O diário português Jornal de Notícias (JN) celebrou, neste terça-feira, 2 de junho, 127 anos de existência. Para comemorar, o órgão de comunicação da Global Media Group optou pelo tema “Por Portugal”, debatido numa grande conferência, ao longo do dia.

A sala Suggia, na Casa da Música, acolheu este evento, que, de certa forma, foi uma viagem pelos contextos económico, político e social de Portugal. Das 9h30 às 17h30, a comemoração do aniversário do JN contou com a participação, entre outros, de Rui Rio, Rui Moreira, Miguel Cadilhe, Luís Amado, Paulo Rangel e Ramalho Eanes.

A conferência, na parte da manhã, debruçou-se nos aspetos europeus. Assim, o primeiro e segundo painel levaram a discussão os temas “Portugal no contexto Europeu e Atlântico” e “Portugal e os valores europeus: perspectiva e estratégia”, respetivamente.

A parte da tarde debruçou-se sobre os aspetos nacionais e regionais. Assim, o terceiro painel, composto por Rui Rio, Luís Amado, Miguel Cadilhe e Francisco Seixas da Costa, levou a discussão “O Portugal que temos e o País que precisamos com enfoque para os 40 anos de democracia”. O último e quarto painel debateu as questões regionais e coube a Rui Moreira, Emídio Gomes e Carlos Negreira falarem sobre o tema “A região que temos, e a que precisamos”.

“O Portugal que temos e o País que precisamos”

Foi a João Ferreira do Amaral, professor catedrático do Insituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), que coube iniciar este terceiro painel. Amaral, ao longo da sua intervenção, procurou dar a sua própria visão, que é um tanto crítica, “quer sobre a situação portuguesa, quer sobre o futuro”. Para o também economista, Portugal está em decadência, mas não devido à crise. Esta, segundo Amaral, a única coisa que fez “foi tornar mais visível certos desequilíbrios, certas disfunções que se vinham acumulando na economia, na sociedade e no sistema político”.

Sobre a questão da decadência que Portugal atravessa, o docente diz haver alguns indicadores que “provam isso”. “Em primeiro lugar a economia”, refere, acrescentando que este é o aspeto que condiciona os restantes. “A economia portuguesa está, para todos os efeitos, estagnada há 15 anos”, sublinha. Além disto, João Ferreira do Amaral diz que “a economia portuguesa não se soube adaptar ao fenómeno da globalização (…) e ao contexto europeu, que também não foi favorável”, outra razão que justifica o estado de decadência do país.

O segundo indicador remete para as questões sociais. “Infelizmente, a sociedade portuguesa é das mais desiguais (…), é das mais envelhecidas (…), é das que tem mais emigração de jovens (…) e tem, cada vez mais, um interior isolado do resto do país”, lamenta o economista.

Por fim, Ferreira do Amaral aponta o sistema político como o terceiro indicador de decadência do país. Neste aspeto, distingue entre duas questões: as questões que têm a ver com o funcionamento do sistema político português e as questões que têm a ver com a participação dos cidadãos na União Europeia (UE).

No entanto, “só há uma forma de inverter [esta situação]”, avança o diplomata. “Portugal deve questionar a sua permanência na zona Euro, (…) por essa permanência nos tirar instrumentos fundamentais de condução da nossa economia”, justifica, concluindo que põe “Portugal à frente do euro, mas não o euro à frente de Portugal”.

Má gestão conjunta das vertentes política e económica

O segundo orador deste painel foi Miguel Cadilhe. O economista e ex-ministro das Finanças, apresentou uma série de elementos que, segundo o próprio, “devem estar bem presentes quando pensamos no futuro [de Portugal]”. Ao longo da sua oratória, Miguel Cadilhe, dado o tema proposto ao terceiro painel, debruçou-se, sobretudo, “no País que precisamos”.

De acordo com Cadilhe, o problema não reside apenas nos aspetos políticos e/ou económicos. Mas, antes, a situação pela qual Portugal atravessa desde o início da democracia é o resultado de uma má gestão conjunta dos aspetos político e económico.

“Constrangimentos económicos que temos derivam de erros políticos”

Coube a Rui Rio, economista e ex-presidente da Câmara Municipal do Porto (CMP), continuar este painel. O antigo autarca começa por dizer que “ao cabo do regime democrático, Portugal tem dois problemas: tem um problema económico e tem um problema político”. No entanto, Rui Rio diz concordar que o problema é, na sua maior parte, político, uma vez que “os constrangimentos económicos que temos derivam, fundamentalmente, de erros políticos”.

Rio continua a sua oratória destacando quatro erros económicos, enfatizando, sobretudo, dois, os quais são, muitas vezes, falados. “Aqueles que são muitas vezes falados prendem-se com o endividamento público e endividamento externo”, diz.

Do ponto de vista político, Rui Rio adianta que não fica admirado com “o desgaste que o regime tem ao fim de 41 anos”, e continua, dizendo que “não era de esperar que o regime, ao fim de 41 anos sem ter sido minimamente reformado, estivesse com a vitalidade que tinha à data da nascença”. Em relação a isto, o economista avança com duas soluções. Por um lado, diz que é necessário todos os partidos políticos serem capazes de fazer um acordo de médio e longo prazo. Por outro, ressalva a importância de haver um acordo no quadro orçamental a médio prazo.

Por fim, coube a Luís Amado encerrar este painel. O presidente do CA do BANIF e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros confirma a afirmação de Francisco Seixas da Costa e diz que Portugal está, de facto, numa situação de decadência. No entanto, e apesar de Luís Amado entender que “é uma decadência que deve ser relativizada”, diz que Portugal atravessa a sua pior fase desde o 25 de abril. “Na minha perspetiva, acho que esta é uma crise profunda e que pode pôr em causa o regime”, refere, para continuar dizendo que esta “é uma crise de ajustamento ao processo mais exigente (…), que é o processo de integração na UE”.

“A região que temos, e a que precisamos”

No quarto e último painel destacou-se a presença de Rui Moreira, presidente da CMP, e de Emídio Gomes, presidente da Comissão de Coordenação da Região Norte (CCDRN).

Neste painel foram debatidas questões relativas aos problemas regionais e, tendo em conta o cargo dos intervenientes, foi a região Norte e a área metropolitana do Porto que estiveram na base da discussão.

Segundo Emídio Gomes, que “[viu] o país mudar e a fazer uma aproximação da Europa”, “a região que temos agora é muito diferente da de há 30 anos”, salvaguardando que essa diferença “é melhor”.

Tendo em conta as mudanças pelas quais o país atravessou desde o início da democracia, também a região sentiu essa mudança e, com ela, divergiu. Emídio Gomes salientou que é “a região que sente mais” e é a região “que antecipa as crises”. Portanto, diz, “na resposta aos cenários de crise, a região é que mostra uma maior resiliência por antecipação”.

Já durante os seus momentos de intervenção, Rui Moreira garantiu que pretende a regionalização. “É urgente”, esclareceu. No entanto, o autarca lembrou as dificuldade que existem, atualmente, para o processo de regionalização. “Os desígnios dos principais partidos são de uma visão romântica e futurista (…) e, por isso, contra a regionalização”.