O presidente da Câmara de Famalicão, Paulo Cunha, defende a antecipação do voto para os 16 anos. Estudo do ICS mostra quebra no interesse dos jovens pela política entre 2007 e 2015.

O presidente da Câmara de Vila Nova de Famalicão, Paulo Cunha, defende a antecipação da participação eleitoral dos jovens dos 18 para os 16 anos. A posição do autarca famalicense foi transmitida na primeira pessoa aos jovens membros do Conselho Municipal da Juventude, na reunião do órgão que se realizou na passada segunda-feira, dia 30 de maio.

“Mais que uma proposta, isto é um ponto de vista. Enquanto cidadão deste concelho e deste país, tenho percebido que são cada vez menos as diferenças entre os jovens de 16 e 18 anos, e acho que nós devemos antecipar a nossa intervenção com os jovens, de forma a envolvê-los nos processos comunitários”, defende o autarca em entrevista ao JPN.

Questionado sobre a maturidade política que um jovem de 16 anos pode ter, o presidente sublinhou que é aos 16 anos que se tomam “as decisões mais relevantes para o futuro”.

“Um jovem com 16 anos, se praticar um delito com relevância criminal, é crime e pode ser sujeito a uma pena de prisão. Com 16 anos pode contrair matrimónio, celebrar um contrato de trabalho e escolher um curso superior. Portanto, uma sociedade que entende que um jovem de 16 anos tem a maturidade para tomar este tipo de decisões, porque razão não conclui que tem maturidade suficiente para votar?”, questionou Paulo Cunha.

Apesar disso, e reconhecendo que, de facto, os jovens não têm todos a mesma maturidade, o autarca salientou que “a sociedade não deve limitar-se a constatar esse facto”, mas sim “trabalhar para que essa circunstância evolua”. Como? Na opinião de Paulo Cunha, “criando condições para que os jovens de 15, 16, 17 ou 18 anos, tenham a tal maturidade que alguns acham que não têm, para que possam participar, não só nas eleições, mas na vida comunitária”.

“Eu não defendo só que um jovem com 16 anos vote. Eu defendo também que um jovem de 16, 17 ou 18 anos, tão cedo quanto possível, possa participar na definição do nosso processo colectivo, não só votando. Neste momento, a esmagadora maioria das decisões são tomadas sem a participação dos jovens”, defendeu Paulo Cunha.

Também questionado sobre a fraca intervenção política por parte dos jovens, o autarca acredita que esta medida poderá ajudar a contornar isso: “Eu entendo que se nós estivermos no terreno com os jovens mais cedo, nós vamos ser mais eficazes na nossa ação”.

“Entendo que se essa conjugação existir, nós conseguiremos ultrapassar esse problema e será possível acabar com a ideia de que os jovens estão de costas voltadas para a sociedade, para a política e para as causas públicas”, acrescentou o presidente.

Paulo Cunha adiantou ainda ao JPN que a autarquia vai abrir um processo de auscultação que envolve as escolas: “vamos ouvir as associações das escolas para eles trazerem ideias concretas, e depois definirmos um pacote de medidas que vamos colocar no terreno para desenvolver este programa de intervenção cívica”.

Sobre este assunto, o JPN falou também com Rosina Pereira, fundadora da Academia Política Apartidária (APA),  uma organização sem fins lucrativos criada e constituída por alunos da Universidade do Porto que objectiva a criação de uma “escola de política” à margem de qualquer instituição político-partidária, que disse que “gostava muito que houvesse voto aos 16 anos”, no entanto, acredita que este “ainda não é o ‘timing'”.

Rosina defende que “primeiro existe todo um percurso de consciencialização e de espírito crítico que é preciso ser fomentado nas próprias escolas”.

“Só depois, quando os jovens tiverem mais conhecimento daquilo em que eles acreditam ou não, conseguirem ter uma visão mais alargada daquilo que é a sociedade e tiverem um espírito crítico mais forte, aí sim, votarem aos 16 anos. Caso contrário, isso pode causar um enviesamento daquilo que é, ou não, o voto”, salientou a fundadora da APA.

Nesse sentido, para a fundadora da Academia, a educação nas escolas tem um papel preponderante: “Acho que a verdadeira reforma do sistema político está na reforma da educação. Só assim é que se vai conseguir preparar cidadãos conscientes, que escrutinem a atividade política que existe ou não, e que exijam mais, que sejam mais reivindicativos. E isso vai fazer com que os agentes políticos, por terem consciência de que tem um público mais atento, também se preocupem com aquilo que fazem ou não”.

Na Europa, o único país que permite o voto aos 16 anos é a Áustria.

Jovens cada vez menos satisfeitos e participativos na política

Em 2007, cerca de um terço dos jovens entre os 15 e os 34 anos, considerava que a democracia funcionava bem. Esta percentagem desceu para cerca de metade desse valor em 2015. O dado consta do estudo “Emprego, Mobilidade, Política e Lazer: Situações e atitudes dos jovens portugueses numa perspetiva comparada”, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, apresentado em maio do ano passado.

O mesmo estudo mostra que, em 2007, a percentagem de jovens com idade entre os 15 e os 24 anos que pertencem a um partido político, baixou de uns já pouco significativos 5,2% para 1% em 2015. Acompanhando a tendência da população geral, os jovens viram diminuir também, em cerca de dois terços, a taxa de participação cívica em Portugal.

No que diz respeito à simpatia partidária, o trabalho concluiu que se verificou uma quebra de 21,3 pontos percentuais, entre 2007 e 2015, entre a população portuguesa que simpatizava com um partido. A faixa etária dos jovens (15-24) é aquela onde a quebra foi maior, fixando-se nos 25,3 pontos percentuais.

Uma das conclusões mais importantes deste capítulo é a diferença nas atitudes e nos comportamentos entre a faixa etária dos mais jovens (15-24 anos) e dos jovens adultos (25-34 anos). Os primeiros estão acima da média nacional no que diz respeito à satisfação com a democracia, mas também são aqueles que menos procuram notícias sobre política, pertencem em menor percentagem a partidos do que a média nacional, e participam pouco em associações cívicas, com exceção de grupos desportivos e associações juvenis e estudantis.

O inquérito à opinião pública sobre o qual se baseou este estudo do ICS foi realizado entre 6 e 17 de março de 2015. O universo incluiu indivíduos com 15 anos e mais, residentes em Portugal continental. A amostra foi desenhada por quotas e integra uma componente base de 1.254 entrevistas, as quais foram complementadas com um ‘boost’ de 358 entrevistas a inquiridos entre os 15 e os 34 anos. A amostra total foi, assim, constituída por 1.612 entrevistas.

O estudo é da autoria de Marina Costa Lobo, Vítor Sérgio Ferreira, Jussara Rowland.

 

Artigo editado por Filipa Silva