O Mundial de 2002, disputado pela primeira vez em dois países, trazia à Coreia do Sul e ao Japão um dos maiores leques de estrelas que a prova pôde contemplar: Figo, Zidane, Ronaldo, Rivaldo, Beckham ou Oliver Khan prometiam deixar os asíaticos de olhos (ainda mais) em bico.

Portugal vinha de uma Europeu bem conseguido, em 2000, e de uma fase de apuramento em que deixou pelo caminho a Holanda, um cliente “habitual” da prova. Contudo, a formação das quinas voltou a ficar muito longe do seu potencial.

O grupo de Portugal, teoricamente, nem era dos mais complicados, e a as expectativas de ver brilhar a “geração de ouro” – composta por jogadores como Figo, Rui Costa, Vítor Baía ou João Vieira Pinto – eram muitas. No entanto, o primeiro jogo foi o prelúdio de uma queda inesperada. Frente à menos cotada seleção dos Estados Unidos, os “tugas” – nome atribúido à seleção em 2002 -, cedo se revelaram perdidos num pesadelo que acabaria da pior forma possível. Os norte-americanos venceriam por 3-2 e os alarmes soaram com estrondo nas hostes nacionais. Não havia margem de erro.

Frente à Polónia, Portugal parecia ter afastado os fantasmas de uma nova eliminação precoce num Mundial. A vitória por 4-0, com uma exbição mais condizente com a valia do conjunto de jogadores português, voltou a iluminar o espetro do apuramento. Mas o pior ainda estava para vir. Frente aos organizadores, mas inexperientes, sul-coreanos, Portugal sofre outra derrota. O empate era suficiente para manter vivas as aspirações lusas, mas um golo solitário da equipa anfitriã deitou por terra todos os sonhos da “geração de ouro”.

Para piorar a situação, João Vieira Pinto agrediu o árbitro do encontro, tornando a saída portuguesa do Mundial pouco…”limpa”. A sucessão de acontecimentos pouco abonatórios para a imagem da seleção voltou a avivar as memórias do “caso Saltillo“.

O pior desempenho de um campeão

Nos restantes grupos, a toada de surpresas e desilusões também se manteve. A maior de todas ficou a cargo da França, que teve a pior prestação de campeão do mundo em toda a história. Vencedores em 1998, os franceses foram eliminados num grupo onde a grande surpresa foi a seleção senegalesa, que derrotou os bleus no jogo inaugural da competição.

A outra grande desilusão foi a Argentina, recheada de grandes jogadores, como Véron, Batistuta, Ortega ou Cláudio Lopez. Apesar da qualidade do seu conjunto, a seleção celeste sucumbiu ao mais equilibrado grupo do torneio. Seguiram em frente a Suécia e a Inglaterra.

As melhores perfomances, nesta fase de grupos, pertenceram às seleções do Brasil e de Espanha, vencedores de todos os jogos disputados. Outro dos destaques foi a vitória por 8-0 da Alemanha sobre a Arábia Saudita e o golo sofrido pela Mannschaft, da autoria de Robbie Keane, que seria o único consentido até à final. O guarda-redes alemão, Oliver Kahn, viria a ser considerado o melhor jogador do torneio.

Curiosidades

Fiasco
A França fez a pior campanha de uma seleção que defendia o título: terminou na 28.ª posição (só fez um único ponto);

Vingança
O sul-coreano Ahn Jung-Hwan acabou demitido do Perugia, após eliminar a Itália;

Ligeiro
O turco Hakan Sukur entrou para a história do futebol com o golo mais rápido já feito num Mundial (11 segundos), na disputa do terceiro lugar, com a Coreia do Sul;

Brasil 100%
O Brasil venceu todos os sete jogos que disputou, quebrando o recorde histórico de vitórias em Mundiais. Foi a quarta vez que uma seleção conquistou o título da competição com 100% de aproveitamento.

Um novo futebol

Os confrontos diretos do Campeonato do Mundo da Coreia não foram marcados pela presença de grandes seleções. Muito pelo contrário, foram várias as formações de menor expressão que conseguiram superar os gigantes do futebol mundial, logo na fase de grupos, façanha que voltou a ser repetida pela Coreia do Sul nos oitavos-de-final.

