Os sistemas de tecnologia da informação tornaram-se sofisticados ao longo dos anos e a noção de crime nas ruas rapidamente ganhou forma na Internet e nos computadores. A curiosidade ou a simples pretensão de saber o que o outro armazena nas chamadas “caixinhas mágicas”, remonta à Segunda Guerra Mundial e a técnicas de espionagem, em que a habilidade do “intruso” era reconhecida por aliados e adversários. Em Portugal, os ataques informáticos permaneceram na ordem do dia, a partir do momento em que instituições públicas e privadas viram os seus sistemas pirateados por grupos de hackers.

A dicotomia entre a pirataria encarada como um crime e pelo contrário, enquanto ação legítima para atingir um bem maior como a democracia ou a procura pela verdade da informação é o que atualmente move a oposição entre as autoridades e os denominados hackers.

“O petróleo do século XXI”

Os crimes informáticos são uma nova tipologia de ilegalidade que, cresceu a par e passo com a Internet, uma ferramenta essencial para a proliferação dos grupos de hacking, como explica o professor Manuel Eduardo Correia, diretor do Mestrado de Segurança Informática na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP): “Se não fosse a Internet, dificilmente existiriam [hackers] no número em que existem, porque o processo de hacking é um processo de descoberta, que é potenciado quanto maior for a capacidade de comunicação que os grupos tem entre si.”. Para além disso, a velocidade de informação na World Wide Web consegue ser decisiva no que toca à ocorrência de ataques informáticos.

O poder do mundo virtual não é de todo menosprezado por estes grupos, na verdade tanto as potencialidades como as vulnerabilidades das redes de computadores são escrutinadas pelos mesmos, de forma a tornarem-se cada vez mais eficazes nos ataques informáticos. A potencial falta de competência dos fabricantes para evitarem estas maleitas é somente explicada pela singularidade da indústria do software nos mercados – “O modelo económico construído à volta do fabrico de software foi o de promover funcionalidades e colocar no mercado o mais cedo possível”, esclarece o professor. Uma situação que não se verifica, por exemplo, na indústria automóvel, cujos produtos são desenvolvidos ao longo de vários anos.

No que toca à informação confidencial, o Professor Manuel Eduardo Correia, classifica-a como o “petróleo do século XXI”, algo que algumas instituições ambicionam sobretudo as que têm residência exclusivamente na Internet como a Google ou o Facebook. O valor deste tipo de informação tem ajudado muitas empresas a crescerem exponencialmente a nível económico, um fator que não é transparente nem claro na utilização dos dados pessoais dos cidadãos.

Quebrar as barreiras de segurança na Internet requer perícia, mas isto não signifique que a possibilidade seja um motivo adicional de curiosidade. O argumento utilizado por alguns grupos que relacionam o hacking a ações de ativismo não é aceite pelo professor, que acredita que haverá melhores meios para fazer legitimar as ideias. “O facto de alguém entrar num site e colocar um banner a dizer «Eu estive aqui» é o mesmo que partir uma montra”, remata.

“O reflexo da democracia” na Internet

A Operação Caretos foi uma ação levada a cabo pela Polícia Judiciária para desmantelar um grupo responsável por vários ataques informáticos a instituições privadas e públicas em Portugal. Em fevereiro deste ano, sete pessoas foram detidas no âmbito da operação e uma delas, Rui Cruz, o rosto por detrás do Tugaleaks e da Hackers Portugal, afirma que ainda muito pouco foi esclarecido sobre este assunto.

Embora se encontre em liberdade, assim como todos os então detidos, a proibição de acesso à Internet leva o jornalista a crer que está a ser alvo de censura: “Eu sou o único diretor de informação, jornalista e editor e estou impedido de aceder à Internet, portanto estou censurado de publicar no meu próprio órgão de comunicação social [Tugaleaks]”, afirma. Para Rui Cruz, a sua situação corresponde a “um espelho exato do estado da democracia”: a censura.

Quando é altura de distinguir os seus projetos dos demais órgãos de informação, Rui Cruz acredita que o Tugaleaks está perto dos anseios dos cidadãos, contrariamente aos mainstream media, distanciados da realidade e subjugados ao poder económico da publicidade. A proximidade semântica com a Wikileaks de Julian Assange não é aleatória, o projeto português encontrou inspiração no controverso site de denúncias – “Na altura, falava-se muito da Wikileaks e eu tinha uma espécie de revolta silenciosa dentro de mim porque sabia de algumas coisas em Portugal, mas que não eram noticiadas”, reconhece. “Eu não faço ataques informáticos” é a garantia do mesmo perante o alegado envolvimento em crimes do género.

O JPN tentou ainda contactar o grupo Anonymous Portugal e a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) mas, até ao momento, não obteve qualquer resposta.

Do Gabinete de Cibercrime do Ministério Público, criado em dezembro de 2011, surge a informação de que estão em curso investigações relativas a ataques informáticos a servidores de sites como a Polícia Judiciária e a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ). Quantos a futuros desenvolvimentos da investigação, o Gabinete de Imprensa da Procuradoria Geral da República (PGR) respondeu por email ao JPN: “As investigações encontram-se  em segredo de justiça pelo que, de momento, não é possível fornecer informação suplementar à já prestada”.