Na entrada da Casa da Rua D. Lopo de Almeida, um estabelecimento aberto 365 dias por ano, encontramos uma vitrine. Entre várias folhas, encontram-se as normas de conduta e a ementa para a semana. A Casa da Rua, inserida na Santa Casa da Misericórdia do Porto, apoia pessoas com dificuldades e aposta na inclusão social. Foi inaugurada em junho de 1999 e tem refeitório, cantina social, serviço de lavandaria, duches, 20 quartos individuais e um gabinete de apoio técnico para acompanhamento dos utentes da instituição.
Todos os anos, cinco pessoas que frequentam a Casa da Rua são convidadas a participar numa iniciativa de homenagem a D. Lopo de Almeida, grande benemérito da Santa Casa da Misericórdia do Porto. Sandra Arouca, diretora da instituição, conta a história por trás desta ação: “No seu testamento, D. Lopo de Almeida refere que na celebração da data da sua morte [29 de janeiro] a instituição beneficiária do seu testamento, a Santa Casa da Misericórdia do Porto, terá de cumprir um dever que é vestir cinco homens pobres da cidade, dos pés à cabeça, e alimentá-los nesse dia. A Misericórdia desde sempre cumpre a tradição e, este ano, a instituição irá vestir cinco utentes da Casa da Rua D. Lopo de Almeida”, conta ao JPN.
A simbologia deste dia foi explicada aos utentes. “Compreenderam que era importante fazerem parte desse dia”, refere Sandra Arouca, com um sorriso nos lábios. Nos últimos anos, eram os técnicos que convidavam as pessoas a participar, mas este ano foi diferente. “Três dos utentes que foram escolhidos vieram ter connosco e disseram que queriam participar na cerimónia. Os nossos utentes já perceberam o significado do dia”, declara.
Sandra Arouca destaca a reação de um dos escolhidos para participar na iniciativa este ano. “Ele nem acreditava que lhe era dada a oportunidade de poder escolher a roupa que quiser. A Misericórdia do Porto dá oportunidade de eles irem às lojas e escolherem o que quiserem. Não há imposições”.
Na próxima sexta-feira, os utentes que foram escolhidos para participar neste dia têm encontro marcado na Casa da Rua, logo de manhã. Juntam-se à equipa técnica da instituição e seguem para a missa em memória de D. Lopo de Almeida, que vai realizar-se na igreja Privativa da Misericórdia do Porto, às 11 horas. “Normalmente, a meio da cerimónia religiosa, há uma oferta aos utentes por parte da mesa Administrativa da Misericórdia do Porto”, menciona Sandra Arouca. Depois segue-se um almoço convívio com os cinco utentes, os técnicos da Casa da Rua e os diretores da Santa Casa da Misericórdia do Porto.
Na Casa da Rua “é tudo calmo”, mas sexta “vai ser uma festa”
Avelino, 53 anos, foi um dos utentes selecionados. Aparece na Casa da Rua com um sorriso de orelha a orelha. Este mês convidaram-no para participar na iniciativa. “Vai ser um dia especial, diferente dos outros. Além de ser um dia diferente, acho que vai ser uma festa”, declara. Avelino vai jantar à Casa da Rua há seis anos: “Até gosto do ambiente, é familiar, às vezes”, afirma. Quanto a roupa, comprou sapatos, calças, uma ‘t-shirt’, uma camisa, uma camisola, um casaco e um cinto.
Rui Ávila, 59 anos, é outro dos utentes da Casa da Rua escolhido para a celebração. É um homem reservado que gosta pouco de falar. Soube, pelo segurança da Casa da Rua, que tinha sido convidado para a iniciativa. Frequenta esta instituição desde dezembro e é aqui que faz as suas refeições. Como é o ambiente? “É tudo calmo”, conta ao JPN. “Como estou a morar aqui perto, venho aqui, faço as minhas refeições e vou à minha vida”, conta. Rui está a morar num quarto na Praça da Alegria. Já escolheu a roupa que vai estrear na sexta-feira: “sapatos, casaco, camisola e camisa”, enumera.
José Maria, 58 anos, já conhecia a iniciativa e aceitou o convite da diretora da Casa da Rua. “Sei que vai ser um dia diferente”, conta. José Maria já tem a sua roupa: sapatos, meias, calças, blusa, casaco de malha e um cinto. Mora no Bonfim, numa pensão. “Já meti o requerimento a pedir uma habitação social, dizem que estou na lista de espera. Vamos ver quando é que vou ter uma casa para o resto da vida”, conta. Apoia estas iniciativas, porque “ajudar quem precisa é muito bom”, conclui.