No guião da série norte-americana “Alice in Arabia” lê-se que Alice é uma adolescente americana que, após uma tragédia atingir os seus pais, é sequestrada pela sua família da Arábia Saudita e forçada a viver com eles. Alice só pode contar “com o seu espírito independente e inteligência para encontrar uma maneira de voltar para casa, enquanto sobrevive a uma vida por detrás do véu”.

Mesmo antes de se saber o guião, já se espalhavam críticas negativas ao que a série poderia ser, tendo em conta o seu nome. A história, divulgada pelo site norte-americano Buzzfeed, veio confirmar as expectativas dos críticos.

Logo de seguida, a hashtag #AliceinArabia passou a ser um dos “assuntos do momento” no Twitter, pelas piores razões. Resultado: o canal americano não teve outra hipótese se não cancelar a série, alegando que “as reações ao guião” não foram as pretendidas e que “não são favoráveis para o processo criativo”.

O guião da história foi escrito por Brooke Eikmeier, uma antiga tradutora do exército dos Estados Unidos da América que terminou o seu serviço no Médio Oriente em setembro de 2013. Aos olhos da comunidade muçulmana nos EUA, a série não representaria de forma digna a vida da mulher muçulmana no Médio Oriente.

O diretor executivo do Concelho das Relações Islâmico-americanas, Hussam Ayloush, afirmou que se sentiam preocupados, pois, tendo em conta que a personagem principal “sobrevivia por trás do véu”, o guião desenvolvia estereótipos negativos da cultura muçulmana que poderiam resultar em situações como bullying de estudantes muçulmanos.

Depois dos ataques iniciais, a escritora defendeu as suas intenções no Facebook, dizendo que “era suposto dar uma voz aos árabes e muçulmanos na televisão americana”. Coincidência ou não, o avô de Alice, que a teria raptado, chamava-se Abu Hamza, que na verdade é um extremista islâmico que enfrenta acusações por apoiar a Al-Qaeda.

Nem só de Alice vivem os estereótipos

Em 2012, a curta-metragem “A Inocência dos Muçulmanos” foi acusada de ter um conteúdo altamente anti-islâmico. Com 14 minutos de duração, o filme originou protestos em todo o mundo. Com as manifestações, o embaixador americano e dois funcionários de embaixada na Líbia foram mortos. Além disso, em Singapura, após pedido do Governo, o YouTube retirou o vídeo para acesso naquela região e, mais recentemente, o Egito bloqueou o acesso ao Youtube durante um mês. Em fevereiro de 2014, o YouTube foi obrigado a retirar do ar todas as versões do filme.

Em setembro de 2005, o jornal dinamarquês Jyllands-Posten publicou cartoons que satirizavam a figura do profeta Maomé. Flemming Rose, editor de Cultura contactou cerca de 40 cartoonistas e pediu para desenharem o profeta Maomé. O editor de Cultura recebeu 12 cartoons de diferentes autores e publicou-os acompanhados por um texto sobre a autocensura e a liberdade de expressão. Foram feitas várias ameaças de morte e oferecidas recompensas pelo assassinato dos responsáveis, o que fez com que os cartoonistas tivessem que viver escondidos.