Entre o doce psicadelismo do holandês Jacco Gardner e o caos sintonizado de Black Bombaim e La La La Ressonance, entre o synth-pop catchy dos Austra e o minimalismo robótico dos Camera, o Milhões de Festa prova por que é considerado uma mina de bandas no que à música alternativa diz respeito. Um verdadeiro vulcão musical em erupção, onde não há lugar para privilégios estilísticos.

E nem é preciso ir muito longe. A junção de duas bandas barcelenses, Black Bombaim e La La La Ressonance, resultou numa experiência musical absolutamente única e imperdível, que será editada posteriormente em formato álbum. Um encontro aguardado por muitos frente ao Palco Vice que, não sendo às cegas, se poderia tornar perigosamente disperso.

Em palco, oito músicos, alguns deles metamórficos – ora percussionista, ora baixista. A limpidez minimal dos La La La Ressonance deixa-se corromper, quase de forma cronometrada, pelo fuzz e pelas distorções dos Black Bombaim, dando lugar a uma viagem cósmica. Libertinagem acentuada pela presença de um saxofone sem tino aparente que parecia sussurrar-nos, em desespero, por entre riffs portentosos.

Cerca de três horas antes – por volta das 20h – o trio de space-rock Papir abria a programação do palco principal diante um pequeno aglomerado de pessoas ainda sentadas e que não fariam jus ao concerto competente. Investidas certeiras nas cordas e nos sintetizadores, devidamente executadas, fazem-nos crer que “Papir III” é definitivamente um álbum a ouvir em 2013.

Já no Palco Vice e com doses avultadas de festivaleiros em correria, as canções garage de Mikal Cronin mantiveram a autenticidade mas cobriram-se de rock n’ roll frenético. Talvez em demasia, já que a dada altura mais não soava do que a uma qualquer banda vulgar de rock de estádio. Contudo não lhe podemos nunca descolar as raízes californianas e a amizade, também ela musical, com Ty Segall.

Não é Miami mas podia ser. O experimentalismo fresco dos portugueses JUBA demorou a chegar à piscina, enquadrando-se contudo no cenário relaxante. Bem mais selvagens estiveram o Yonatan, na guitarra, e o Igor, na bateria. Ainda assim não conseguiram foram poucos os festivaleiros que se levantaram da toalha sem ser para dar um mergulho.

De regresso ao palco principal, Jacco Gardner. Talvez o horário da atuação – demasiado cedo, perto das 22h – tenha sido causa para o pouco e ameno público que o esperava, não fazendo crer que este seria um dos nomes mais aguardados do festival. De ares dóceis, e até infantis, o músico holandês fala das coisas mais banais da vida: do verão, do luar. A guitarra acústica e os teclados, a voz aguda e a reverberação, tudo se combina para revisitar os sonhos e o psicadelismo dos anos 60 – ouve-se Beatles, ouve-se indubitavelmente Syd Barrett. Quem não comprar bilhete para esta viagem, limitar-se-á ao alheamento sem culpa de parte a parte.

Já os canadianos Austra não deixam que tal aconteça. Em pouco ou nada inovadores, mas competentes, arrecadaram alguns passos de dança e aplausos, molhados pela chuva morrinha que entretanto se fazia sentir. Antes das derradeiras atuações de Otto Von Schirach e de o dj set de White Haus, o krautrock sincero dos Camera, trio alemão, voltaria a provocar uma invasão massiva ao palco Vice, embora houvesse também quem tenha preferido esperar pelos italianos Ufommamut, os pesos pesados desta primeira noite.