Há quatro projetos de intervenção cultural para apreciar no Av. Espaço Montepio, escolhidos entre mais de 60 candidaturas para a primeira fase de residência artística. Duas duplas e dois artistas a solo constituíram a primeira equipa que dispôs do espaço para a produção artística.

As raízes, as memórias e o fascínio

Alexandra Rafael expõe um “trabalho muito pessoal” em toda a extensão de uma parede da sala principal. O projeto chama-se “Raízes” e é feito não só descobertas que o espaço lhe proporcionou, como também das suas recordações de infância, como explica em entrevista ao JPN.

É um único projeto que se desdobra em quatro vertentes: duas chapas metálicas que imitam as portas originais do espaço e dois trabalhos de desenho e papel.

Alexandra conta ao JPN que o seu avô trabalhava num banco Montepio, o que a fez regressar ao passado, aos tempos em que era proibida de mexer nalgumas coisas. “Não toques, são coisas do avô, são números e papéis importantes”, ouvia. Para uma das composições, recolheu materiais e papéis que o seu avô tinha, juntando padrões. Já no segundo trabalho de papel, fez representar a sua avó, costureira, que usava materiais e tecidos com que tinha de ter o maior cuidado.

A artista considera que abrir uma gaveta sem saber o que está dentro é “um momento de fascínio” e essa é a razão de ter instalado gavetas debaixo dos trabalhos, criando um “ambiente de arquivo”.

Alexandra resume ter usado texturas do edifício, dos números e das linhas de costura. Ao JPN, conta que trabalha frequentemente com texturas, gravuras e objetos que encontra e que se inspira em espaços abandonados, familiares ou não.

Sonhos e ilusões

Carlos Mensil emoldurou sonhos e paisagens em alumínio. Como explicam as guias durante a visita, as chapas de alumínio suspensas no ar representam as linhas de uma janela quebrada.

Na visita é também explicado que um outro trabalho de Carlos é considerado a obra preferida de muitos visitantes. “A obra engana”, contam as guias. A sombra refletida na parede cria a ilusão de o material ser o vidro, quando na verdade, é também, chapa de alumínio.

Um holofote está localizado debaixo das chapas, a emitir luz em tons de dourado, recriando barras de ouro que os bancos guardam. A regra artística do retângulo de ouro e as antigas publicidades dos bancos estão patentes no trabalho.

Um arquivo de vivências do Porto

Pedro Ferreira e Assunta Alegiani inventaram três instalações multimédia, distribuídas por várias salas. Na sala principal, o par colocou uma televisão HD, que passa um vídeo da Ribeira do Porto. Com as imagens recolhidas, Pedro e Assunta quiseram “arquivar o presente” da Ribeira. A televisão é disposta na vertical para destacar as camadas de pedra em que o Porto assenta.

Numa outra sala, os projetores demonstram ruínas existentes na cidade do Porto.

Ainda num terceiro espaço, Pedro Ferreira e Assunta Alegiani, tentaram criar um ambiente “familiar”, em que o contacto com a natureza é enaltecido. Desta vez, os vídeos vêm da década de 70, quando as famílias se juntavam para fazer piqueniques nos jardins da cidade. A película foi pintada manualmente, com tintas e marcadores, para enfatizar a diferença entre o passado e o presente: já não há tantos espaços verdes que as famílias possam usar para fazer piqueniques.

Os artistas estenderam uma toalha de mesa e recriaram o ambiente de piquenique no dia da inauguração: as broas e os chouriços não podiam faltar.

Histórias esquecidas

Catarina Azevedo e Karen Lacroix construíram uma pequena biblioteca para o Espaço Montepio, mas querem que percorra o mundo. A obra envolveu uma vasta recolha de informações e de fotografias de ruínas. As ilhas e os espaços abandonados do Porto estão contemplados em pequenos livros, nascidos do trabalho manual que as artistas elaboraram com rigor.

Apesar de não haver muita natureza no centro urbano, as plantas presentes na obra destacam a vida e a natureza que a cidade já teve.

Num segundo conjunto, a dupla formada por Catarina Azevedo e Karen Lacroix conseguiu, através de várias fotografias, emoldurar o passado e mostrar um ambiente mais caseiro e uma parte mais íntima do Porto.

Durante a visita é explicado que o objetivo do projeto é mostrar que o Porto é uma pequena cidade com “coisas fantásticas”, cujo passado está a ser relembrado, principalmente porque a cidade está a ser alvo de várias construções.

Carlos Mensil e Alexandra Rafael focaram-se muito no espaço da exposição. As duplas de Assunta Alegiani com Pedro Ferreira e de Karen Lacroix com Catarina Azevedo basearam-se na cidade. A base de todos os trabalhos é fazer com que o Porto fique reconhecido no mapa. “Fazer renascer o passado e relembrar as memórias do edifício e da cidade”, também são objetivos das obras.

A “coleção de olhares” de Cláudio Reis

Cláudio Reis é um dos artistas selecionado para a segunda fase de residência artística no Espaço Montepio. O projeto denomina-se “um quotidiano/an everyday”.

Ainda na fase de arranque, o artista reúne fotografias de pessoas que queiram partilhar as próprias experiências fotográficas do dia a dia. Cláudio imprime as fotografias que lhe são enviadas por correio eletrónico e cria um “caleidoscópio” de imagens totalmente diferentes.

Qualquer unidade ganha uma nova maneira de ser vista. A junção “vai proporcionar um olhar mais lento sobre as fotografias, que na maioria das vezes são vistas num ápice”, no “feed” de uma rede social, como explana Cláudio Reis ao JPN. O artista vai contrariar essa maneira de ver tomando o controlo do ritmo de leitura das imagens. A “coleção de olhares”, como nomeia o projeto, vai inspirar ainda outro trabalho que Cláudio vai criar em paralelo.

Cláudio Reis revela que a residência artística oferecida pela Porto Lazer é uma grande ajuda para poder realizar o seu projeto. Além disso, todos os projetos recebem uma bolsa de produção, com o valor máximo de 750 euros. São estes alguns dos motivos que o incentivam a trabalhar.

Ainda em conversa com o JPN, Cláudio Reis reconhece que a exposição coletiva vai ter trabalhos muito diferentes.

Para além do projeto de Cláudio Reis em fotografia, a segunda fase elegeu três propostas entre 57: Luísa Abreu vai criar uma nova instalação, Bruno Ministro vai desenvolver trabalho nas categorias Instalação e Performance, e Mariana Moranduzzo vai produzir o projeto com Instalação e Multimédia.

A exposição do primeiro grupo está patente até ao dia 26 de abril, enquanto o segundo grupo realiza o seu trabalho em residência artística até 7 de maio. A 14 de maio inicia-se a exposição com os trabalhos do segundo turno.

 

Artigo editado por Sara Gerivaz