Diretamente de Westeros para a Faculdade de Economia do Porto, os mundos da ficção e da realidade uniram-se esta terça-feira. A ideia foi comparar a série “Game of Thrones” ao mundo real da Economia e Gestão.

O que será que Jon Snow e a Troika têm em comum? À primeira vista não terão grandes semelhanças, mas a verdade é que ambos partilharam uma espécie de liderança fracassada.

O paralelismo entre a série norte-americana “Game of Thrones” (GOT) e o mundo dos negócios foi, esta terça-feira, discutido na Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP). Após algumas horas de conversa, os oradores Rui Soares Almeida, “Chief Financial Officer” (CFO) da Sonae MC e Francisco Galope, jornalista da revista Visão concordaram que é possível retirar várias lições da série televisiva.

Questionado sobre qual seria o melhor “líder” de GOT, Rui Soares Almeida comparou a ficção e a história económica portuguesa, e afirmou que tanto Jon Snow como o FMI e a Troika eram bons líderes. Isto porque ambos agendaram planos lógicos e corajosos, no entanto, fracassaram porque não tiveram em conta a cultura das pessoas que os rodeavam.

Mais especificamente, o FMI e a Troika “não prestaram atenção à cultura portuguesa” e o líder Jon Snow não tomou em consideração a cultura dos colegas da “Night’s Watch”, o que os conduziu ao fracasso. “A cultura das organizações sobrepõe-se sempre à estratégia que está a ser implementada”, sustentou.

Rui Soares Almeida acredita que a série ensina bastante as pessoas sobre estratégias de se distinguirem e de “criar planos de ação que os levem a ser os vencedores da Guerra dos Tronos”. O CFO da Sonae MC considera até que “isso é que devia estar presente em todas as empresas para as próprias empresas terem um plano cada vez mais sustentável para serem vencedoras no mundo real.”

Perceção, coragem, poder e risco

Para além do destaque ao protagonista, a comparação envolveu também Tywin Lannister e Petyr Baelish e a valorização da marca. Tal como Tywin Lannister afirma “qualquer homem que se intitule rei, não é verdadeiramente um rei”, no mundo empresarial é necessário ter a perceção das qualidades e defeitos de um produto, sendo que “um produto que diz ser muito bom, pode não ser assim tão bom”.

Em relação à coragem, é de um diálogo de Bran e Eddard Stark que se pode tirar uma lição. A determinada altura, Bran coloca ao pai a seguinte questão: “Como é que um homem pode ser corajoso, se tem medo?”, à qual Eddard Stark responde: “Essa é a única vez que um homem pode ser corajoso”.

Rui Soares Almeida acredita que podemos associar este diálogo à diferença entre eficiência e eficácia. Enquanto que “a eficiência tem uma lógica incremental de otimização”, – não é necessário ter coragem porque já temos o conhecimento necessário – “a eficácia diz respeito a coisas novas e a momentos corajosos que implicam uma mudança”.

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Rui Soares Almeida estabeleceu inúmeros paralelismos entre GOT e o mundo dos negócios

A personagem da história com quem o CFO da Sonae MC menos concorda é Cersei Lannister.  Prova disso é o diálogo no qual Petyr Baelish afirma que “conhecimento é poder” e Cersei refuta dizendo que “poder é poder”. Rui Almeida constata que poder é diferente de autoridade e “o poder do conhecimento e da informação é bastante importante” e a autoridade tem sempre um fim. “Quanto mais pessoas amares, mais fraco és”, também é uma das declarações de Cersei que Rui acredita estar completamente errada. A componente relacional tem extrema importância tanto ao nível pessoal quanto profissional.

E quanto ao risco? O risco é algo a ter em consideração certamente. A frase de Petyr Baelish que diz que “aquilo que não sabemos é o que normalmente nos mata”, pode estar relacionada com o risco que as empresas correm no futuro. É necessário identificar os riscos, classificar a sua probabilidade e impacto, para se poder eliminar e antecipar problemas.

O planeamento estratégico para vencer

“Game of Thrones” pode ainda dar algumas noções sobre a organização, estrutura e estratégia das empresas. Tal como afirma Lorde Varys, “o conhecimento é o meu negócio e a informação é a chave”, na lógica empresarial a Central de Informação do Mercado (CBI) é uma equipa essencial para o sucesso de uma empresa.

