“Não foi fácil” chegar a um tema para um trabalho final do mestrado em Fotografia Documental que Rafael Farias, de 22 anos, está a fazer na Escola Superior de Música, Artes e Espetáculo, no Porto. O jovem diz que partiu de estímulos e de “influências e matérias” que lhe eram próximas para contar, através de imagens, a história de três famílias de reclusos, residentes no Porto.

“Decidi pegar nas famílias dos reclusos por sentir ser um tema frágil, com muita investigação teórica na parte psicológica mas pouca na questão visual”, partilha o jovem, também autor do projeto Nativos do Douro.

“Ilha” é um trabalho que cruza cartas dos reclusos com fotografias da vida da família, durante o período em que a pena prisional é cumprida e que mostra de perto os sítios e as casas dos reclusos.

Neste trabalho, a procura pelas relações fez com que se insistisse no silêncio e se identificassem duas realidades divididas pela liberdade. “Pretendemos refletir sobre a ausência e sobre a solidão no lugar exterior onde o homem estava anteriormente inserido”.

Vivências, pessoas e lugares comuns

Um ano foi o suficiente para que o projeto “Ilha” ficasse pronto. Ao fotógrafo interessou “perceber o que estava em causa para estas pessoas – o que sentiam, no que acreditavam”. O relacionamento com as pessoas, no início, foi um obstáculo. Por isso, “foram precisos meses de inúmeras visitas semanais”.

Mas foi nessas dificuldades que Rafael Farias arranjou “força para continuar e continuar por lá”. E o segredo, esse, lá se foi trabalhando. “Foi transformar as dificuldades em pistas e saídas para redescobrir certezas”, conta o jovem. Só assim foi possível conhecer as vivências dos protagonistas destas histórias e os lugares que bem conhece quem cumpre pena e quem aguarda fora. “A casa carrega consigo a delonga do tempo, os lugares são misteriosos e o silêncio é quase rotina”.

“Vivem o dia-a-dia sem saber como será o amanhã”

Traçar o perfil destas famílias não é tarefa fácil pela dureza com que já foram confrontadas. No início, Rafael era visto como “intruso”, mas com o tempo, passou a ser “uma esperança para eles”.

A punição pelos crimes põe de lado a conversa entre as famílias, o que faz delas “famílias desconstruídas com futuros inexistentes”. “Os temas não se cruzam, os dias trocam a ordem dos pensamentos”, partilha Rafael, que percebeu de perto esta realidade e as alterações provocadas pela ida para a prisão. “Não existe ninguém, ouve-se o silêncio, aglomeram-se os vestígios de alguém que não está, naquele momento”.

“Vivem o dia-a-dia sem saber como será o amanhã”, conta Rafael sobre estas pessoas para quem a perda de liberdade “representa uma fraqueza: física, familiar, social, emocional”.