Há seis pontes que ligam a cidade do Porto a Vila Nova de Gaia. Cinco em funcionamento. No entanto, apenas uma proporciona, desde o dia 24 de junho, uma viagem tão intimista como a Ponte da Arrábida.

Ao início, a ideia de percorrer os 262 degraus da Ponte da Arrábida pode levantar algumas dúvidas, mas quem já arriscou a escalada ao arco da ponte rapidamente desfaz o receio. É um desafio para todas as idades.

Rafael Stoffel Dalri confirma. O turista brasileiro e a namorada, Ana Carolina Kayser, procuraram a entrada que dá acesso ao arco da Ponte da Arrábida durante um passeio de bicicleta pela marginal do rio Douro. No posto turístico informaram-nos que a subida ao arco teria de ser agendada, mas a curiosidade levou-os até lá.

“Estávamos passeando nos jardins do Palácio de Cristal e vimos o pessoal subindo lá de longe, na hora do pôr-do-sol e achámos interessante e pensámos que era uma subida livre, que poderíamos vir e subir por nossa conta”, conta ao JPN o professor brasileiro, de 31 anos.

“Podemos subir?”, pergunta Rafael ainda à porta do portão branco que dá acesso ao arco. Pedro Pardinhas, fundador da Porto Bridge Climb, acede ao pedido e explica a ideia da visita.

Mais de 250 pessoas em menos de uma semana

Rafael é um dos poucos turistas que passaram pela Ponte da Arrábida nos últimos dias. O passa-a-palavra e os órgãos de comunicação social nacionais têm sido as grandes ferramentas de divulgação da iniciativa e, por isso, a grande maioria das mais de 250 pessoas que já viveram a experiência são portuguesas.

Histórias, essas, já há muitas para contar. De acordo com Pedro Pardinhas, a idade média dos visitantes ronda os 35 anos de idade, mas nos (só) seis dias de atividade, já registaram entradas de jovens com 17 anos e de seniores com mais de 70 anos.

“Há uma diversidade muito grande e é bom vir cá gente mais velha para perceber que isto não é um bicho de sete cabeças”, menciona o impulsionador da experiência.

Normalmente vêm em pares ou em grupos e os motivos são diversos: ora pela adrenalina ou curiosidade que a escalada pode suscitar, ora pela ligação afetiva dos mais velhos que assistiram à construção da ponte, ora para recordar as memórias dos adultos que, em tempos, subiam a ponte clandestinamente.

A Ponte da Arrábida estabelece ligações que ultrapassam apenas a vertente viária: permite um encontro de gerações e viagens ao passado.

Várias experiências dentro de uma só

Para que a visita não fosse apenas a subida à ponte, a Porto Bridge Climb dispôs, nas paredes brancas do espaço de acesso, uma exposição sobre a construção da Ponte da Arrábida, as diversas pontes do Porto e as pontes mais conhecidas do mundo.

“A ideia inicial até era fazer um bocado de visita à exposição, mas a perceção que temos tido é que o que as pessoas querem é subir”, revela Pedro Pardinhas. Assim, as pessoas vão apreciando, cada uma ao seu ritmo, a informação fixada e a Porto Climb Bridge proporciona a experiência.

Uma experiência que tem várias componentes. Pedro destaca as três principais. A primeira é “andar num edifício onde nunca ninguém andou e provavelmente nunca mais vai estar num sítio com esta configuração”, a segunda é a vista “que nós temos fugazmente quando passamos na autoestrada e que aqui podemos aproveitar sem ter um camião a buzinar” e e outra é a “superação de receios” de alguns.

A viagem de Rafael começa. Ana Carolina decidiu ficar apenas a apreciar. O motivo é apenas querer dividir as experiências durante a estadia em Portugal. O arnês está colocado e os visitantes observam atentamente Pedro Pardinhas, que dá os últimos conselhos e relembra as questões de segurança.

“Vamos com calma e sem pressas”, sublinha o guia. A escalada tem duração de aproximadamente 25 minutos. Prendem-se as cordas à estrutura e está tudo a postos para subir. Pedro vai atrás. Os primeiros degraus são os mais altos. À medida que se vai subindo, os degraus vão ficando cada vez mais baixos até que dão lugar, no topo, a uma rampa.

