Um é conhecido como o bairro chinês, outro como o bairro do “desleixo”. Um fica no Porto e outro em Barcelona, mas há uma ponte de mitos a unir os dois locais. O tema esteve em discussão na passada terça-feira na FPCEUP.

“A destruição da realidade: estratégias de controle urbano em territórios híper-estigmatizados” foi o fio condutor da conferência que decorreu na passada terça-feira na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP). Miquel Fernández González da Universidade Autónoma de Barcelona e João Queirós da Faculdade de Letras da Universidade do Porto discutiram a relação entre intervenções urbanísticas e o controle de grupos e territórios estigmatizados, a partir das suas investigações no Barrio Xino (Barcelona) e no Bairro do Aleixo (Porto), respetivamente.

Expectativas versus Realidade

Quando o Bairro do Aleixo foi apresentado, surgiu como um “projeto piloto” inovador que contaria, para além das cinco torres e da escola, com “um vasto conjunto de equipamentos de ordem desportiva e cultural que ficavam entre as duas torres mais a sul”, explica João Queirós.

O investigador adianta que “havia expectativas altas da génese do bairro que cedo caíram por terra ou pelo menos foram colocadas com um ponto de interrogação bem forte”.

Por outro lado, o “Barrio Xino”, em Barcelona, contou desde cedo com o desinteresse das autoridades municipais que Miquel Fernández diz terem protagonizado “a ida e vinda de discursos insultuosos sobre a rua”.

E se em tempos as culpas eram apontadas à comunidade de imigrantes e à decadência do bairro, hoje há, segundo o investigador, um interesse destas autoridades em “mostrar o lado positivo do lugar e ocultar o negativo, inclusive converter o negativo em negócio, isto é, converter este mito da vida boémia e de pequenas delinquências e prostituição num atrativo”.

A responsabilidade social do urbanismo

Miquel Fernández defende que o urbanismo deve ser pensado para protege as pessoas e que a responsabilidade social “deve fazer parte de todos os processos”.

No entanto, segundo os investigadores, esta preocupação não se refletiu nos bairros que estudaram e Miquel Fernández acusa as administrações públicas de Barcelona de colocarem os seus interesses à frente dos interesses da população: “Os governos prepararam os terrenos para futuras intervenções urbanísticas e fiscalizadoras contra grandes camadas da população, com especial amplitude e especial dureza sobre os grupos mais débeis e mais pobres”, explica o investigador.

No Aleixo, as culpas são apontadas ao universo da droga, mas João Queirós deixa a ressalva de que o processo é mais complexo “e integra, desde logo, expectativas frustradas no que diz respeito à construção, ao equipamento e à manutenção do bairro, não asseguradas pelo senhorio”.

O investigador do Departamento de Sociologia da FLUP garante que situações como esta integram também transformações económicas importantes “que contribuíram também para a proliferação do desemprego, para a proliferação dos problemas em termos de recursos económicos”, remata.

 

Artigo editado por Filipa Silva