Programa Retomar arrancou em 2014 para ajudar pessoas a reingressar no ensino superior. O objetivo era dar uma oportunidade aos alunos que, devido às circunstâncias económicas atuais, tiveram que desistir do seu curso. Através deste plano, pretendia-se oferecer aos estudantes uma possibilidade de terminarem os seus estudos pela atribuição de uma bolsa que tinha o valor de 1200 euros anuais. As instituições também deveriam ganhar com o projeto, ao receberem 300 euros por cada aluno inscrito no âmbito do programa. Os fundos utilizados para financiar o projeto eram fundos comunitários europeus. Este financiamento estava inserido no Retomar através do programa Garantia Jovem.

O projeto foi, na verdade, o resultado de uma colaboração interministerial entre o Ministério da Educação e Ciência com o Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social. Surgiu como resposta a uma sugestão feita pelo pelo Conselho Europeu em relação a “políticas de redução do abandono escolar precoce”, que diziam respeito ao desenvolvimento de políticas fundamentadas, globais e intersetoriais. Estas últimas tinham como propósito ajudar jovens a reingressarem no sistema.

Para Daniel Freitas, presidente da Federação Académica do Porto (FAP), o objetivo “era interessante” porque tentava “recuperar estudantes que tinham deixado o ensino superior”.

No entanto, o próprio deixou escapar alguma frustração em relação ao mesmo. “O que aconteceu é que o programa tinha algumas limitações”, indica Daniel ao JPN. Um dos problemas principais era a restrição por idades, pois o projeto só aceitaria estudantes que tivessem até 29 anos. Outra das grandes limitações inerente ao Retomar era o requerimento dos ex-estudantes serem os denominados jovens NEET – Not in Education, Employment or Training. “Em português são os chamados ‘nem-nem’: nem a estudar, nem a trabalhar”, explica o presidente da FAP.

O programa, de facto, requeria que os candidatos não estivessem a trabalhar para poderem usufruir da bolsa, fator que impossibilitou muitos de poderem aceder às mesmas, visto não lhes ser possível abdicar do seu sustento. Freitas lembra-se ainda de muitos que chegaram a entrar em contacto com a FAP para fazerem perguntas sobre o assunto. Grande parte desses, ou “porque tinham mais idade do que o programa permitia” ou “porque estavam numa situação ativa de emprego”, foram impossibilitados de se candidatar ao programa.

Além disso, as bolsas só seriam desbloqueadas a alunos que já tivessem iniciado um ciclo de estudos no passado, mesmo que pretendessem mudar de curso. Depois, as mesmas seriam distribuídas de forma definitiva consoante o tempo que faltava para terminar o dito curso. Mais, os alunos que concorressem a essas bolsas tinham forçosamente de ter desistido antes do primeiro de março do ano em que estivessem a concorrer. Essa desistência tinha que estar formalmente regularizada na instituição onde estavam matriculados, ter apenas deixado de ir às aulas não chegava.

Outro dos problemas graves associados ao programa, de acordo com o presidente da FAP, foi a falta de divulgação do mesmo. “De facto tinham criado um programa que tinha o seu mérito, mas ao qual fizeram uma fraca divulgação”, comenta Daniel Freitas. A FAP tomou ação e, em conjunto com outras associações académicas, realizou uma campanha de divulgação que usasse vários meios, mas mesmo assim a tarefa revelou-se bastante difícil. Esses meios incluíam desde cartazes espalhados pelas faculdades a e-mails enviados aos alunos, ao uso das redes sociais para tentar atingir o maior número possível. Segundo o presidente, este ano a FAP chegou inclusive a pedir às instituições que cedessem os e-mails de alunos que tivessem desistido dos seus cursos nos últimos sete ou oito anos, de forma a remeter-lhes diretamente a informação em relação ao programa. Disponibilizaram ainda apoio direto por telefone e por e-mail. “Chegaram muitos telefonemas e muitos e-mails de antigos estudantes, a fazerem questões sobre o programa, mas posso dizer que muitas delas não encaixavam nos critérios de elegibilidade”, refere ainda. Acrescenta também que “havia muitas dúvidas de esclarecimento sobre os procedimentos a adotar” aquando das candidaturas.

Quais são então os resultados? O programa tinha como duração prevista dois anos, o ano letivo anterior e o que está neste momento a decorrer. Nestes dois anos, previa-se a atribuição de três mil bolsas em cada um mas a realidade da situação é muito mais desoladora. Dessas 3000 a serem atribuídas no ano letivo anterior, apenas foram entregues 482. Este ano, com as candidaturas já encerradas, a Direção-Geral do Ensino Superior divulgou ter recebido apenas 455 requerimentos no total. Desses, só 47 se dirigiam para a Universidade do Porto no ano anterior e 55 neste. “Era para apanhar uma franja de jovens que de facto fica muito aquém das expectativas gerais da direcção do ensino superior”, admite Daniel Freitas. Para o mesmo, em termos regulamentares, o programa teve muitas limitações o que “não possibilitou o alcançar das expectativas que tinham inicialmente”.

Para o presidente da FAP, apesar das suas limitações e da fraca adesão, o projeto não pode ser considerado um falhanço. “Não diria que foi falhado porque bastava recuperar uma pessoa para que seria interessante, mas ficou muito aquém da expectativa”, confessa.

Como será então o futuro? Tendo em consideração que o programa tinha, como já foi referido, a duração de dois anos, pode-se dar o mesmo como efetivamente terminado. Portanto, esse mesmo futuro esse será no mínimo incerto. “Nós ainda não temos nenhuma indicação”, indica Daniel. Para a FAP, seria interessante que pudesse continuar mas para tal seria necessário alterar “algumas regras que o tornam demasiado limitativo”. A FAP assume algumas sugestões, tais como “passar a financiar o programa com verbas do orçamento de Estado”, o que permitiria alargar os critérios. Esses seriam alargados ao nível das idades requeridas e sobretudo dar uma maior fluidez nos requerimentos aos candidatos, o que a Federação culpa como sendo fatores decisivos no fraco número de inscrições ao Retomar. Isso, agora, também dependerá do próximo executivo. “Como sabemos ainda está tudo em aberto e por isso nao temos espaço para trabalhar essa questão”, conclui Daniel Freitas.

O JPN tentou várias vezes entrar em contacto com a Direção-Geral do Ensino Superior, o Ministério da Educação e Ciência e com o Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, no entanto nenhuma das entidades referidas prestou declarações sobre este assunto.