“Tem havido algum progresso, mas estamos ainda um bocado longe de poder afirmar categoricamente de que fazemos tudo ao nosso alcance – que é uma coisa repetida constantemente – para minimizar o mal-estar dos animais”, afirma Nuno Henrique Franco, investigador no Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) do Porto, que desde 2008 se dedica à investigação na área do bem estar dos animais de laboratório.

O bem estar animal na Ciência

“Fora da Ciência”, conta Nuno, “o movimento moderno pelos direitos dos animais só começou a partir do final dos anos 70, início dos 80”. Dentro da comunidade científica, no entanto, “nos anos 50 já se tinham estabelecido os três R’s da experimentação animal”: Replace [Substituir – os animais sencientes], Reduction [Reduzir – o número de animais usados], Refinement [Refinar – diminuir a incidência/severidade dos procedimentos]. Isto quer dizer que “as associações de promoção do bem estar animal dentro da comunidade deram saltos muito significativos antes de existir qualquer pressão externa” e, atualmente, “este é um setor muito bem regulamentado”, garante.

“O panorama em Portugal nem está bom nem está mau. Há muita margem para refinar, mas há um progresso e há que ter isso em conta”. E não é por falta de vontade: “Há uma perceção errada do que é o cientista, o investigador”, acredita. Neste momento, simplesmente “não há cultura e meios para fazer melhor, mas esta ideia está a mudar e esta questão tem merecido, dentro da comunidade científica, muito maior atenção”, afirma.

Licenciado em Ensino de Biologia e Geologia, Nuno enveredou por uma segunda licenciatura em Biologia Animal, que o levou ao IBMC, ao doutoramento em Ciências Biomédicas pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) e a este projeto – “O Bem-estar e a implementação de Refinamento em Investigação Biomédica” – , que já lhe valeu uma distinção. Recentemente, foi o vencedor da edição 2013 do prémio “Jovem Investigador da Universities Federation for Animal Welfare (UFAW), um galardão internacional no valor de mil libras.

“Há pessoas que não dão vacinas aos filhos porque foram testadas em animais – isto é grotesco”

Diz que “os animais são como a música”: “Não há ninguém que não goste de ouvir música e quase ninguém que não goste de animais” – é o caso. Apesar do amor que lhes tem, admite que são indispensáveis na experimentação: “Neste momento a única alternativa é parar o desenvolvimento científico e médico. Para muitos isto é, de facto, uma alternativa”. Para Nuno Franco não: “Eu ouço argumentos como: ‘Se nos alimentarmos bem e fizermos exercício, não precisamos de medicamentos’; há pessoas que não dão vacinas aos filhos porque foram testadas em animais – isto é grotesco”, esclarece.

“Os animais em ciência têm de ser eutanasiados. Se assim é, mais vale serem logo”

Assim, dedica-se a ajudar os animais como pode: identificando “o nível de bem estar dos animais usados na investigação biomédica” e contribuindo para o melhorar. Para isso, o investigador de 32 anos escolheu duas áreas de investigação “que usam animais, com modelos completamente diferentes”: a das doenças infeciosas, nomeadamente da Tuberculose; e a das doenças neurodegenerativas, com a Doença de Huntington. Em comum, “o facto de serem doenças progressivas e lentas; do início dos sintomas ao final da vida dos animais podem demorar de semanas a meses”. Isto, garante, “deixa uma margem grande para que se apliquem medidas para melhorar o bem estar dos animais”.

Nova Diretiva

Este ano entra em vigor a nova Diretiva da União Europeia para a regulação do uso de animais para fins científicos. A partir da implementação, estarão envolvidos investigadores, técnicos e entidades reguladoras no planeamento, acompanhamento e avaliação da utilização de animais em experimentação. Nuno Franco acompanha atualmente esta implementação e a avaliação do seu real impacto no bem-estar animal.

Uma das mais importantes, explica, é saber “quando dizer chega”, os chamados “humane endpoints“: “Há que identificar sinais clínicos que sejam preditores indicativos de estados mais avançados e que permitam terminar a experiência logo ali”, ou seja, “os animais em ciência têm de ser eutanasiados [fora exceções, como os animais de companhia]. Se assim é, mais vale serem logo, depois de atingidos os objetivos inicialmente propostos”. E esta, clarifica Nuno, é uma convicção “com base na evidência científica e não ideológica”.

O único feedback de Nuno tem sido o “encorajamento” e as “palavras positivas” e, quem sabe, esta recente distinção pela UFAW possa “abrir novas portas a nível profissional”. “Prognósticos só no fim do jogo”, mas, “independentemente do resultado profissional, foi muito positivo”. “Alguém olhou para isto e percebeu que tinha relevância”, diz.

Agora, é aplicar o que desenvolveu em teoria e tentar perceber quais as “medidas de refinamento que têm ou não um impacto positivo no bem estar dos animais, sem prejuízo da qualidade científica”. Confiante, não teme: acredita que servirão, inclusive, para melhorar “a qualidade dos resultados”.

Notícia atualizada às 03h51 do dia 13 de julho