O primeiro discurso presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa fica marcado pela manifestação da vontade de construir consensos e incentivar o diálogo. O 19º homem a ocupar o Palácio de Belém sublinhou a necessidade de “cicatrizar feridas” resultantes dos sacrifícios vividos nos anos anteriores, acreditando na “secular capacidade [dos portugueses] para vencer as crises.” O novo Presidente da República quer um equilíbrio entre crescimento económico e justiça social, que chegue às pessoas e “não se satisfaça com a contemplação dos números.”

O presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, e o novo Presidente da República coincidiram numa ideia: É “muito mais o que nos une do que o que nos divide.” A união foi, de facto, um dos pontos centrais do discurso da tomada de posse de Marcelo, quer seja a união dos órgãos de soberania, do país e da relação com as comunidades estrangeiras. Nestas, incluiu “três questões prementes”: “os desafios dos refugiados na Europa, a não discriminação económica e financeira na CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa] e as fronteiras da Aliança Atlântica.”

“É para Portugal que vai o meu primeiro e decisivo pensamento”

O novo chefe de Estado e também novo Comandante Supremo das Forças Armadas homenageou a terra e o mar, o povo português e aquilo que os liga: a “saudade”, o poder de tanto ser terno como vibrante, a “generosidade”, a esperança, o “heroísmo”.

O professor que ensinou durante 26 anos a Constituição da República Portuguesa de 1976 promete agora cumpi-la e fazê-la cumprir, tornando-se num “guardião premanente e escrupuloso” dos valores da Nação de que se orgulha. São eles o “respeito pela dignidade da pessoa humana”, pela integridade física e espiritual, e pelas liberdades de expressão e de pensamento.

Marcelo apelou à “vocação universal” e à “unidade europeia” do país e firmou a vontade de aproximar “gentes e falas, economias e sociedades (…) sem xenofobias, intolerâncias e complexos de falsa superioridade ou de incompreensível inferioridade.” De acordo com o discurso desta manhã de quarta-feira, é urgente “recriar convergências, redescobrir diálogos, refazer entendimentos e reconstruir razões para mais esperança.”

“Temos de cicatrizar feridas destes tão longos anos de sacrifícios”

O combate à corrupção e ao clientelismo, e a importância da transparência financeira como forma de travar a crise, foram temas abordados. Marcelo Rebelo de Sousa advertiu para a subordinação do poder económico em relação ao poder político, em vez do contrário.

Marcelo não esqueceu os antigos Presidentes no seu discurso. A Cavaco Silva,  agradeceu pelo “empenho que colocou no interesse público, na ótica que lhe afigurava correta” e, perante a presença de Ramalho Eanes e Jorge Sampaio, salientou o valor da continuidade democrática. O quinto chefe de Estado após o 25 de Abril drigiu ainda algumas palavras ao rei de Espanha, Filipe VI, ao Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, e ao Presidente da Comissão Europeia, Jean Claude-Juncker.  Nos 40 anos da revolução dos cravos, as forças armadas tiveram também direito a uma homenagem, devido à fidelidade a Portugal e à ação na promoção da paz, da justiça e do desenvolvimento.

Aquele que, para Jean-Claude Juncker, é “o homem certo no local certo” prometeu ser o “Presidente de todos, sem promessas fáceis, ou programas que se sabe não poder cumprir.” Depois de, nos últimos tempos terem sido tecidas várias críticas à passividade do exercício da presidência de Cavaco Silva, Marcelo prometeu agir com “determinação constante, assumindo, em plenitude, os seus poderes e deveres.”

“Sem querer ser mais do que a Constituição permite. Sem aceitar ser menos do que a Constituição impõe”

Marcelo acabou a sua intervenção com as mesmas palavras que terminaram o discurso de vitória de 24 de janeiro: “Pelo Portugal de Sempre”.

O primeiro-ministro António Costa – antigo aluno e amigo de Marcelo -, e o presidente da Câmara de Lisboa Fernando Medina elogiaram a ideia de unidade nacional que Marcelo passou ao longo do discurso. Jerónimo de Sousa e Catarina Martins aguardam a aplicação prática das intenções que demonstrou. O líder do PCP declarou que “sarar as feridas é cortar com as politicas de direita”, e a líder do Bloco espera que a soberania do país não seja destruída por ordens do estrangeiro.

Marcelo Rebelo de Sousa ganhou as eleições presidenciais de janeiro, com uma campanha de 157 mil euros, livre de máquinas partidárias e de grandes eventos e comícios. Esta quarta-feira, chegou à Assembleia da República a pé.

A primeira viagem do novo Presidente da República está marcada para o Vaticano e depois irá a Moçambique. O mandato de Cavaco Silva terminou esta quarta-feira. Sobre a sua passagem por Belém resta aguardar pelo livro de memórias que prometeu escrever.

 

Palavras mais ditas no discurso de tomada de posse de Marcelo Rebelo de Sousa, dia 9 de março de 2016

Palavras mais ditas no discurso de tomada de posse de Marcelo Rebelo de Sousa, dia 9 de março de 2016