A saga brasileira continua. Foi aprovado esta segunda-feira na Câmara dos Deputados em Brasília, com 38 votos a favor e 27 contra, o relatório de pedido de “impeachment” da presidente Dilma Rousseff. O resultado já era esperado, mas o ex-presidente Lula da Silva afirma que a votação “não quer dizer nada”.

A Comissão Especial do Impeachment justificou a sua decisão com o argumento de que “há fortes indícios de cometimento de crime de responsabilidade”. A presidente está a ser acusada de crimes de fraude fiscal – “pedaladas fiscais” – e crimes de obstrução da justiça ao ter, por exemplo, nomeado o ex-presidente Lula ministro da Casa Civil. Dilma também é acusada do crime de desobediência, de extorsão, de crime eleitoral, de falsidade ideológica e de improbidade administrativa, ou seja, de atentar contra os princípios da administração pública.

Este resultado coloca o Planalto numa corda cada vez mais bamba que pode rebentar para o lado da presidente. A favor do “impeachment” estiveram maioritariamente deputados do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Contra o afastamento da presidente foram contabilizados mais votos do Partido dos Trabalhadores (PT) – a família política de Dilma – e outros votos que se repartiram entre o PMDB, o Partido Progressista (PP) e o Partido da República (PR).

De acordo com a “Folha de São Paulo”, a reunião acabou com os ânimos exaltados e “desordem generalizada”. Retratos de um país fragilizado e com emoções à flor da pele.

Ainda no fim da reunião, foi abafada a tentativa de um deputado, apoiante de Dilma, de reproduzir um áudio do vice-presidente Michel Temer (PMDB). Temer terá feito um discurso “precipitado” como se já tivesse sido aprovado o “impeachment”. Nesse discurso, o vice-presidente apela à “unidade nacional”, diz que é preciso “um governo de salvação” e a “colaboração de todos os partidos” para tirar o país da crise. “A mudança pode gerar esperança”, declara Temer que já saiu em sua própria defesa ao justificar que, independentemente do resultado da próxima votação, vai continuar a sustentar o mesmo discurso.

Depois do resultado, a Fundição Progresso, na emblemática zona da Lapa, no Rio de Janeiro, reuniu milhares de apoiantes do Governo e contou com a presença do ex-presidente. No seu discurso, Lula reforçou a vontade da oposição em assumir o poder e enumerou “os golpistas” que serão beneficiados de acordo com a linha sucessória. “Jamais imaginei que veria gente da minha geração, agora golpistas querendo tirar a presidente eleita”, terá afirmado Lula segundo o “Estadão”. O rosto e a voz mais conhecida do PT salientou ainda que esperou 12 anos para ser eleito e que não houve ninguém como ele que tenha governado o país “para todos”.

“Vou passar para a história como o presidente que mais fez universidades nesse país. Isso incomoda. Como pode esse peão analfabeto ter mais título de doutor ‘honoris’ causa que o sociólogo?”, justificou Lula a respeito das acusações que lhe são dirigidas sobre a vontade de incitar uma luta de classes no Brasil. O ex-presidente afirmou ainda que a elite brasileira nunca “engoliu” o pobre que passou a ser “engenheiro” ao invés de “faxineiro”. Artistas, intelectuais e apoiantes assinaram na noite de segunda-feira um manifesto contra a “ameaça da democracia”, segundo a “Folha de São Paulo”.

E o que vai acontecer agora?

Depois de ter sido votado pela Comissão Especial do Impeachment, o pedido vai ser agora sujeito à votação de toda a Câmara dos Deputados. A presidente precisa de 171 votos dos 513 deputados para ficar no Governo. Mas antes desta votação na Câmara dos Deputados, que terá lugar no próximo domingo dia 17 de abril, o parecer da reunião desta segunda-feira vai ser lido na Câmara dos Deputados esta terça-feira a partir das 15h00, horário de Brasília. Na quarta-feira, o texto vai ser publicado no Diário Oficial da Casa e 48 horas depois entra na pauta do plenário. As discussões começam na sexta-feira e a votação decorre no domingo.

Se houver 342 votos a favor do “impeachment” na Câmara dos Deputados, o processo segue para o Senado e, se passar por uma votação simples que decida a favor, a presidente é afastada temporariamente pelo máximo de 180 dias. Temporariamente porque o Senado tem estes dias para definir o impedimento definitivo ou não. A sessão será comandada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal e tendo a aprovação de 54 senadores, Michel Temer assume o poder. Se o pedido de “impeachment” não passar da Câmara no domingo o assunto encerra-se ali.

Entretanto, o “Estadão” tem atualizado diariamente um “placar do ‘impeachment'” com as intenções de voto dos parlamentares. Nesta terça-feira, existem 299 votos a favor do afastamento da presidente, 123 contra, 48 indecisos e 43 que não quiseram responder.

Por outro lado e de acordo com a “Folha de São Paulo”, o Governo prevê conseguir no domingo cerca de 190 votos. Uma margem justa aos 171 que são necessários. Se as previsões do “Estadão” se confirmarem, Dilma precisa que pelo menos metade dos indecisos e metade dos que não quiseram responder se manifestem ao seu favor.

 

Artigo editado por Filipa Silva