A National Kapodistrian Universidade de Atenas (UOA) está em atividade contínua desde 1837. Foi a primeira escola de ensino superior dos Balcãs e é a mais antiga do Estado Grego moderno. Esta terça-feira, fechou as portas, depois de terem sido canceladas todas as atividades previstas para o início do novo ano letivo.

Fechou sem aviso prévio. “Houve alguns rumores entre os estudantes, como habitual. Diz-se que se não há professores, não há universidade… mas nunca nada oficial, nem da parte do Governo nem da parte dos professores”, conta Theodoros Markou, estudante de Arquitetura na Universidade de Patras, em entrevista ao JPN.

Contexto

O Ministério da Educação grego anunciou um corte de 25% no pessoal administrativo das universidades gregas. No entanto, o Ministério da Reforma Administrativa já fez saber que é necessário despedir 400 mil destes funcionários em seis anos, segundo o pacto com a Troika. Atualmente são 600 mil. Estes funcionários são suspensos durante oito meses – ou seja, sofrem um corte de 25% no ordenado até que encontrem um novo emprego ou sejam despedidos. Alguns poderão voltar a ser contratados, mas com piores condições e piores salários.

Em causa está o despedimento de professores e técnicos administrativos. Só sexta-feira, 20 de setembro, o Ministério da Educação grego anunciou a suspensão de mais de 1600 funcionários administrativos. Na Kapodistrian, o maior alvo de cortes, são 600. Na de Patra, 153. Em breve decide-se se esta última também encerra por tempo indeterminado.

“O objetivo é impedir os despedimentos, ameaçando o Governo com o fim da educação”, esclarece Theodoros. O sindicato dos funcionários da Universidade de Atenas garante que o que está em causa é a impossibilidade de a instituição funcionar, após os cortes de pessoal. Não há exames, não há cerimónias, não há novos alunos: “Despediram o pessoal administrativo da maioria das escolas, por isso não há ninguém que faça as inscrições dos novos estudantes”, conta.

“Qualquer atividade da Universidade de Atenas” é “impossível”

Esta “insistência” [do Governo] “mina o ensino superior e a nova geração da Grécia”, assim como “a única esperança substancial de superação da crise económica e social, nos próximos anos”, afirma o Senado da Universidade, em comunicado. “Qualquer atividade da Universidade de Atenas, seja administrativa, de ensino ou de pesquisa”, é agora “objetivamente impossível”. Por isso, a Universidade lutará nos tribunais nacionais e europeus pelos seus direitos.

“Com o fecho da universidade, estamos a perder o período de exames de recurso [para quem falhou algumas cadeiras de anos anteriores]”, por exemplo. “Tenho exame marcado para amanhã e não sei se vai ou não acontecer, porque a minha universidade pode simplesmente fechar”, explica Theodoros.

Os gregos? “É como se já se tivessem habituado a este tipo de confusões”

Bruna Cunha está em Atenas desde dia 19. A estudante portuguesa foi para a National Kapodistrian ao abrigo do programa Erasmus e estava previsto começar as aulas esta segunda-feira. “Recebemos um mail da faculdade a dizer que foi cancelado [o ‘orientation day’, para ajudar os alunos erasmus], mas nunca falaram do começo das aulas. À porta há alguns avisos – dizem que como muitas pessoas que trabalhavam na faculdade (pelo menos 150) foram despedidas, ainda não há condições para a abrir e muitos estão agora a fazer greve”, explica.

Mais consequências

Foto: cameliatwu/Flickr
O reitor da Universidade de Atenas falou ainda das possíveis implicações no setor da saúde, já que a universidade, com quatro escolas e mais de 30 cursos, apoia 66 clínicas dos hospitais públicos. A universidade não pode ainda continuar com o trabalho clínico e de pesquisa ou cumprir os seus compromissos internacionais. A seu cargo, a instituição tem ainda 16 museus científicos e educativos, o Jardim Botânico, o arquivo histórico, laboratórios científicos e outras instalações.

“E agora?”. “Pois, não faço ideia! Há pessoas que dizem que até dia 15 de outubro não há aulas, outras que dizem que é até dia 27 de setembro… mas ninguém sabe ao certo”, conta Bruna. Ainda assim, os gregos “estão sempre calmos e tranquilos”. “Mais do que nós, estrangeiros”, diz. “É como se já se tivessem habituado a este tipo de confusões”.

E estão, conta Theodoros, o estudante de Patras. “Os gregos são sonhadores. Acreditam, têm fé e pensamentos utópicos… depois disto calam-se e fingem que está tudo normal. Eu compreendo, a maior parte mal tem dinheiro para sobreviver diariamente. Por isso, se a universidade voltar a abrir, eles vão continuar as suas vidas, só para terminar o curso e conseguir o diploma. É a melhor opção que têm, hoje em dia não és nada sem um grau académico”.

Mas “para quem vive na Grécia, nos últimos anos, é muito importante que tenha uma opinião política desde tenra idade”, explica. “Não que enquanto adolescente, percebas muito do assunto, mas aprendes a perguntar o que se passa por cá”. Por isso, há muitos jovens que não se conformam: “Há algumas ‘festas políticas’, organizadas por grupos dirigidos por estudantes que dão a conhecer a outros estudantes formas de pensamento político, protesto e afins. Muitos dos jovens a frequentar essas festas ficam ‘infetados’ por elas e fazem tudo o que lhes dizem. A pretensão mais comum destes estudantes, neste caso, é a ocupação da universidade, em protesto contra o governo”.

“Está na altura de pagarem pelo que têm feito”

Isso, é o que os professores “querem mesmo”, garante. “Se os professores decidirem ‘atacar’ o Governo e fazer greve, vão perder os salários. Mas se os estudantes ocuparem a universidade, eles serão pagos normalmente. Por isso, os professores queres mesmo que os estudantes o façam. Seriam “dois coelhos de uma cajadada só”: seriam ouvidos e, ao mesmo tempo, não deixariam de receber o salário”, explica.

“Contratá-los? Com que dinheiro?”

“A questão é que nós [alunos] sempre tentámos ajudar os professores mas eles nunca nos ajudaram quando nós precisámos. Isso é egoísta… por isso está na altura de pagarem pelo que têm feito”, diz. Esta é a outra a fação: a dos estudantes “que acreditam que esta é uma luta dos professores e os alunos não se devem meter no assunto”.

Para já, Bruna sabe que hoje vai haver uma manifestação “por parte dos membros da faculdade” – onde pensa que estejam alunos – mas só isso. Theo, como é conhecido entre os amigos, só espera que isto não dure mais que “duas semanas”. Quer “acabar o segundo ano, para começar o terceiro”. “Se pararem com os despedimentos, será possível voltar a gerir a universidade, mas será que isto vai acontecer? Eles despediram funcionários por causa da crise e agora voltavam a contratá-los? Com que dinheiro?”.