Numa plateia repleta e maioritariamente feminina, a conferência “Mulheres em Engenharia”, realizada na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) mostrou exemplos de diferentes percursos de vida de quatro profissionais da área.

A construção da discriminação

O estereótipo de género em Engenharia foi um dos temas mais abordados da sessão. Apesar disso, a discriminação não foi um aspeto marcante na carreira das oradoras. Teresa Andrade, professora da FEUP, na área de Eletrotécnica e Computadores, assegurou que nunca se sentiu “intimidada” mas, em alguns momentos, apercebeu-se de uma certa condescendência pelo facto de ser mulher. “É do pior e não podemos tolerar isso”, rematou.

Já Cristina Ribeiro, professora do Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP), sempre esteve ligada à Engenharia Metalúrgica e de Materiais. A engenheira acredita que se tivesse seguido pela área de “Metalúrgica pura e dura”, teria sentido alguns entraves. Dentro dos vários tipos de Engenharia, a profissional confessou que, “socialmente, havia alguma pressão para ir para Química, uma área de meninas”.

Computação, Informática e Mecânica são apontadas por Maria Luísa Madureira, professora na FEUP, como áreas estereotipadas e predominantemente masculinas. A oradora é doutorada em Engenharia Mecânica, mas revelou que nunca sentiu na pele a discriminação por ser do sexo feminino. Maria Luísa acrescentou, ainda, que há muita pressão sobre o tema e garantiu ter alunas que “estão bastante bem integradas”. Se existem raparigas que não vêm para Engenharia, “se calhar é porque não gostam, ou porque não estão bem informadas e têm algum estereótipo”.

O poder da Comunicação Social

A falta de informação e a criação de estereótipos acontecem, segundo Maria Luísa, devido à negligência da comunicação social em relação a “qualquer área que não tem tanto a ver com a parte social e humanitária”. A partir daí, as mulheres, como “são atraídas por aquilo que pode tornar o mundo melhor”, são facilmente associadas à Medicina e ao “bem da Humanidade”. Para a profissional, os media “ajudam na construção do estereótipo”.

A professora chega a comparar a atenção dada pelos média a organizações de Medicina, em relação às de Engenharia. “Se se fala tanto dos Médicos Sem Fronteiras há tantos anos, os Engenheiros Sem Fronteiras também existem e fazem muita obra. Acho que está nas mãos dos jornalistas e, se calhar, das jornalistas, começar a fazer isso” [a divulgar].

Na opinião de Cristina Ribeiro, a criação de estereótipos começa desde bem cedo: “Faz falta, em idades mais precoces, a diversidade de brinquedos que se disponibiliza”, como carrinhos e construções para meninos e meninas. Outra solução seria “incentivar mais a existência de trabalhos práticos desde o secundário que obriguem, realmente, a que os alunos mexam, sem medos e sem haver essa distinção”.

Um debate para motivar

O debate terminou com o exemplo dado por uma engenheira informática, que trabalha numa “startup” ligada à tecnologia. Sara Santos começou por tirar um curso de ação social maioritariamente constituído por raparigas. Com o lema “mudar é arriscar, arriscar é conseguir”, Sara transformou a sua vida. Aos 27 anos voltou a estudar. Desta vez, num mundo repleto de homens – o da Engenharia Informática.

Na empresa em que trabalha atualmente, a profissional apercebeu-se que a dificuldade em gerir a competitividade das mulheres, também se sente no universo masculino. Com o seu percurso de vida antagónico, a engenheira apelou aos jovens que não temam a mudança, pois devem ser felizes com as suas escolhas.

Um ponto comum a todas as oradoras, bem-sucedidas nas respetivas carreiras, foi o incentivo aos jovens que se encontravam na plateia. Teresa Andrade afirmou que “as oportunidades existem”, mas que é preciso manter os “olhos abertos”. O ambiente de motivação continuou com Cristina Ribeiro: “Não podemos abdicar do que queremos, mesmo que o caminho pareça não ser o mais direto”.

A iniciativa foi organizada por Carolina Centeio Jorge, estudante do 2º ano de Engenharia Informática e Computação na FEUP. A jovem integra o núcleo do IEEE Women In Engineering da Universidade do Porto (WIE UP) e desenvolveu esta atividade com o objetivo de “reunir mulheres que tenham percursos nestas áreas” e também de fazer com que as raparigas se conheçam entre si, “porque, mesmo na faculdade, como há poucas em cada curso, acaba por ser tudo muito distante”.

No mundo do trabalho, a estudante de 19 anos admite que ainda existe alguma discriminação para com as mulheres e aponta como uma das razões a instabilidade que uma mulher pode causar num grupo de homens. “Pôr mais um homem em vinte é estável, mas se for uma mulher, uma pessoa nunca sabe como é que vai ser, aquilo pode mudar tudo”, contou Carolina ao JPN.

Para contornar a situação, a coordenadora do evento acredita que “depende muito da garra de cada uma” controlar a integração nestes ambientes mais masculinos.

 

Artigo editado por Sara Gerivaz