Aos sete anos começou a treinar na escola onde estudava, levado pelos colegas a experimentar. “Na altura, não tinha mesa de ténis. No natal seguinte, os meus pais compraram uma”. Aos 18, já tinha derrotado todos os jogadores portugueses e estrangeiros a atuar por cá. Era altura de Marcos Freitas fazer as malas. “Quando parti, em 2006, seria o número 250/270 do mundo. Oito anos depois sou número 12”.

Hoje, com 26 anos, é o melhor mesatenista da história da modalidade em Portugal. “Quanto mais se ganha é óbvio que a pressão aumenta. Temos que perder menos jogos, ganhar mais, é normal. Ainda sou jovem, por isso, quero trabalhar bem e evoluir”, explica Marcos Freitas ao JPN.

Fazer os japoneses “saltarem da cadeira”

Por entre as várias previsões, uma certeza: à espera da seleção portuguesa estará um ambiente pouco replicável noutras partes do mundo. “Os asiáticos vivem mesmo o ténis de mesa e os europeus nem tanto. Quando há aquelas jogadas longas, os asiáticos geralmente dão saltos na cadeira. Acho que é tradição”, esclarece Marcos Freitas. Para André Silva, esta será a terceira vez no Japão. O ambiente é benéfico para os jogadores e não só para os da casa. “A cultura é completamente diferente. O pavilhão está quase sempre cheio todos os dias, coisa que na Europa não é fácil, à exceção da Alemanha e da França”.

O mesatenista é um dos cinco atletas que compõem a seleção portuguesa masculina de ténis de mesa que se encontra nos últimos dias por Tóquio, na reta final da preparação para o Campeonato do Mundo de Equipas. Competição que Marcos considera “muito difícil”, mas onde Portugal não vai facilitar. “Neste momento somos uma das melhores equipas do mundo e temos a responsabilidade de fazer uma boa prova”, diz.

A prova arranca esta segunda-feira, 28 de abril, com Portugal inserido no Grupo C, juntamente com Japão, França, Grécia, Roménia e Hungria. “O primeiro objetivo é passar o grupo e chegar aos 16 primeiros. Somos a segunda cabeça de série, mas temos como terceira a França e quarta a Grécia, com quem perdemos no Europeu. A partir daí é jogo a jogo. Um resultado brutal seria conseguirmos uma medalha”, confessa Marcos.

Tiago Viegas, vice-presidente para as seleções nacionais, corrobora os objetivos definidos, mas coloca a fasquia mais elevada. “Esta equipa portuguesa já mostrou que tem qualidade para não pensarmos nas suas limitações. Tem batido sucessivamente, ao longo dos últimos anos, todos os recordes do ténis de mesa português. Se chegarmos aos quartos-de-final, não podemos pensar que não será possível chegar mais além. Já temos dificuldades em reconhecer os limites desta equipa portuguesa”, explica.

Ao longo dos últimos anos, Portugal tem tido uma ascensão notória na modalidade. Neste momento, para além de sexta seleção do mundo no ranking ITTF, é a segunda seleção europeia, apenas atrás da Alemanha. “Termos tido a sorte de ter três super-atletas que competem na mesma geração: Marcos Freitas, Tiago Apolónia e João Monteiro, neste momento reconhecidos por toda a comunidade mesatenística mundial”, diz Tiago Viegas.

Londres 2012: o palco dos sonhos

A maioria dos portugueses desconhecia o potencial do país no ténis de mesa até à prestação da seleção nos Jogos Olímpicos de 2012. “Aquele 5 de agosto de 2012 teve 370 mil pessoas a assistir ao Portugal, na Coreia do Sul. Foi o evento dos Jogos Olímpicos com maior audiência em Portugal e onde, finalmente, o país reconheceu a categoria dos atletas que compõem a nossa seleção de ténis de mesa”. Na altura, Portugal fez história ao alcançar os quartos-de-final em Londres. “As pessoas ficaram um pouco surpreendidas com os nossos resultados e acho que começaram a seguir mais. Não digo que somos tão reconhecidos como devíamos ser, mas acho que melhorou depois dos Jogos Olímpicos”, considera Marcos Freitas.

Ainda assim, o reconhecimento em Portugal só chegou mais tarde. Foram os Jogos Olímpicos de 2012 (ver caixa) que catapultaram os mesatenistas portugueses para as luzes do estrelato. “Foi uma questão de justiça”, considera Tiago Viegas, uma vez que “estes são atletas que, ao longo dos últimos dez anos, têm um reconhecimento muito maior fora de Portugal do que no seu próprio país. Portugal tem muito poucas modalidades com atletas da qualidade dos nossos”.

