Depois de Serralves, foi a vez de o Curtas Vila do Conde receber a curta-metragem de Salomé Lamas, “A Torre”. Como explicou a realizadora, este filme é filho de um outro maior intitulado, “A Expedição”, já que foi realizado a partir de materiais recolhidos durante a produção deste último.

A história resume-se à experiência de um rapaz, Kolja, que sobe ao topo de uma árvore, na imensidão da floresta. Sem diálogos, o som do vento a bater nas folhas assombra todo o filme e confere presença e poder à terra. O contraste ténue do preto e branco acentua o ambiente gélido e enevoado e os planos gerais confirmam a enormidade do espaço.

Aliás, depois da subida ao topo da árvore – ou à torre -, apenas conseguimos avistar o jovem num segundo momento, depois de um lentíssimo zoom que se vai revelando e seguido de um contra-campo que nos oferece aquilo que Kolja vê. Nesse momento, a árvore torna-se uma extensão do corpo humano.

Há uma certa pureza nestas imagens, que em nada se confunde com ingenuidade, já que lhe estão inerentes ideias de fronteira e de vigília. Fronteira entre o céu e a terra e, metaforicamente, entre a vida e a morte. Por sua vez, as torres são por excelência lugares de vigilância, isolados e de certa reclusão.

Bunker

Tal como o “Bunker”. Aqui há diálogos, mas avulsos, já que não existe qualquer linearidade entre eles ou entre as imagens. O modo de realização de Sandro Aguilar é bastante peculiar, dado que os guiões são um acessório secundário e, por vezes, dispensável.

O acaso torna-se, nas rodagens, um fator crucial para o desenvolvimento do filme, e o realizador recorda, por exemplo, a cena em que um homem remexe compulsivamente na terra e que não estava planeada. O alto contraste realça os pontos de luz e resulta numa textura muito singular (excelente trabalho do diretor de fotografia, Rui Xavier), em que grande parte da tela vive do preto.

Este efeito é particularmente bem conseguido numa festa, em que entrevemos os corpos dançantes e a iluminação se modifica constantemente, ao mesmo tempo que os jumpcuts se sucedem, criando um ritmo tenso e acelerado.

Bem mais explícita, no que toca à narrativa, é a sinopse do filme, que pode ser lida aqui e que ficou como sinopse final “por preguiça”, como lembrou o realizador durante um dos encontros de realizadores. Sandro Aguilar deixou a ideia de que o seu cinema vive do confronto entre o imaginário e a memória do espectador e aquilo que vê na tela, tornando-se num processo idiossincrático e que absolve o reconhecimento e a identificação imediatistas.