Foi um início atípico para um Mundial da FIFA. Primeiro, a Dinamarca e o Senegal eliminaram os ex-campeões França e Uruguai, no grupo A. Depois, o pouco renomado Estados Unidos foi superior a Portugal, num pote evidentemente favorável para a passagem da equipa das quinas, o que resultou numa eliminação precoce do país do melhor jogador mundo na altura, Luís Figo. Como se não bastasse, até a Argentina foi deixada para trás. O carrasco foi a Suécia, que, apesar de ter alguma tradição futebolística, nunca foi conhecida pelo seu plantel fabuloso.

Contra todas as expectativas, esta tendência não mudou nos oitavos-de-final. A eliminação da Itália frente à Coreia do Sul foi uma das maiores surpresas do torneio. Com um testo para igualar o marcador aos 88 minutos e um golo de ouro aos 117, de Ahn Jung-Hwan, os tigres asiáticos devoraram, de virada, os azurra, que perderam imensas oportunidades ao longo da partida. Tal confronto entrou na história, devido ao suposto favorecimento da equipa de arbitragem em prol dos anfitriões, o que nunca foi provado, apesar da agressividade dos sul-coreanos em Totti e do erro grosseiro do árbitro no prolongamento, que resultou na expulsão, por simulação, do mesmo jogador.

Ao contrário da Itália, a Alemanha, o Brasil e a Inglaterra foram decisivos nos jogos contra o Paraguai, a Bélgica e a Dinamarca, respetivamente, e continuaram na disputa do título. Já o México acabou eliminado pelo pouco expressivo plantel dos Estados Unidos da América. A par da Coreia do Sul, o Senegal e a Turquia foram outras presenças pouco esperadas nos quartos-de-final. Também a Espanha, que eliminou a muito embalada Irlanda, não era vista como favorita para avançar.

Ronaldo vs Kahn

O caminho da Alemanha até à final não foi muito turbulento. As vitórias pela vantagem mínima (1-0) sobre os Estados Unidos – seleção que eliminou a Espanha – e a Coreia do Sul garantiram, aos alemães, o bilhete de entrada para a decisão do Campeonato do Mundo de futebol.

Contudo, para o azar da equipa do “titã” Oliver Kahn, uma seleção de grande potencial também não estava a seguir a moda dos supercampeões daquele ano: o Brasil. Para começar, o plantel “canarinho” deu a volta ao marcador contra a Inglaterra, onde valeu o poder de decisão de Rivaldo e de Ronaldinho Gaúcho, duas estrelas do ataque “RRR” (a que se juntava Ronaldo Nazário), para balançar as redes do estádio Fukuroi. Depois, foi a vez da Turquia, que já havia dado trabalho à formação de Luiz Felipe Scolari na competição, a sofrer com o poder super ofensivo dos brasileiros, que só conseguiram marcar um golo (1-0).

Um penta histórico

No último jogo fez-se história. As duas seleções, que nunca se tinham defrontado numa final, viam os 90 minutos com objetivos distintos, mas igualmente importantes. Por um lado, se a Alemanha ganhasse, chegaria ao quarto título em Campeonatos do Mundo, igualando o Brasil nos maiores supercampeões de sempre. Por outro, com a vitória brasileira, os “canarinhos” assegurariam o pináculo do pódio, com duas taças de diferença para a Itália e para a Mannschaft.

Posto isto, era evidente que os dois lutariam com garras e dentes. A vitória era o único resultado possível para ambas as seleções. A figura brasileira era Ronaldo, já chamado de “Fenómeno”, enquanto que, do outro lado, Oliver Kahn, o até então melhor guarda-redes do mundo, de acordo com a FIFA, assumia o protagonismo. O alemão só tinha sofrido um único golo em toda a competição – feito na fase de grupos por Robbie Keane (Irlanda), já nos descontos -, dificultando, deste modo, a tarefa do artilheiro da competição.

O início do jogo foi lento. O ataque brasileiro tentava, mas Kahn, imperial, dava segurança para a sua equipa tornar-se mais ofensiva. O paradigma do jogo só veio a alterar-se no minuto 67, quando o guardião alemão falhou no seguimento de um remate de Rivaldo, deu a recarga para Ronaldo que, experiente, converteu. A vitória foi confirmada no minuto 79, em mais uma linda jogada da dupla RR e mais um golo do camisola nove brasileiro.

Com o resultado (2-0), Ronaldo remediava a vergonha de 1998 e o Brasil ganhava o seu famoso “penta”, com sete vitórias em sete jogos, num Mundial pintado de verde e amarelo.