Em Portugal, Espanha e Itália, as relações poliamorosas na comunidade LGBTQ são, ainda, “tabu e alvo de preconceito”. Ana Cristina Santos, socióloga e investigadora do projeto “INTIMATE” no Centro de Estudos Sociais na Universidade de Coimbra (UC), afirma que “ainda há muito por fazer nesta área”.

Segundo a investigadora, as questões de orientação sexual já estão mais estabilizadas e são mais aceites. Porém, quando alguém “se identifica como lésbica ou gay e, para além disso, é também poliamorosa tem mais fatores de vulnerabilidade quando sai do armário”.

“Os modelos culturais dominantes não estão preparados para acolher a diversidade, as pessoas não estão habituadas a pensar que, de facto, somos muito diferentes”, afirma a investigadora.

Ana Cristina refere que falar de amor ainda “significa falar do culto da individualidade” e salienta que a sociedade não pode esperar que “todas as pessoas sejam monogâmicas”, lembrando que é rara a pessoa que “só tenha tido um companheiro sexual na vida”.

A investigadora de Coimbra alerta para o facto do poliamor ainda ser um tema tabu: “Se alguém está com mais de uma pessoa é porque o amor não é verdadeiro. Todo este discurso tem séculos e, portanto, o legado é muito forte”.

A coordenadora do “INTIMATE” afirma que a discriminação face ao poliamor e à comunidade LGBTQ se reflete no dia a dia de forma direta e indireta e critica a falta de legislação existente nos países. “Em contextos em que a situação jurídica já está assegurada, há uma maior liberdade para as pessoas viverem a sua identidade de género, livres de preconceito. Pelo contrário, nos outros lugares em que a resposta jurídica está mais ausente, o armário assume um impacto maior”, lamenta a socióloga.

O projeto

Em março de 2014, investigadores de Portugal, Itália e Espanha juntaram-se para estudar a “cidadania íntima LGBTQ”, em torno de temas como a conjugalidade lésbica, poliamor, procriação medicamente assistida e redes de amizade.

O projeto, financiado pelo European Research Council, visa, de acordo Ana Cristina Santos, “conhecer o modo como as pessoas que se identificam como lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e ‘Queer’ constroem as suas relações de intimidade”.

A socióloga refere que o projeto surgiu pela necessidade de haver “na academia portuguesa estudos científicos na área LGBTQ” e pelo facto de “a legislação não dar resposta a todos os problemas”.

O “INTIMATE” assenta em três eixos de estudo – a conjugalidade, a parentalidade e a amizade – e tem uma duração de cinco anos. Os resultados do primeiro ano de estudo sobre conjugalidade lésbica e poliamorosa foram apresentados, na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, na passada quarta e quinta-feira.

Na conferência estiveram presentes cerca de 200 pessoas que debateram temas em torno da cidadania, família, conjugalidade, não-monogamias e ativismo na comunidade LGBTQ.

Embora os resultados do primeiro ano sejam muito diversificados de país para país, a investigadora afirma que os três países têm em comum “um discurso ancorado na monogamia e na heterossexualidade”.

 

Artigo editado por Sara Gerivaz