A liberdade com o Douro aos pés

A subida foi fácil e sem sobressaltos. Lá em cima, a 65 metros de altura, o Douro aos pés. A “vista mais secreta do Porto”, como se pode ler no site da Porto Bridge Climb, é desvendada. Há espaço para conversas, fotografias e um mundo de sensações.

A mais mencionada é a liberdade. Para Pedro Pardinhas, o sentimento demonstrado pelos visitantes quando chegam ao topo, é o que lhe dá mais gozo. As expressões de contentamento são genuínas e são replicadas durante toda a estadia no topo do arco da Ponte da Arrábida.

O enorme volume de tráfego automóvel é praticamente inaudível debaixo do tabuleiro. Um casal comenta a tranquilidade e a ausência, quase total, de ruído e até coloca as mãos na estrutura para sentir a vibração.

Pedro Pardinhas conta algumas curiosidades sobre a cidade, sobre a ponte, sobre tudo e mais alguma coisa. Os visitantes vão dando sugestões. A vontade é transformar a experiência em algo maior. Uns sugerem a travessia até ao outro lado, outros algo mais radical.

A viagem ao notável arco de betão armado da Ponte da Arrábida é, sobretudo, muito intimista. As conversas tranquilas e descontraídas fazem parte do momento. A paisagem é arrebatadora.

Após uns largos minutos no topo, o guia prepara a descida. Aproveita-se para tirar as últimas fotografias e atentar aos mais ínfimos pormenores. No centro da ponte, entre uma estrutura enorme cruzada, vislumbram-se os barcos que atravessam no rio.

A descida é mais arriscada e é o momento que pode criar alguns receios. O corrimão é a muleta de auxílio de alguns. Já cá em baixo, o arnês é retirado e fala-se sobre a experiência.

“É bem seguro. É tranquilo para subir as escadas, não é nenhum esforço exagerado, qualquer um pode subir até pessoas mais velhas e é legal porque tem a vista dos dois lados. Na outra ponte [D. Luís I] nós acabámos por enxergar mais a parte do Porto, da Ribeira, mas não se consegue ver até o mar e aqui dá para ver até o mar”, descreve Rafael, que se confessa emocionado com a altura e com a vista.

Devolver um monumento à cidade

A ideia da Porto Climb Bridge acabou por devolver um monumento à cidade. “É lógico que se eu fosse milionário ou punha isto de borla ou fazia isto mais barato. Isto é um negócio portanto eu quero que as pessoas venham cá e que me paguem, mas também é porreiro haver esta ligação afetiva e estarmos também a devolver um espaço que estava degradado – a parte de fora – e esta parte esquecida”, esclarece Pedro.

A recompensa, além de monetária, é o reconhecimento. Ao fim de cada escalada, a equipa é congratulada e os visitantes agradecem a experiência. Isabel Jorge levou a família toda a subir o arco da Ponte da Arrábida.

“A vista é deslumbrante e sendo um monumento emblemático do Porto achei que era visitável. Não foi nada difícil. O meu pai tem 76 anos e fez isto com um perna às costas, acho que toda a gente faz isto bem”, partilha a médica dentista.

Custódio Domingues, pai de Isabel, sublinha que adorou a experiência. Só lamenta um facto: ainda não ser possível atravessar a ponte de um lado ao outro.

Pouco a pouco, a experiência é espalhada pela cidade e os curiosos vão aparecendo. A escalada ao arco da Ponte da Arrábida, replicada de meia em meia hora, está disponível das 11h00 às 19h30.

As reservas podem ser feitas através do site da Porto Climb Bridge, mas não são obrigatórias. Pode-se apenas aparecer. Para já o preço do bilhete está fixado nos nove euros, até à inauguração oficial, a 9 de julho.

Pedro Pardinhas revela que a experiência vai começar a ser realizada também à noite, em dias específicos. O preço poderá ser diferenciado entre a semana e o fim de semana.

“Em todos os rios há um sítio que foi feito para ter uma ponte; é preciso encontrá-lo”, pode ler-se num dos cartazes da exposição. A Ponte da Arrábida, projeto de Edgar Cardoso finalizado em 1963, constituiu durante dois anos a ponte com arco de betão armado maior do mundo, com 270 metros.