Num mundo cada vez mais globalizado e em que o virtual caminha lado a lado com o real, o quão seguros estamos? O que sabemos realmente – e o quanto nos preocupamos em saber – da nossa privacidade? O que sabemos também do que os outros, em particular as empresas, sabem e guardam sobre a nossa vida?

Foi com este mote que o partido PAN – Pessoas, Animais, Natureza – organizou o workshop intitulado “Recuperar a privacidade digital”. O encontro decorreu na passada sexta-feira, no Espaço PAN, no Porto e contou com a colaboração do proprietário e jornalista do Tugaleaks, Rui Cruz.

Com um percurso que começou no final de 2010, na mesma altura em que Julien Assange e o Wikileaks causavam um enorme escândalo na diplomacia americana e mundial, o Tugaleaks surgiu como uma forma de apoio à causa de Assange. No início era uma espécie de “espelho”, do termo inglês “mirror”, do sítio web original. Com o tempo, Rui Cruz viu crescer o interesse neste projeto e reorganizou-o, nascendo um Wikileaks dedicado à realidade portuguesa.

Como é que se recupera a segurança digital? Importa primeiro esclarecer: não se trata necessariamente de insegurança, até porque o que esteve realmente em debate não foi o cibercrime, o roubo de identidade ou de contas. O foco desta iniciativa prendeu-se mais com a ausência, cada vez mais crescente, de privacidade e com um mundo online cada vez mais controlado e monitorizado. Hoje em dia não só as empresas, mas também as autoridades vigiam os utilizadores e as suas atividades e simples contratos de uso de serviços “escondem” outros interesses.

De acordo com Rui Cruz a privacidade online passa, em parte, por ser capaz de se manter anónimo. Evitar programas ou pessoas que rastreiem o IP de um computador, que monitorizem sítios web e que as empresas recolham dados sobre nós, seja para publicidade ou para outros fins. Um dos problemas destacados pelo responsável do Tugaleaks foi a falta de garantias e obrigações legais de as empresas mostrarem exatamente que dados recolhem da nossa “pegada digital”, onde os guardam e para que fins os usam.

O que pode o utilizador de Internet fazer para se manter anónimo no dia-a-dia? Há várias ferramentas para ocultar quase tudo o que se faz online. Desde logo o TOR, The Onion Router, um navegador exatamente igual ao Google Chrome ou Firefox, com uma diferença fundamental: este navegador impede, de forma quase total, que o IP da máquina que está a ser usada possa ser identificado. O sinal inicial é reencaminhado por diversos outros, até chegar ao servidor do sítio que estamos a visitar, passando por vários pontos em diferentes países. Mas há vários outros programas e formas de garantir a privacidade online.

O tema das conversas digitais foi também um dos mais abordados no workshop. Garantir que as conversas que temos se mantêm privadas e sem olhares de terceiros. Algo que para Rui Cruz enquanto jornalista é essencial e que lhe permite proteger-se a si e às suas fontes.

Numa altura em que cada vez mais pessoas trabalham, socializam e vivem num mundo virtual, há uma preocupação crescente, ainda que não dominante, de controlar aquilo que é, para todos os efeitos, nosso, no mundo online. A máxima de que tudo o que é posto online nunca mais desaparece tem ganho força e com ela surgem preocupações sobre privacidade e segurança. Ainda que, no meio de milhões de terabytes de dados, seja já um pouco impossível controlar o que já está feito.

A ligação com o grupo Anonymous e o hacktivismo

É um pensamento inevitável quando se ouve a palavra anónimo. O grupo Anonymous existe há vários anos mas tornou-se realmente conhecido em 2008. Daí em diante, cresceu exponencialmente, com sub-grupos em vários países e grupos que se dizem parte integrante da Anonymous. Embora sem dados exatos sobre o grupo, é inegável que a sua presença online se tem feito sentir, em ataques a várias entidades públicas e privadas.

Em Portugal o grupo Anonymous tem deixado a sua marca e tem tido uma espécie de guerra com as autoridades, em particular com a Polícia Judiciária, devido aos ataques informáticos que fazem a sítios web do Estado.

Rui Cruz confirma que conhece vários membros do grupo e que no seu trabalho enquanto jornalista contacta com eles. Mas ressalva que não é um hacker, nem sequer um hacktivista, antes alguém que se revê no grupo e que presencia algumas das suas atividades.

Aliás, parte do “workshop” da passada sexta-feira incidiu precisamente nisso: em hackers e no hacktivismo. Rui Cruz distingue três tipos de hackers: os “white hats”, que se dedicam a tentar garantir a segurança do mundo online e a denunciar certos assuntos; os “grey hats”, que oscilam entre ajudar os outros e usar os conhecimentos informáticos em proveito próprio; e os “black hats”, que procuram apenas destruir dados, danificar máquinas ou beneficiar das falhas de segurança online.

O termo hacktivismo surgiu nos anos 90, com os primeiros ataques informáticos contra páginas web governamentais e sítios de empresas relacionadas com a indústria nuclear. Com o aparecimento do grupo Anonymous, o hacktivismo ganhou força e é usado para referir atividades de hackers que procuram atingir grupos com uma conotação social má: nos últimos anos, grupos como o KKK e o ISIS têm sido alvos de ataques informáticos constantes.

Artigo editado por Sara Gerivaz