O ano de 1990 foi um dos mais importantes na história da Alemanha. Para além de superarem os poderosos argentinos na final do Mundial de futebol daquele ano – que, por sua vez, haviam eliminado a anfitriã Itália – dentro de campo, os alemães conseguiram realizar um sonho ainda mais louvável fora dos relvados: derrubar o muro de Berlim e consagrar a reunificação de um país dividido por dois “universos” completamente distintos.

Mas, como antes da bonança há sempre uma tempestade, foi em clima de Guerra Fria que os alemães chegaram a Itália, país em que os seus “gladiadores” já eram aclamados como favoritos ao título. Para além das duas superpotências futebolísticas, a Argentina e a Inglaterra também prometiam ser fortes concorrentes à taça.

Nem foi preciso marcar

Este Mundial ficou marcado pelo finalista com menos golos marcados numa edição. No caminho até ao jogo decisivo, a Argentina marcou apenas cinco.

Como não podia deixar de ser, os anfitriões começaram em grande. Três jogos e três vitórias logo na fase de grupos, nos quais Walter Zenga não viu a bola entrar uma única vez na sua baliza, estatística que perdurou até às meias-finais do torneio.

Por outro lado, não foi a Argentina – seleção mais forte das quatro – a conquistar o primeiro lugar do grupo B. Contra todas as expectativas, foram os Camarões a fazê-lo. Esbanjando potencial e talento, o plantel africano foi inexplicavelmente goleado pela União Soviética (4-0) no último jogo deste país em Mundiais. Os sul-americanos, que acabaram por chegar a final, mostraram ser portadores de um grande poder defensivo, mas dececionaram muito na frente de ataque. Deste modo, foram os finalistas de Mundiais com menos golos na história do futebol: apenas cinco, a mesma quantidade que Diego Maradona converteu em 1986.

Venceu para nada…

Neste Mundial, a Itália igualou o recorde detido pela Polónia, de 1974, de seleção não vencedora que conquistou mais vitórias. Ao todo foram seis, insuficientes, no entanto, para vencer o torneio.

O Brasil, seleção que, assim como a Itália, era tricampeã em 1990, acabou a fase de grupos no primeiro lugar do terceiro pote. Apesar do domínio absoluto, os campeões sul americanos, comandados por Lazaroni, estavam longe do auge, jogaram na defensiva – algo incomum no estilo de jogo “canarinho” – e caíram, sem surpresas, aos pés da rival Argentina, na fase seguinte.

Sem novidades, a Alemanha apareceu como a grande protagonista do grupo D. As goleadas em cima da Jugoslávia (4-1) e dos Emirados Árabes Unidos (5-1) confirmaram a premissa inicial de que este seria o grupo mais ofensivo do torneio, ao contrário da Itália, que sempre teve um comportamento ultra-defensivo em campo. Na verdade, foi a única seleção que jogou verdadeiramente no flanco de ataque, visto que o Mundial da Itália teve a pior média de golos da história dos torneios (2,21 por jogo).

Em virtude do talento e do show off, num ano de seca de golos de Lothar Matthaus, o alemão destacou-se logo como a grande figura da primeira fase do torneio (três golos). A sua ótima exibição, quer na Itália, quer no Inter de Milão, rendeu-lhe a presença no “All-Star Team” do Campeonato do Mundo, a bola de ouro e o título de melhor jogador do ano.

Não entrava uma!

Walter Zenga ficou 517 minutos sem sofrer golos. O guarda-redes italiano ainda hoje mantém o recorde.

Vale a pena ressaltar também a qualidade da Espanha (Grupo E) e da Inglaterra (F), que terminaram em primeiro lugar nos respetivos potes. Chegava assim o fim da Guerra Fria na Itália e o início da “Guerra Quente”, onde os confrontos diretos entre os supercampeões iriam, efetivamente, começar.

A queda da Argentina e o “Tri” alemão

Para os oitavos de final estavam marcados dois encontros de grande expectativa. O Alemanha Ocidental vs Holanda, que reeditava a final de 1974, e o sempre escaldante clássico da América Latina, entre Brasil e Argentina. No embate europeu, os holandeses, campeões europeus em título, tinham uma oportunidade de ouro para vingarem a derrota na final de 74, mas os alemães, comandados por Franz Beckenbauer, que levantou o troféu como capitão da seleção, 16 anos antes, conseguiram levar a melhor. Ficava pelo caminho o famoso trio holandês do AC Milan que encantou a Europa: Van Basten, Gullit e Frank Rijkaard; vencia o trio alemão composto por Matthaus, Klinsmann e Brehme…que atuava no eterno rival Inter de Milão.

Quanto ao esperado encontro entre brasileiros e argentinos, a celeste levou a melhor, com um golo apotnado por Cláudio Cannigia, que anos mais tarde viria a representar o Benfica. Liderados por Maradona, os argentinos sonhavam com um título que igualaria o número de troféus dos brasileiros – três.

Grandes penalidades decidiram

Os quartos-de-final confirmaram a pobreza, em termos de golos, em que se tornaria esta edição da prova. Alemanha e Itália venceram os seus jogos por 1-0, frente a Checoslováquia e Irlanda, e o encontro entre Jugoslávia e Argentina foi decidido apenas nas grandes penalidades, após um empate a zero golos, no final do prolongamento. Salvou-se o jogo entre Inglaterra e Camarões, que terminou com 3-2, mas em que três dos golos foram apontados…de penalty. Seguiam para as “meias” as três seleções europeias e a Argentina.

Hasta La Vista

Foi o último mundial disputado por três nações que acabaram extintas: Checoslováquia, União Soviética e Alemanha Ocidental. Os alemães despediram-se em beleza com o título mundial.

Nas meias-finais, dois jogos muito parecidos. Alemanha e Argentina chegaram à final da prova com a decisão, nos dois jogos, a ser apenas concretizada nas grandes penalidades, após empate a um golo no final do prolongamento. Pelo caminho ficava a Itália, da forma mais dramática possível e a jogar em casa. Maradona decidia pelos argentinos, a jogar no no seu estádio e na cidade que o acolheu. À data, Maradona era a grande estrela do Nápoles e, em pleno San Paolo, voltou a ser decisivo.

Na decisão do terceiro lugar, a Itália conseguiu vencer a Inglaterra por 2-1 e ficar num honroso lugar no pódio, apesar das expectativas italianas não terem sido correspondidas. Na final, como não poderia deixar de ser nesta edição, apenas um golo marcado…e de penalty. A Argentina acabou o jogo com nove elementos e não teve forças para responder ao golo madrugador de Brehme. A Alemanha conseguia vingar-se da final do torneio anterior e igualava Brasil e Itália com três títulos mundiais. Era a consagração de Beckenbauer como grande nome do futebol alemão.