“O futuro é risonho”

“As pessoas apanharam as coisas um bocadinho a meio. Quando se aperceberam que havia qualidade, esta já era muita”. Quem o diz é André Silva, mesatenista que está na seleção de séniores há cinco anos e para quem esta não é a primeira vez num campeonato mundial ao lado dos “três mosqueteiros”. “O André foi uma peça muito importante no último mundial de equipas, há dois anos, quando foi chamado à titularidade em virtude duma lesão do Tiago Apolónia, e correspondeu com grandes resultados e exibições”, relembra Tiago Viegas, vice-presidente para as seleções nacionais.

Expectativas? “Se desta vez estivermos todos bem, acho que podemos melhorar. Da última vez ficámos em 11.º lugar, por isso, se ficarmos nos oito primeiros será um bom resultado”, considera André.

Já para Diogo Carvalho, tudo é novo. Depois de ter conquistado em, março, os três títulos nacionais de ténis de mesa, terá agora a sua primeira participação num campeonato do mundo. Com 21 anos, estar na equipa das três referências do ténis de mesa em Portugal tem um significado especial. “Quando era pequeno, eles já eram muito conhecidos. São três jogadores fora de série e espero ser assim um dia”.

Sair de Portugal para fazer carreira

Para dar o salto na modalidade é preciso também dar o salto além fronteiras. Marcos Freitas, Tiago Apolónia e João Monteiro “tinham um potencial que os levou a emigrar, a jogar os campeonatos mais importantes do mundo”, explica Tiago Viegas. Diogo Carvalho saiu para jogar em Espanha com 18 anos e, ainda hoje, continua por Santiago de Compostela. “Fiz o esforço para subir o nível e estou a ser recompensado”, diz. João Geraldo é outro caso recente: emigrou para a Alemanha para treinar numa das melhores academias da Europa. O próximo será André Silva. Até junho, joga em Portugal, mas na próxima época vai fazer as malas para alinhar por uma equipa francesa. “A quantidade de jogadores profissionais lá fora é muito maior e isso faz subir o nível de um jogador”, refere o atleta.

Quando pegar na raquete e estiver frente a um adversário sabe que tem de estar no seu melhor. “Se eles estiverem no banco e caso jogue, vou estar com um pouco de pressão, mas sei que eles vão estar lá para me apoiar”, remata. Marcos Freitas confirma: “Acho que vai correr bem, ele está a jogar bastante bem. Vamos tentar ajudá-lo a conseguir integrar-se o melhor possível na equipa”.

Para Marcos, o futuro da modalidade não passa apenas pela raquete de Diogo Carvalho ou, até mesmo, de André Silva. “Acredito que, no futuro, continuaremos a ser uma potência, porque somos uma equipa ainda jovem e vêm aí alguns jogadores, que não fazem parte da seleção neste momento, mas que futuramente poderão ser bons jogadores”, confidencia. João Geraldo, Diogo Chen ou Jorge Costa são apenas alguns dos jovens que não deixam dúvidas a Tiago Viegas. “O futuro é risonho. Temos um conjunto de valores que, de facto, asseguram que a qualidade do nosso ténis de mesa não se vai ficar pelos chamados ‘três mosqueteiros'”, afirma.

Ténis de mesa feminino à espera de referências

Leila Oliveira, jogadora da seleção feminina de ténis de mesa, não tem dúvidas. Os portugueses não falam tanto das mesatenistas nacionais, porque “as mulheres ainda não alcançaram os resultados que a equipa masculina alcançou, como a ida aos Jogos Olímpicos”.

Os homens são os porta-estandarte do ténis de mesa português lá fora e, entre mulheres, as naturalizadas de origem asiática são “as que mais se destacam”, refere. É o caso de Fu Yu, atleta portuguesa que não vai poder competir neste campeonato do mundo. Ditam as regras que as naturalizadas ficam de fora nesta prova. Uma desvantagem para as seleções europeias, onde a maioria das “atletas de topo são de origem asiática”, indica Tiago Viegas.

Embora faça questão de frisar que não foi este o objetivo da naturalização da número um do ranking feminino português, o vice-presidente para as seleções nacionais de ténis de mesa admite que há o “risco de as seleções serem mais uma questão de oportunidade do que representar o país e sentir uma camisola”.

Leila Oliveira já viu muitas colegas ficar pelo caminho. “Há uma idade específica nas mulheres em que tem havido uma maior taxa de desistência. Quando começam a namorar, a trabalhar ou a estudar na universidade, por exemplo, o que implica uma redução na carga horária de treino”, explica. Tal como Diogo Carvalho, a atleta foi campeã individual de seniores em março e está altamente motivada para a estadia em Tóquio.

A seleção feminina vai jogar na segunda divisão, num grupo com a Índia, a Itália, a Turquia, a Nigéria e a Bulgária. O primeiro jogo da fase de grupos é com as turcas, esta segunda-feira, às 19h30 (hora japonesa).