O documento intitulado “Apelo ao bloqueio do aumento das propinas a nível nacional” foi lido por José Dias, presidente da Associação Académica de Coimbra (AAC), numa conferência de imprensa, na segunda-feira. A sessão registou a presença de uma centena de estudantes.

O presidente da AAC explica que a ideia de enviar a carta ao ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior vem no seguimento da proposta do Partido Comunista Português (PCP), para o Orçamento de Estado 2016, de suspender a atualização do atual regime de propinas no Ensino Superior.

“Senhor Ministro, apelamos de forma clara e inequívoca: bloqueie agora o aumento das propinas para os estudantes do Ensino Superior em Portugal”, pode ler-se na carta dirigida a Manuel Heitor.

José Dias explica ao JPN que nos últimos 25 anos, a propina no Ensino Superior tem sofrido subidas muito abruptas. A diferença entre o valor cobrado em 2003/2004, ano da aprovação da nova Lei do Financiamento do Ensino Superior e o valor máximo aplicado no presente ano letivo é de 211 euros.

“Ano após ano, tem havido um aumento considerável no valor das propinas. Nos últimos seis, sete anos apenas existiram duas descidas pouco significativas. Por exemplo, em 2010 a propina desceu em 15 euros e no ano passado desceu apenas cinco euros (desceu dos 1068 para os 1063 euros). Portanto, foram descidas muito pouco consideráveis, tendo em conta que em 2009 ainda se pagava menos de 1000 euros de propinas e neste momento, a Universidade de Coimbra já paga 1063 euros”, explica o presidente da AAC .

Segundo José Dias, o PCP, Bloco de Esquerda (BE) e Os Verdes (PEV) vão votar favoravelmente à proposta. Além deste partidos, o presidente adianta que há deputados do Partido Socialista (PS) a favor da questão. “Ingressamos a carta diretamente ao principal motor e agente político na área do Ensino Superior, que é precisamente o Ministério da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior para que consiga, junto do grupo parlamentar do Partido Socialista, aceitar esta mesma proposta”, reforça José Dias.

“A Associação Académica de Coimbra não podia deixar de realizar algum tipo de iniciativa que dissesse diretamente ao senhor ministro qual é que é a opinião dos estudantes da Universidade de Coimbra”, acrescenta.

O grande objetivo da AAC é atingir, gradualmente, a gratuitidade da propina. De acordo com a associação, não deve ser pago nenhum valor de propina às instituições do Ensino Superior: “Num primeiro momento, queremos bloquear o aumento da propina porque temos um Orçamento de Estado onde esta proposta está a ser discutida. O que a Associação Académica de Coimbra defende é que o valor global deve ser diminuído até à gratuitidade, uma vez que alguns países da União Europeia já começaram a abolir as propinas. Este financiamento que é dado às instituições provém das famílias portuguesas e deve ser automaticamente substituído por financiamento estatal”.

O dirigente associativo refere, ainda, a Universidade do Porto (UP) como um exemplo de instituição académica que tem considerado esta sobrecarga nas famílias portuguesas e tem congelado o valor da propina máxima nos últimos cinco anos.

Governo ou instituições: Quem deve fixar o valor da propina?

O presidente da ACC defende que a responsabilidade de fixar o valor da propina devia estar centralizada no Governo. José Dias apela para que esta discussão não passe novamente para dentro das instituições do Ensino Superior. O JPN falou com outras associações académicas do país. As opiniões dividem-se.

A Associação Académica de Lisboa (AAL) concorda com a iniciativa de Coimbra relativa ao congelamento do valor máximo da propina. O presidente André Ferreira afirma que há necessidade de haver uma revisão da situação, uma vez que o valor das propinas é um dos fatores para as elevadas taxas de abandono escolar e de congelamento de matrículas nas universidades.

No entanto, o presidente da AAL defende que a fixação do valor da propina deve ser decidida entre o Governo e as instituições académicas: “A fixação do valor da propina deve passar pelas instituições porque elas é que têm a realidade de quais são as necessidades e quais as melhores formas de articular a distribuição do financiamento. Mas como é óbvio, tem de haver uma base de negociação com o Governo”.

“Se essa responsabilidade fosse colocada apenas às instituições, estas iriam fixar um valor muito elevado e se coubesse apenas ao Governo, iriam ser valores muito baixos de financiamento. O mais correto era um valor intermédio entre as duas partes”, acrescenta André Ferreira. O presidente da AAL diz ainda que, se a fixação do valor da propina fosse somente por parte do Governo, várias instituições académicas sairiam em prejuízo.

Já a Federação Académica de Lisboa (FAL) comenta que a carta enviada a Manuel Heitor por parte da AAC não é uma proposta suficiente para o propósito. André Pereira, dirigente associativo do órgão académico, não concorda com a opinião de Coimbra em centralizar a responsabilidade do valor da propina no Governo.

O presidente defende que haja uma iniciativa parlamentar para a fixação do valor da propina no Ensino Superior, no entanto, esta deverá ser sempre decidida com o contributo de todos os agentes do Ensino Superior: “Embora considere que o valor seja definido por iniciativa parlamentar, os estudantes do Ensino Superior e os seus representantes, as instituições e os seus órgãos de gestão, também devem contribuir na decisão. Este deve ser um trabalho conjunto”.

A Associação Académica da Universidade do Algarve (AAUALG) também reagiu a esta iniciativa. Rodrigo Teixeira, presidente da AAUALG, admite que a Universidade do Algarve é a instituição académica que tem o valor de propina mais baixo a nível nacional e defende que as instituições devem possuir a autonomia na fixação do valor da mesma.

Rodrigo acredita que a propina deve ser decidida consoante as regiões em que as universidades estão situadas, uma vez que apresentam níveis de desenvolvimento contrastantes. “No caso da Universidade do Algarve, o facto de termos uma propina mais baixa tem a ver com a deslocação a nível nacional. Temos de ter em atenção que há regiões mais ricas que outras. Por exemplo, o interior é um pouco mais desfavorecido nesse sentido, se calhar até faz sentido que os estudantes não sejam tão sobrecarregados com as propinas. Acho que não se deve tirar essa autonomia das universidades”, explica o dirigente ao JPN.

Daniel Freitas, presidente da Federação Académica do Porto (FAP) faz um alerta para que haja uma reflexão nacional sobre o que é que as propinas realmente representam, visto que, segundo o próprio, “estão completamente desreguladas daquilo que era o objetivo inicial”.

“Antigamente elas serviam apenas para acréscimos de qualidade das instituições e hoje em dia são valores indispensáveis para o funcionamento das mesmas. Portanto elas perderam completamente o seu propósito de assistência e deve ser um valor que deve discutido”, indica Daniel Freitas ao JPN.

Também a Associação Académica da Universidade do Minho (AAUM) considera que a proposta do congelamento do valor máximo da propina traz justiça em termos da definição daquilo que é o valor das propinas. No entanto, Bruno Alcaide, presidente da AAUM, não deixa de frisar que as instituições não devem perder a sua margem de autonomia na questão da fixação da propina no Ensino Superior.

“A propina foi criada com o intuito de trazer uma maior qualidade no Ensino Superior e agora acaba por não se refletir nessa mesma realidade, uma vez que é servida para custear aquilo que são os gastos da universidade. Portanto, deve haver uma intervenção do Governo naquilo que se deve exigir dos estudantes. Acho que ambas as partes devem salvaguardar a missão das propinas, que não deve ser desvirtuada como tem sido”, explana.

Neste fim de semana vai decorrer o Encontro Nacional de Direções Associativas (ENDA) e a AAC afirma que o congelamento da propina máxima seria um excelente ponto de discussão.

Artigo editado por Sara Gerivaz