Salários inferiores aos prometidos, alojamentos sujos, pequenos e sobrelotados, passaportes e documentos de identidade confiscados. Estas são algumas das condições a que os trabalhadores que participam na construção dos estádios para o Mundial 2022 estão sujeitos, segundo um relatório da Amnistia Internacional designado: “O lado feio do jogo bonito: exploração num estádio do Mundial de 2022 no Qatar”.
O relatório assenta em entrevistas feitas a 132 trabalhadores migrantes envolvidos na remodelação do Estádio Califa, o primeiro a ficar pronto para o campeonato de futebol, e 99 migrantes que trabalham na construção dos jardins em volta do estádio.
Embora reconheça que a principal responsabilidade da situação é do governo do Qatar por permitir este tipo de falhas e não fiscalizar o cumprimento das leis que têm em vigor, a Amnistia critica a “chocante indiferença” da Federação Internacional de Futebol (FIFA) em relação ao “tratamento terrível” dado a estes trabalhadores.
“A atribuição e realização de qualquer evento têm de ser suportadas pelo respeito de direitos e a FIFA nesse aspeto, pelo menos no discurso, quer assegurar essas mesmas condições. O problema é que na prática não é o que acontece”, explicou Daniel Oliveira, coordenador de ativimo e formação da Amnistia Internacional, ao JPN.
O que preocupa a organização é que “uma das maiores instituições do mundo e que organiza um dos maiores eventos do mundo está a permitir que ele seja construído em cima de trabalho forçado e em cima de um desrespeito total destes trabalhadores migrantes”, salientou o responsável da Amnistia. “A FIFA devia exigir, para além dos estádios estarem concluídos a tempo, que os direitos de quem participa na construção do evento sejam respeitados”, concluiu.
O secretário-geral do comité organizador, Hassan al-Thawadi, já reagiu ao relatório da Amnistia pedindo tempo para resolver os problemas e destacando os esforços que já foram feitos ao nível da segurança e proteção das construções.
Daniel Oliveira admite que houve melhorias no último ano devido às alterações legislativas. No entanto, estas são ainda “muito incompletas” e a situação “está longe de ficar resolvida”.
A Amnistia revela, ainda, preocupação de que a situação piore com o aumento do número de trabalhadores envolvidos nas obras relacionadas com o Campeonato Mundial de Futebol no Qatar. Atualmente, são cerca de quatro mil os trabalhadores envolvidos na construção dos estádios, um número que em 2018 se espera ser de quase 40 mil.
Maior atenção por parte das marcas patrocinadoras
Sendo o futebol uma indústria que move milhões de pessoas e muito dinheiro, Daniel Oliveira acredita que o evento é uma oportunidade para “melhorar as condições de trabalho no Qatar e não o contrário, que seja aproveitado para que se explore mais os trabalhadores que vêm de outros países para trabalhar no país”. O coordenador de ativimo e formação da Amnistia Internacional salientou que o que pretendem não é um boicote nem que se retire o campeonato do mundo. O objetivo é que tanto a FIFA como as marcas associadas ao evento tenham uma maior atenção para “garantir que o evento não é construído com base em abusos de direitos dos trabalhadores”.
Artigo editado por Filipa Silva