“Não é necessário fazer 1000 quilómetros para ser bom jornalista”, esclareceu David Pontes, pouco depois de começar a conferência sobre jornalismo local, inserida no seminário acerca de Jornalismo Especializado, organizado pelo Mestrado de Ciências de Comunicação (CC) da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP).

Certo de que “o jornalismo se faz com as mesmas ferramentas do grande jornalismo”, o jornalista da Agência Lusa disse que basta ir ao bairro São João de Deus ou do Aleixo para se encontrar boas histórias. “A ideia dos jornais era que as pessoas se revissem nos jornais”, disse David Pontes, durante a conferência. O objetivo do jornalismo local é, segundo o jornalista, o de construir uma ligação de proximidade com as pessoas, dar a conhecer o que aconteceu na pequena comunidade, “a notícia do torneio da escola, de quem morreu, de quem nasceu”, afirma.

Mas “ter imprensa e não dar lucros é uma particularidade portuguesa”, disse também David Pontes, sublinhando que esta realidade causou um recuo do jornalismo local. Os cortes no espaço disponível no impresso é um dos problemas que mais afeta o jornalismo de proximidade. Para contextualizar a audiência, o jornalista da Lusa contou que, durante a sua passagem pelo Jornal de Notícias, o diário publicava mais de 100 páginas e que, hoje, esse número está reduzido a 48 páginas. Outro caso é o do jornal Público, que reduziu as 16 páginas de informação local, a uma.

Jornalismo local como vigilante político

David Pontes lamentou o fraco peso que o jornalismo local tem, atualmente, no poder político do Porto. “Sempre fomos muito mais exigentes com a nossa Câmara Municipal”. Durante o mandato de Fernando Gomes como presidente da Câmara do Porto, “o poder político foi muito vigiado pela imprensa”, afirma. O jornalismo local portuense era diferente do de Lisboa, uma vez que no Porto só existe uma esfera de poder político, ao contrário do que acontece na capital.

O jornalismo local nos dias de hoje

Apesar de o panorama ser mais positivo para o jornalismo local online, pelos custos mais reduzidos (quer na produção de jornalismo escrito, quer na produção de audiovisual), David Pontes diz que, para já, o Porto24 é um dos únicos capaz de oferecer informação local, mas que não há fundos para se investir mais em micro-projetos. “Neste momento, não há edições diferenciadas no audiovisual”, salienta David Pontes, recordando ainda os cortes que o Centro de Produção do Norte, da RTP, sofreu nos últimos meses.

O panorama da rádio não é muito diferente. David Pontes disse que algumas rádios locais ainda sobrevivem, apesar de serem poucas e de não conhecer nenhuma. A maior parte das rádios diluíram-se em grupos maiores ou fecharam portas. O jornalista da Lusa referenciou, ainda, a posição Rádio Nova, que considera “uma das mais pujantes” do Grande Porto a nível de informação.

Já no que diz respeito a edições diferenciadas, David Pontes acredita que “partimos [imprensa] para as edições múltiplas muito tarde”, na altura em que toda a imprensa começou a recuar. O Jornal de Notícias e o Público deviam ter investido em publicações diferenciadas, conforme as diferentes localidades, a partir do momento em que a Internet permitiu imprimir em qualquer lado.

No caso de jornais locais, como o “Correio do Minho”, David Pontes diz que “não se produz um jornalismo tão fantástico” e que não se lembra de “ser surpreendido pela primeira página”. Sem uma esfera política forte, os jornais locais não são de capazes de provocar comoção na imprensa nacional.