Da Coroa para a Igreja, da Igreja para a Coroa. Assim passou de mão em mão a cidade dos “Invictos”, que só em 1406 viu a sua autonomia administrativa firmada. Um processo longo que culminou com um acordo estabelecido a 13 de fevereiro de 1405, entre D. João I e o bispo do Porto, D. Gil Alma, confirmado um ano depois.
António Barros Cardoso, especialista em História Local, conta ao JPN que já antes desta data, o Porto tinha ganho um caráter autonómico. A “doação plena” da rainha D. Teresa, mãe de D. Afonso Henriques, ao bispo D. Hugo garantia já uma relativa autonomia. “O senhor da cidade passou a ser o bispo do Porto”, conta António Barros Cardoso.
Com o foral, outorgado em 1123, pelo bispo D. Hugo, foi assegurada uma relativa “autonomia” para os portuenses, visível na procura de consenso entre os “Homens Bons” da cidade. Este foral conferiu uma certa “personalidade política”, pela presença destas pessoas destacadas na sociedade portuense no exercício de funções do bispo.
“Havia já uma estrutura autonómica da cidade perante o seu senhor”, explica Barros Cardoso. A partir de 1147, data da conquista de Lisboa aos Mouros por D. Afonso Henriques, esta autonomia foi mais notada porque a cidade ficou “completamente liberta” da presença de muçulmanos e dos conflitos que a convivência com os nativos causava.
Entre 1147 e 1406, este jogo de poderes entre a Igreja e a Coroa dentro da cidade foi notório, como que uma dualidade de poderes. “Sempre que a população queria resolver problemas dirigia-se ao rei; quando o rei queria interferir na cidade contra os interesses dos moradores, acorriam ao bispo”, conta o especialista em História Local. Há, portanto, uma série de arrufos que só terminaram quando a jurisdição passou para as mãos do monarca.
Entre D. Afonso IV e o bispo portuense D. Pedro Afonso surgiram vários conflitos que só terminaram em 1354, com a formação de um conselho de juízes eleitos pelos “Homens Bons” da cidade. Um esboço do que viria a ser a estrutura municipal, onde se podia falar já de uma certa laicização do concelho.
A concordata entre o rei D. João I e o bispo D. Gil Alma formalizou a passagem das terras para a Coroa. A partir daqui, a cidade “ganhou asas”. A Invicta expandiu-se para os territórios que agora são de Matosinhos, da Maia e de Vila Nova de Gaia.
Apesar da venda da cidade a D. João I, o bispo não perdeu todos o poder sobre ela. No foral de 1517 encontram-se muitos direitos concedidos ao chefe da Igreja portuense, que só foram abolidos em 1820 com a implantação do Liberalismo.
A partir de 1406, o governo do concelho deixou de ser regulamentado pela Igreja do Porto e passou a pertencer à Coroa. O rei nomeou “Juízes de Fora”, com funções semelhantes aos presidentes de Câmara, para representar o poder central e para “desempatar conflitos” e situações de impasse em questões levantadas por uma vereação constituída por quatro vereadores.
Para além desta estrutura municipal, no final do século XV (1475), surgiu a “Casa dos 24”. Um organismo de representação da população que exercia a função de Câmara Corporativa junto da vereação da cidade. A “Casa dos 24” tinha o direito de nomear dois procuradores para, em colaboração com os vereadores eleitos, “responder pelos direitos do povo”, explicou o especialista em História Local.
Em 1518, houve uma reorganização da “Casa dos 24”, com o estabelecimento dos seus direitos e deveres. A Presidência de Câmara chegou apenas no século XIX.
O processo de autonomia do Porto foi sendo “muito partilhado com o povo”, remata António Barros Cardoso.
Assembleia Municipal: O local de debate político da cidade
A Assembleia Municipal é um dos dois órgãos representativos nos municípios em Portugal, juntamente com a Câmara que é o órgão executivo. Em declarações ao JPN, o presidente da Assembleia Municipal do Porto, Miguel Pereira Leite, considera que esta estrutura é “um órgão fundamental onde estão representados todos os eleitos pelos cidadãos do Porto”.
Assembleia Municipal do Porto
No executivo do Porto estão representadas as quatro forças políticas eleitas: o movimento independente liderado por Rui Moreira, o PS, o PSD e a CDU. Na assembleia, para além destes, está presente também o Bloco de Esquerda, num total de 46 elementos que representam “todas as forças políticas eleitas na cidade”.
A assembleia assume funções que não se restringem apenas à deliberação, mas também à fiscalização da Câmara Municipal.
“As funções da Assembleia Municipal estão atribuídas na lei”, esclarece o presidente. A aprovação do orçamento do município, das taxas da autarquia, a deliberação sobre o poder tributário da cidade, a autorização de empréstimos a contratar pela Câmara Municipal, a aprovação de regulamentos são algumas das funções que competem aos membros da assembleia.
Na opinião do presidente da Assembleia Municipal do Porto, “os portuenses participam nas Assembleias Municipais, desde logo elegendo os seus representantes” para o “local do debate político da cidade por excelência”.
Miguel Pereira Leite preside à Assembleia Municipal desde fevereiro de 2014 e faz “um balanço extremamente positivo” do trabalho desenvolvido. Um trabalho que considera que tem sido feito “de uma forma que muito dignifica a cidade e a atividade do município, com um debate intenso, mas correto e cordial, em que participam todas as forças políticas”.
Para o presidente da assembleia, “os desafios não são apenas os da assembleia, são os do poder local”, que passam por conferir mais competências às estruturas municipais. Desta forma, Miguel Pereira Leite acredita que a gestão pode ser “mais eficiente, mais económica, mais racional na utilização dos recursos públicos”.
“A Assembleia Municipal, tal como o executivo, corporizam melhor a ideia de um Estado de proximidade, de relação com os cidadãos”, refere Pereira Leite.
Partindo desta ideia, o presidente da assembleia quer “sensibilizar o Estado para que esteja disponível para transferir novas competências para os municípios”, de forma a que possam “valorizar os recursos” que são postos ao dispor de todos os cidadãos.
Artigo editado por Sara Gerivaz