Em 1974, o mundo estava de pernas para o ar. Além da conhecida Cortina de Ferro, que dividia o mundo em duas ideologias totalmente antagónicas – o capitalismo, propagado pelos EUA, e o socialismo de Estado, defendido pela URSS -, neste período registou-se, ainda, o início da guerra civil da Etiópia, a invasão da Turquia ao Chipre e a Revolução de 25 de abril, em Portugal.

Apesar do caos que governava o mundo e do clima de tensão existente por todo o globo, fruto da famosa Guerra Fria, não deixou de se realizar o Campeonato do Mundo. A edição de 1974 foi organizada e vencida pela Alemanha Ocidental, de Franz Beckenbauer, Jupp Heynckes, Uli Hoeness, Gerd Muller, Breitner, Overath e Maier.

A RFA ficou no grupo A, juntamente com a Alemanha Oriental (RDA), o Chile e a Austrália. A RDA levou a melhor neste grupo, com cinco pontos em três jogos – duas vitórias e um empate, sendo que a vitória valia dois pontos -, tendo vencido, inclusive, o jogo contra a rival RFA, por 1-0. A RFA também seguiu em frente, com quatro pontos.

No grupo B, composto pela Jugoslávia, o campeão em título Brasil, a Escócia e o Zaire, progrediram os dois primeiros, ambos com quatro pontos. A Escócia somou também quatro pontos, mas não atingiu a fase seguinte, por perder para o Brasil na diferença de golos.

No terceiro grupo, seguiram em frente a Holanda de Cruyff, com cinco pontos, e a Suécia, com quatro. Pelo caminho ficaram a Bulgária e o Uruguai. No quarto e último conjunto, a Polónia e a Argentina garantiram o seu lugar na fase seguinte, com seis e três pontos, respetivamente.

Curiosidades

– O campeonato do Mundo de 1974 foi o primeiro a assistir a uma expulsão. Carlos Caszely, jogador chileno, foi expulso na partida frente à RFA e tornou-se no primeiro jogador a ser expulso numa partida de um Mundial. Recorde-se que os cartões foram introduzidos na competição na edição de 1970.

– Esta edição foi igualmente a primeira a ter uma grande penalidade durante a final. Johan Cruyff, estrela holandesa, foi derrubado por Uli Hoeness na área da RFA, à passagem do segundo minuto da partida decisiva do torneio. Neeskens converteu o castigo máximo e colocou a Holanda na frente do marcador, mas a RFA conseguiu dar a volta ainda na primeira parte por intermédio de Breitner, também de grande penalidade, e de Muller.

– Para o Campeonato do Mundo de 1974 foi instituído um novo troféu. A taça Jules Rimet, até à data a em “circulação”, foi substituída pela taça de Campeão do Mundo da Fifa, que permaneceu até aos dias de hoje.

O carrossel da “Laranja Mecânica”

Nesta edição da prova, foram efetuadas alterações relativamente ao quadro competitivo. Contrariamente aos Mundiais transatos, a fase a eliminar distribuía as oito seleções por dois grupos de quatro equipas. Qualificavam-se para a final os primeiros classificados e para o jogo de atribuição do 3.º e 4.º lugares os dois segundos. No grupo A, a Holanda passeou classe: Venceu os três encontros e totalizou um saldo de oito golos marcados e nenhum sofrido. Pelo caminho ficou o Brasil, campeão em título, que não teve capacidade para suster o carrossel laranja.

No grupo 2, a Alemanha Ocidental, a jogar em casa, também contou por vitórias os três jogos disputados. Coincidentemente, num grupo constituído em exclusivo por seleções europeias, foi o campeão europeu vigente a passear classe e a garantir a qualificação para a final do torneio. Para o jogo de 3.º lugar qualificou-se a Polónia, confirmando o estatuto de grande surpresa da competição. Os polacos estavam de regresso ao Mundial, 36 anos após a estreia, e conquistaram o maior resultado da sua história, batendo o Brasil, no último jogo, por 1-0.

Uma final muito aguardada

Na final defrontaram-se os dois grandes favoritos. A Alemanha, de Beckenbauer, Sepp Maier ou Gerd Muller, e a vertiginosa Holanda de Cruyff ou Neckens. Logo no início do jogo, o “futebol total” dos holandeses rendeu um penalti sem que os jogadores alemães tivessem ainda tocado na bola. Cruyff, o melhor jogador do torneio, encarregou-se de marcar. Do outro lado, fortalecidos pelo fator “casa”, os alemães conseguiram dar a volta ao marcador, com golos de Breitner e de Muller, que, à época, se sagrava o melhor marcador da história dos mundiais. A bola era dos holandeses, mas a taça era dos alemães.

O “carrossel holandês” trouxe o “futebol total2

A seleção holandesa, comandada por Johan Cruyff, foi uma das positivas novidades da edição de 74 do Mundial. Orientada por Rinus Michels, também treinador do Ajax, a Holanda apresentou ao mundo do futebol uma nova filosofia táctica e que marcou uma era: o “futebol total”.

O conceito era simples: rotação constante, trocas de posições, polivalência levada ao extremo. Dentro das quatro linhas, qualquer jogador, à exceção do guarda-redes, acabava por ter de desempenhar as variadas funções. Qualquer elemento que saísse da sua posição era imediatamente “compensado” por um companheiro, o que exigia uma grande polivalência e uma grande capacidade física.

O expoente máximo deste sistema era Johan Cruyff. O avançado holandês raras vezes jogava na posição em que se celebrizou. Vagabundeava por todo o campo e aparecia nas zonas livres. Era um perigo constante para qualquer defesa.

O confronto entre “Alemanhas”

A edição de 1974 ficou célebre pela partida que pôs frente-a-frente a República Federal da Alemanha e República Democrática da Alemanha, os símbolos maiores da divisão ideológica que existia a nível mundial. De um lado, uma potência futebolística, vencedora do troféu por uma vez (1954), finalista em 66 e terceira classificada em 70. A RFA entrou na edição de 74 como favorita ao triunfo, não só pela história e palmarés, mas também pelo facto de ser anfitriã. Do outro lado, a RDA, uma nação famosa pelo seu sucesso desportivo, mas desconhecida em Mundiais de futebol. A RDA era estreante em Campeonatos do Mundo e tinha neste jogo a batalha de uma vida.

O encontro realizou-se a 22 de junho de 1974, em Hamburgo, no estádio Volksparkstadion, repleto de adeptos da Alemanha Ocidental. Apenas 1.500 adeptos da RDA marcaram presença e todos eles foram escolhidos a dedo pelo Governo, que só abriu as portas da deslocação a Hamburgo àqueles de quem tinha certeza da sua lealdade política.

Os 1.500 viajaram de comboio e viram o seu esforço compensado ao minuto 77, quando Sparwasser marcou o golo que deu o triunfo à menos favorita RDA. Apesar da rivalidade política e da grande tensão entre as duas partes, o jogo decorreu sem incidentes de maior e esta foto ficou célebre um pouco por todo o mundo.

O resumo da partida: