Na Praça Coronel Pacheco, escondido entre edifícios, um portão de tinta branca, gasta, quase sempre aberto, poucas vezes é atravessado. “Aqui no Porto temos quatro igrejas distribuídas pelo Grande Porto. Esta é a igreja principal, a igreja mãe. Em termos cronológicos, a segunda é em Lordelo do Ouro, a terceira é na Rua da Constituição e depois temos outra mais pequena, na zona da Maia. A nível nacional são 16 igrejas locais”.

José Manuel Cerqueira é um dos que, todos os dias, sobe as escadas até à sala de culto. Viver da fé e para a fé. Assim se podia intitular o seu caminho. Conjuga a formação como teólogo com a posição de pastor na Igreja Metodista. “A vocação tem a ver com as pessoas com quem nós contactamos e o que elas nos ensinam”.

O futuro traçado

Foi na mesma igreja onde hoje fala aos seus companheiros de fé que, aos nove anos, conheceu alguém que lhe mudaria a vida. Ou melhor: a traçava. “Encontrei aqui, nesta igreja, um senhor inglês que, para mim, foi uma pessoa absolutamente extraordinária. Disse-lhe que queria ser pastor, mas para ser completamente honesto deveria ter dito que queria ser como ele”. A leitura e o conhecimento concluíram o processo. O exemplo ficou sempre.

Naquele dia, aos nove anos, começava o futuro. Algo que hoje seria impensável. As caras jovens na igreja são em menor número e chegam cada vez mais tarde. “Os jovens que temos não são jovens que nos aparecem de repente, que não sabem onde é que devem encontrar a fé ou que têm alguma questão relacionada com a fé e não têm onde ir. O nosso historial é muito mais de nível familiar”.

Para o pastor, estão a renovar-se as gerações, mas a essência e os valores permanecem intactos. “Às vezes, as Igrejas acham que a sua salvação é agarrar nas gerações mais novas, como se os que estão para trás já não interessassem mais para nada. O desafio e a dificuldade é não deixar envelhecer as Igrejas até os jovens se sentirem mal, ao mesmo tempo que não as infantilizamos até os mais velhos se sentirem mal”.

O compromisso

Intemporal permanece também a devoção e a entrega. “Eu acho que a fé não está em crise. São as Igrejas que estão. As propostas eclesiásticas, organizacionais, teológicas, éticas e morais estão em crise, mas a fé não está, de forma nenhuma”. O compromisso não olha a idades, mas as responsabilidades sim. “Os jovens estudam as sagradas escrituras, leem, partilham a sua fé e as suas experiências. Também temos um departamento de jovens com muitas atividades lúdicas, ligadas à fé, retiros, campos de férias…onde se vive intensamente essa dinâmica”.

Nas reuniões religiosas da igreja protestante metodista qualquer um pode usar da palavra. São muito os jovens que sobem até ao púlpito, mas a transmissão não se esgota aqui. “O que nós encaramos hoje é uma transmissão da fé dos nossos jovens para outros, com facilidade. Ao nível académico, da convivência, das diversas atividades é mais fácil falarem que pertencem a uma Igreja diferente e fazerem uma coisa que é própria do protestantismo, que é convidar os amigos para nos visitar”.

A importância da dúvida

Quem vem e escolhe o caminho percorre-o ao lado da dúvida. “Há sempre um momento em que nós vamos para casa muito preocupados connosco próprios, com o sentido da vida, com o sentido das nossas decisões, com o sentido de Deus, da divindade, da Igreja. Agora, o nosso desafio é transformar essa dúvida não numa depressão nem numa angústia, mas sim numa busca constante”.

E a busca não termina, mesmo após a confirmação. O batismo é um dos pilares da crença metodista. Pode ser feito em criança, se assim a família pretender, mas as portas não ficam fechadas. “Se alguém adulto quiser ser batizado nós aceitamo-lo de bom grado. E fazemo-lo tanto aqui, como no rio, se a pessoa assim quiser”.

Para viver com Deus, José Manuel Cerqueira diz que é preciso mais do que sentir. É preciso aprender. “A formação é fundamental para se perceber que o importante é o que está para além dos olhos, para além daquilo que nós vemos”. Sem ver, sem tocar e, muitas das vezes, sem resposta clara. A vida de fé apresenta, para quem a vive, inúmeras incertezas. Mas, desde aquele pensamento aos nove anos, que a firmeza na convicção permanece.