Mariano Gago morreu nesta sexta-feira, 17 de abril, em Lisboa, aos 66 anos, vítima de cancro. O ministro que deixou “a paisagem científica do país irreconhecível” fundou, em 1995, no Governo de António Guterres, o Ministério da Ciência e Tecnologia. Dois anos depois, em 1997, criou a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).
Voltou ao Governo sob a asa de José Sócrates, em 2005, e saiu em 2011, com a demissão do mesmo.
“O seu contributo (para o país) foi absolutamente inestimável”
Mariano Gago nasceu em Lisboa, a 16 de maio de 1948, e sempre viveu ligado às ciências. Licenciou-se em 1971, pelo Instituto Superior Técnico (IST), em Engenharia Eletrotécnica. No mesmo ano rumou a Paris e aí fez o doutoramento em Física, na Universidade Pierre et Marie Curie.
Mais tarde, torna-se professor no IST. Em 1986, assume a direção da Junta Nacional para a Investigação Científica e Tecnológica. Ao mesmo tempo, cria o Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas (LIP), no contexto da adesão de Portugal à Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN).
Para Orfeu Bertolami, atual presidente da Comissão Executiva e professor catedrático do Departamento de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), Mariano Gago, seu colega durante os 19 anos em que lecionou no IST, teve um papel fundamental naquilo que é a compreensão da importância da ciência para a sociedade portuguesa.
Cerimónia fúnebre
O cortejo fúnebre saiu, neste sábado, para o cemitério de Pechão, em Olhão, segundo informação dada em comunicado pelo gabinete de imprensa do Instituto Superior Técnico.
Apesar de nem sempre partilhar das opiniões do antigo ministro – nomeadamente nos estatutos do docente universitário -, diz ao JPN que, quando chegou a Portugal vindo do Brasil, em 1989, encontrou “praticamente um país de terceiro mundo” e que, agora, “Portugal é um país moderno” graças ao impulso científico de Gago. “O seu contributo foi absolutamente inestimável”, considera.
Além disso, acrescenta que o desenvolvimento do país se deve à visão de Gago para “criar uma FCT, um Ministério para a Ciência e Tecnologia, coisas que não passavam pela cabeça do atual Presidente da República, que foi primeiro-ministro antes de Guterres e que conseguiu deixar Portugal, em termos científicos, pior do que na época de Salazar”.
A personalidade forte ajudou a criar um paradigma de mudança: “Há ali uma marca registada de uma pessoa que tem ideias claras e que achava que as coisas precisavam de ser alteradas”.
Para Helder Crespo, também professor de Física na FCUP, Mariano Gago “teve um papel crucial nessa transição em que a Ciência tinha um papel muito mais marginal do que hoje”.
A importância de ensinar
Orfeu Bertolami conheceu um dos professores de Gago, aquando da sua passagem por Paris, que considerou aquele “o aluno mais inteligente” que teve.
Essa inteligência, aliada à vontade de inovar, deu frutos: “Como professor, sempre foi conhecido por ser muito aberto, muito dinâmico e, no período em que fez Ciência Física de partículas experimental, era conhecido por ser uma pessoa de grande competência científica”.
Helder Crespo foi testemunha em primeira mão desta “frescura educativa”. Entrou no IST em 1990 para estudar Engenharia Física. Em 1992 quis fazer um projeto de holografia e foi “bater à porta” de Mariano Gago – então coordenador do Departamento de Física -, que respondeu com prontidão à proposta do aluno.
Destes tempos, o também investigador de ótica ultra rápida, lembra que a sua relação com Gago “não foi muito típica, mas foi muito especial”: “Uma vez fizemos uma noitada, porque fazer hologramas não é fácil, e ele esteve connosco no laboratório para ver o que é que aquilo era e como é que saía. Ele era uma pessoa que apoiava coisas dessas também, ideias novas e gente com vontade de fazer coisas novas e que nunca tinham sido feitas e em tudo o que era possível ele ajudava e interessava-se muitíssimo”.