Já Petyr Baelish tem algo a ensinar sobre planeamento estratégico: “Mantém sempre os teus inimigos confusos. Se eles nunca estiverem certos de quem tu és e daquilo que queres, nunca poderão saber o que vais fazer a seguir”.

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O CFO da Sonae FC considera que a família Stark será vencedora da Guerra dos Tronos

O pequeno Tyrion Lannister tem também algo a dizer sobre esta questão: “Nunca te esqueças do que és. O resto do mundo não esquecerá. Usa-o como uma armadura e isso nunca poderá ser usado para te magoar”. Fazendo o paralelismo com o mundo empresarial, é necessário a empresa nunca se esquecer do contexto em que se insere, das ofertas dos seus concorrentes, das necessidades dos clientes e das capacidades da organização.

Tendo em conta os ativos estratégicos, as ligações privilegiadas, a componente relacional e as competências distintivas, para o CFO da Sonae MC, o vencedor do Trono de Ferro será a família Stark. Esta é aquela que tem uma componente de linhagem, um nome e aliados e, apesar da condição física de Bran Stark, este poderá vir a ser o rei.

“You know nothing Jon Snow”

Pode-se pensar que Jon Snow não sabe nada, mas afinal ele não sabe tão pouco assim. Quem não se lembra do famoso diálogo no qual Ygritte diz ao ex-comandante da Patrulha da Noite “Tu não sabes nada, Jon Snow”, ao que ele responde “Eu posso não saber nada, mas eu sei que me tornas mais forte do que aço valiriano”.

Rui Soares Almeida afirmou que o objetivo é a partilha de conhecimento e que, ao longo da nossa vida pessoal e profissional, é importante ter noção que não sabemos tudo e “aceitar que só poderemos progredir com o auxílio daqueles que têm algo para nos ensinar”.

Um mundo de desigualdades

“Se nós formos olhar para procedimentos e para a nossa história económica conseguimos encontrar, de facto, paralelismos”, indicou Francisco Galope, da Visão, ao JPN. Na sua opinião, “Game of Thrones” demonstra as desigualdades sociais também existentes na nossa sociedade. “Poupa quem pode e não quem quer” e existe uma classe dominante e uma dominada.

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A personagem preferida de Francisco Galope é Tyrion Lannister, uma vez que provou que “conhecimento é mesmo poder”

Para além das dificuldades económicas, a série figura o conflito de interesses e a desigualdade de género que são bastante reais. Por exemplo, a personagem Brienne of Tarth é uma guerreira que enfrenta obstáculos na ascensão profissional, nomeadamente na sua candidatura a um lugar na Guarda Real, por ser mulher. Francisco Galope destacou que a desigualdade de géneros está também muito enraizada na nossa sociedade.

Em Portugal, as mulheres ganham, em média, cerca de 15% menos do que os homens no mesmo posto de trabalho. A Estónia e a Alemanha são os países mais preocupantes neste aspeto, pois o gap salarial entre homens e mulheres é de cerca de 28% e 22%, respetivamente.

As dívidas e o poder dos bancos

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Alguns dezenas de estudantes acompanharam a viagem de Westeros à FEP na terça-feira

Quanto aos aspetos económicos, o trono é controlado pelos Lannister que injetaram dinheiro nos cofres do Estado. Os Lannister acabam por falir, devido às dívidas que a Coroa tinha a pagar. Cersei Lannister negoceia a dívida com alguns credores, mas não com o Banco de Ferro, tal como aconteceu em Portugal com a Troika. Já o Banco de Ferro pode ser associado ao FMI e ao Banco Mundial juntos, tornando-se evidente na série a “influência que uma instituição económica externa pode ter na vida política do país”.

Tyrion Lannister é a personagem preferida de Francisco Galope, uma vez que foi a “Mão do Rei” mais competente e que se apercebeu do buraco e das dívidas através do seu conhecimento adquirido pela leitura, o que prova que “a chave é mesmo o conhecimento”.

O jornalista acredita ainda que é pelo Norte que a guerra se vai decidir e que o vencedor a sentar-se no trono será o próximo que o Banco de Ferro apoiar.

 

Artigo editado por Sara Gerivaz