O Dia Mundial do Livro e dos Direitos de Autor é celebrado a 23 de abril, a data de falecimento de três grandes escritores da literatura mundial: Miguel Cervantes, William Shakespeare e Garcilaso De La Vega, que faleceram no mesmo dia e no mesmo ano, em 1616. Na altura em que viveram, não havia direitos para proteger as suas obras. Hoje, quase quatro séculos depois, os direitos já existem mas ainda não estão protegidos do download.

O que são os direitos de autor?

No código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (2008), todas as obras “intelectuais do domínio literário, científico e artístico” podem ser protegidas por esta lei. Segundo a lei, os autores estão protegidos quando as suas obras são reproduzidas, distribuídas ou plagiadas sem a autorização do autor.

Num contexto onde as pessoas “têm menos disponibilidade para comprar e para pagar”, como diz Manuel Lopes Rocha, que exerce advocacia na área das Telecomunicações, Media e Tecnologia de Informação, o download surge como uma alternativa para se continuar a consumir cultura.

“Se hoje li o que li, devo-o aos downloads“, confessa um dos entrevistados do JPN, familiarizado com a prática, que preferiu não ser identificado. “Não sinto qualquer tipo de remorso ou pesar pela prática frequente de downloads, pelo contrário”, acrescenta.

Segundo Manuel Lopes, no contexto de crise “as pessoas têm menos disponibilidade para comprar e para pagar” conteúdos culturais. Em contrapartida, a Internet disponibiliza com facilidade e sem preço músicas, filmes, e-books e outros produtos culturais. Manuel Lopes Rocha salienta ainda que cada vez “mais gerações de jovens vão nascendo e crescendo sem a perceção da facilidade que há em copiar”.

“Os direitos de autor têm sido mais violados com a Internet, mas também as obras têm sido mais divulgadas”, admite Lucas Serra, assessor da Sociedade Portuguesa de Autores (SPA). Apesar do número de downloads ilegais ter aumentado, Lucas Serra diz que a geração download “vai tendo consciência da ilicitude das suas condutas”.

Direitos de Autor em Portugal

Em Portugal, os autores começaram a proteger as suas obras a partir de 1925, ao abrigo da Sociedade de Escritores e Compositores Teatrais Portugueses. Em 1970, a organização adotou outro nome – Sociedade Portuguesa de Autores – mas ainda se assegura da proteção dos direitos de autor.

Este “cyber-crime” pode ser identificado através do IP dos computadores, mas Manuel Lopes admite que a lei ainda se está a adequar a este novo problema. Adaptar a lei à pirataria “complica-se” uma vez que se trata de lidar com uma rede de computadores e não com objetos físicos.

Enquanto a lei ainda se adequa a este novo inimigo dos direitos de autor, as obras têm sido protegidas através de “ações judiciais e de sensibilização, essencialmente junto das camadas mais jovens”, diz Lucas Serra, da Sociedade Portuguesa de Autores. Mas “não há uma lei especial para online”, sublinha Manuel Lopes, acrescentando que nos casos de pirataria se consideram as mesmas punições aplicadas em casos de violação de direitos de autor, ou seja, sanção máxima de prisão até três anos.

“Não dá para lutar contra a realidade quando ela se impõe desta forma”

“Todo o meu trabalho e discografia… está tudo para download gratuito”, diz Ana Matos Fernandes, conhecida pelos fãs como Capicua, a rapper portuense. “Nos dias que correm [o download] é a melhor forma de fazer com que as pessoas cheguem à música – porque as pessoas vão fazer download de qualquer forma”, afirma. “Sempre achei que fazia sentido oferecer a música para conseguir formar uma base de fãs“, admite.

Perante a realidade de uma cultura que é “sacada”, a rapper Capicua diz que “não dá para lutar contra a realidade quando ela se impõe desta forma”. Os artistas têm de procurar soluções e alternativas para “ir buscar o retorno de outras formas” – quer seja através de concertos ou de parcerias com marcas. No caso de Ana Matos Fernandes, a sua discografia é editada pela Optimus Discos – patrocinada pela marca Optimus, que lhe dá nome – e que segue uma política de disponibilizar a música para download, além de a distribuir em CD para lojas.

E Capicua acredita que o universo do download não traz só “coisas más“. Através do download, a música continua a chegar às pessoas que não têm dinheiro para comprar discos.