

Oportunidades em tempo de crise

Mas como em qualquer área, a crise também abre novas portas. Os dois produtores de vinho do Douro acreditam que a solução passa por levar o néctar até ao estrangeiro. No entanto, o governo falha nas medidas de apoio ao setor.

Calém, da quinta do Sagrado, admite que o vinho pode ajudar Portugal a sair da crise se “se investir nos mercados lá fora”. Para o vinicultor, “Portugal nunca investiu”. “Há um mito de que os nossos vinhos são muito conhecidos lá fora. Não é verdade. Os nossos vinhos têm falta de notoriedade no estrangeiro, não há nenhum importador ou distribuidor de vinhos lá fora que ache que tenha que ter Portugal no seu portefólio”, garante.

Também Soares Franco admite que os apoios do governo a este nível são escassos: “Sabe-se que o vinho e a vinha são das atividades económicas que podem rentabilizar e melhorar a atividade económica em Portugal, mas no exterior não existe uma imagem de Portugal”, diz. Os estrangeiros “sabem o que é o vinho do Porto, quem é o Eusébio, alguns até sabem quem é a Amália Rodrigues, mas não sabem que existe Portugal, nem sabem que existe o nome Portugal”.

O vinho até pode ser uma oportunidade para o nosso país, mas segundo Soares Franco, esta atividade “não tem sido tão apoiada como devia, em termos de incentivos – quer nacionais quer comunitários”. “A estratégia do Governo está errada, o vinho está na moda no mundo inteiro”, diz Soares Franco. “Seja na América, no oriente… o investimento teria com certeza retorno, na medida em que isto cria emprego, cria valor acrescentado, seria com certeza uma área de investimento com retorno”.

“O vinho está na moda”

A boa qualidade das uvas das duas quintas dá origem a vinhos reconhecidos internacionalmente, como sendo “vinhos de muito boa qualidade”. Isto faz com que os vinhos do Douro tenham uma maior notoriedade. No entanto, José Maria Calém adverte que, na sociedade em que vivemos “as pessoas compram aquilo que lhes metem mais vezes à frente dos olhos e, portanto, há um marketing e uma publicidade que determinam a preferência dos consumidores”. Marketing esse pouco explorado, na perspetiva de José Maria Soares Franco.

Duorum e Quinta do Sagrado são, no entanto, dois casos de sucesso, mesmo com a chegada da crise. As duas empresas cresceram o volume de vendas e estão presentes em vários mercados estrangeiros. Não deixam, no entanto, de referir que o vinho “merecia mais apoio”, principalmente “porque é tudo feito a partir de uma paixão, do gosto e do querer de quem quer fazer coisas da vinha e do vinho”, realça Soares Franco.