O mandato de 10 anos de Ban Ki-moon ficou marcado por vários conflitos armados e por um agravamento das condições de vida à escala global. Apesar da Organização das Nações Unidas (ONU) não ter um papel nas políticas económicas mundiais, tem uma função de gestão das desigualdades e de promoção da paz, ordem e estabilidade mundiais.

No entanto, são muitos os que concordam que a inércia da organização sobrepôs-se à sua missão. As fragilidades da ONU revelam-se e as Nações Unidas começam a perder uma certa autoridade no cenário mundial.

António Monteiro, antigo embaixador português com uma longa carreira diplomática ligada às Nações Unidas, reforça que “a ONU tem como principal objetivo zelar pela paz e pela segurança internacionais e, portanto, o papel da ONU é sempre um papel desejavelmente desempenhado no sentido de encontrar plataformas de entendimento sobretudo em situações de extrema violência, como esta que se verifica no Médio Oriente”.

Contudo, reconhece: “Infelizmente, desde a sua criação, as Nações Unidas não conseguiram ter um papel fundamental na questão do Médio Oriente. Mas isso não é culpa inteiramente das Nações Unidas, a culpa principal aqui até talvez se possa dividir nos países que a compõem porque a vontade da ONU é a vontade política dos países e sobretudo [daqueles] ao nível do Conselho de Segurança.”

Relativamente aos escândalos sexuais que abalaram o mandato de Ban Ki-moon, o embaixador acredita que “é absolutamente necessário que as Nações Unidas invistam cada vez mais na formação e na prevenção, que muitas vezes negligencia,  de forma a garantir que as operações de paz correspondam aos interesses dos países onde elas se desenrolam e das populações locais e não a interesses e apetites daqueles que compõem as relações dos capazes azuis.”

Por fim, o balanço que António Monteiro faz do mandato de Ban Ki-moon é que este foi um mandato marcado por anos de vários conflitos e crises: “Foram anos muito especiais no mundo, com graves problemas, com uma grande focagem nos problemas económicos. Desde 2008 que vivemos em crises sucessivas que afetaram praticamente todo o mundo, e em que o papel das Nações Unidas foi em muitos aspetos marginalizado.”

O antigo diplomata acredita que o Conselho Económico e Social das Nações Unidas não teve uma atuação muito relevante no alívio da crise e dos acontecimentos destes últimos anos. “Isso não foi culpa do Secretário-Geral, foi, digamos, culpa um pouco do ambiente internacional, sendo que também se acentuaram muito nacionalismos e perdeu alguma força o multinaturalismo”, reflete.

Por fim, António Monteiro constata que após o tempo de Kofi Annan, o escândalo do “Oil-for-food” e do surgimento de um novo olhar de desconfiança sobre as Nações Unidas, “Ban Ki-moon teve um mandato mais tranquilo, com menos visibilidade, mais sujeito à maneira como os países olharam para as Nações Unidas como instrumento principal da segurança, paz e estabilidade no mundo”.

“Diria que este foi um mandato mais de administrador das Nações Unidas do que propriamente de promotor e é por isso que muita gente agora olha para o seu sucessor com a expectativa de encontrar um general capaz de conduzir as tropas, para que eles próprios possam beneficiar de uma acção mais efetiva e mais próxima daquilo que exigem as crises com que as Nações Unidas se defrontam”, conclui.

Ban Ki-moon termina o mandato iniciado em 2007 no final deste ano. A eleição do seu sucessor deve acontecer por essa altura. Há, para já, nove candidatos ao cargo, classificado pelo primeiro secretário-geral da organização como o “emprego mais impossível do mundo”. Entre eles, está o antigo primeiro-ministro português António Guterres.

 

Artigo editado por Filipa Silva