Os problemas da habitação e a falta de políticas habitacionais no país foram questões discutidas, esta quinta-feira, na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP).

Os especialistas presentes defenderam a falta de políticas de habitação no país que correspondam às necessidades reais da população, sobretudo em contexto de crise, em que os despejos são sistemáticos.

De acordo com os oradores, é inegável a grande taxa de propriedade de habitação no país. “O português tem a natural tendência e aptidão para ser o proprietário da sua casa”, notou Tiago Saraiva. O sócio-gerente do Ateliermob designou o fenómeno como “sonho proprietarista” e explicou que este foi surgindo a partir de 1983, devido às leis que facilitavam o crédito imobiliário tornando-o universal.

Tiago Saraiva, salientou o facto de que as pessoas “nunca chegam a ser proprietários da casa, porque ficam até ao fim da vida a pagar um crédito”, no entanto,  é “mais vantajoso o crédito do que arrendar”. Uma opinião partilhada por Rita Silva da Associação Habita: “O arrendamento implica uma taxa de esforço maior em termos económicos do que o crédito”.

Isabel Guerra, professora catedrática reformada do ISCTE-IUL, apontou também “o peso da construção civil no contexto português” como outro factor para os portugueses gostarem de ser os proprietários das suas habitações. A professora e investigadora destacou, contudo, que a propriedade da casa “não é igual para todos” e está segmentada entre os vários grupos etários: “Nós hoje temos uma geração que já pagou a casa, temos uma que está enterrada até ao pescoço com a renda da casa e com as situações de desemprego e baixas de salários e temos a geração atual, que está em casa dos pais, sem qualquer oportunidade de ter acesso à habitação”.

Os problemas do “investimento tão grande na propriedade da casa” também foram discutidos. Para Isabel Guerra, os portugueses retiram muito “ao lazer, ao investimento na educação das crianças e a outras formas de cultura porque a casa assume um peso muito significativo”. Uma ideia também reforçada por Tiago Mota Saraiva: “Há muita gente que não tem uma alimentação saudável e isso é uma consequência deste sonho proprietarista”.

Os especialistas realçaram que o contexto de crise económica do país dificulta o pagamento das prestações à banca, o que tem feito com que “muitas famílias tenham de abandonar a sua casa”, sendo os despejos cada vez mais frequentes e em maior número.

Para além disso, Rita Silva nota que “obter crédito está difícil, comprar é difícil e arrendar também está difícil”, o que levanta problemas para a situação da habitação em Portugal. Para a técnica da Associação Habita, a reabilitação urbana e o turismo estão a tomar muito da cidade e o progressivo aumento das rendas nos centros das principais cidades está a tornar as habitações nestes espaços acessível apenas às classes mais altas, aos estrangeiros e ao turismo.

Tiago Saraiva concorda: “Basta haver um acontecimento como, por exemplo, uma bomba que há imediatamente uma quebra nas receitas com o turismo e ao longo do processo todas as unidades hoteleiras desaparecem”, notou. “Uma tese de futuro na arquitetura é a reconversão de unidades hoteleiras no que quiserem”, brincou.

A opinião é unânime entre os oradores: falta pensamento estratégico em relação à habitação. Isabel Guerra defendeu a necessidade de haver uma “relação entre as políticas de habitação e as políticas da cidade, nomeadamente as políticas de reabilitação” e dá o exemplo da Catalunha “que estipulava que uma percentagem dos espaços reabilitados fossem para a habitação de custos controlados”. Para a investigadora esta era uma forma de “manter a habitação social e a população no centro da cidade”.

Artigo editado por Sara Gerivaz