Eram 18 horas e 50 minutos do dia 9 de novembro quando a bandeira da ESN aparece nas costas daquele que se revelou ser o responsável pela atividade dessa noite e também coordenador do Departamento de Projetos da ESN Porto, Rui Barbosa.
“Help the Homeless” era o lema e a motivação de todos os estudantes Erasmus que se reuniram ao lado da Sé do Porto e daí seguiram até à Rua de Cimo de Vila, onde se localiza o primeiro restaurante solidário do Porto, da responsabilidade do Centro de Apoio ao Sem-Abrigo (CASA).
Rui Barbosa explicaa que esta atividade tem sido realizada todos os anos em parceria com o CASA. “Quando as duas partes gostam do trabalho que se faz não há porque alterar”, considerou. “O processo de seleção dos estudantes também se tem mantido: existe uma pré-inscrição no nosso site e uma vez que o próprio CASA estabelece um limite de participantes, à volta dos sete elementos, nem todos conseguem ser os escolhidos”, completa Rui Barbosa.
A parceria do CASA com os estudantes de Erasmus já existe há cerca de quatro anos e, segundo Ana Salão, coordenadora CASA das quartas-feiras, “a culpada é a Mariana”. Voluntária há quatro anos, “foi ela que muito naturalmente trouxe os estudantes da ESN” para ajudarem às quartas-feiras”. Refere-se a Mariana Pinho de Sousa, antiga coordenadora do Departamento de Projetos da ESN Porto, e que também se encontrava no local.
O grupo
São sete no total. Duas brasileiras, duas espanholas, uma paquistanesa, um turco e um polaco. Chegam todos de sorrisos no rosto, mas nenhum sabe o que vai encontrar.
A Emily foi a primeira a chegar ao ponto de encontro. Tem 22 anos e vem do Paraná, Brasil. Está a estudar no Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP) e “já fazia voluntariado no Brasil através da Universidade, mas noutras áreas que não esta”. Inscreveu-se precisamente para experimentar outro tipo de voluntariado e diz que o que mais a motivou foi a possibilidade de “proporcionar bons momentos para as pessoas que nada ou quase nada têm”.
Também do Brasil, mas do Rio de Janeiro, aparece no grupo a Débora, tem 21 anos e está a estudar na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP). “Já fazia voluntariado mas mais voltado para as crianças, em hospitais e orfanatos, nunca com os sem-abrigo. Vi que tinha essa oportunidade e inscrevi-me”, conta a estudante.
Sem qualquer experiência em voluntariado descobrimos a Natália. No meio da sua timidez inicial desvendou que vem de Espanha e está a estudar História na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP). Tem 20 anos e escolheu começar agora a fazer voluntariado porque acha que “o ano de Erasmus é um ano que tem de ser diferentes dos outros, é o tempo de fazer todas as mudanças, melhorar a todos os níveis e por isso fazer voluntariado é uma boa forma de começar”.
A experiência
As expectativas eram altas e a vontade de ajudar aumentou à medida que eram apresentados ao grupo de voluntários do CASA e a coordenadora lhes deu a conhecer todos os procedimentos.
A distribuição dos estudantes de Erasmus tem de ser pensada. Ana Salão explica ao grupo: “Para os estudantes que não falem fluentemente a nossa língua, atribuímos funções que não requerem tanto contacto com os nossos utentes, como a cozinha, o servir comida ou preparar os tabuleiros. Os estudantes que falem português colocamos nas mesas com contacto com os utentes, mas sempre com a ajuda de voluntários mais experientes”.
Após a explicação começou a divisão de tarefas, distribuíram-se primeiro os estudantes de Erasmus e alocou-se a estes voluntários mais assíduos que lhes explicaram melhor todos os procedimentos específicos.
As portas abriram às 20h00 e desde a abertura até ao último utente o ambiente foi frenético.
No final o sentimento de dever cumprido predominou. “Já está! Parabéns a todos e obrigada. Isto não é só para o bem dos outros, também nos faz bem a nós próprios”, diz Ana já mais relaxada. “Agora vamos todos para ali tirar a foto da semana”. É um procedimento comum neste grupo, todas as semanas no final da noite os voluntários disfarçam o cansaço e colocam os melhores sorrisos que congelam num boomerang animado.
Quem vai, fica?
De acordo com o que o JPN conseguiu apurar, todos os sete estudantes se mostraram motivados para continuar a auxiliar o CASA neste restaurante através do voluntariado continuado.
Rui Barbosa explica que existe na ESN “um programa de voluntariado continuado para os estudantes de Erasmus que, tal como o nome indica, é suposto ser contínuo durante o período” de permanência dos estudantes. “Os interessados só têm de preencher os formulários que estão no nosso site nos projetos com quem temos parceria, que são para o CASA, MIDAS e/ou JRS”, diz. Acrescenta ainda que com estas experiências os estudantes “saem daqui mais felizes”. “Se assim não fosse, eles não queriam continuar ligados a isto, portanto, acho que é positivo e só tenho pena de não dar para mais”, concluiu.
As atividades do SocialErasmus deste outono incluíram, além da ajuda concedida no refeitório gerido pela CASA, a visita a uma escola, a um lar da terceira idade e a um canil. Houve ainda lugar a um debate sobre a atual crise de refugiados e uma atividade de limpeza no Rio Douro.
“Sinto-me muito cansada, mas valeu”
Apesar de a tarefa com que ficou não a ter deixado contactar diretamente com os utentes, Natália gostou muito da experiência e não estava à espera de ajudar tanta gente: “Ajudámos imensas pessoas e isso é muito bom, sinto-me muito cansada, mas valeu pela ótima experiência”.
Já as duas estudantes brasileiras, por não terem o impedimento da língua, conseguiram ter um contacto mais direto com os utentes ficando cada uma, juntamente com outro voluntário, responsável por todo o serviço da mesa.
Para Débora, o que mais a marcou foi uma história que presenciou entre os utentes. Conta-nos: “Era uma mesa de seis pessoas e havia um rapaz que dizia que não ia conseguir vir amanhã. Guardou a comida na mochila e pediu outro prato para comer hoje, mas não lhe deram. Então as outras pessoas da mesa partilharam com ele o que tinham nos pratos. Foi muito bonito mesmo”. Para além desta história, exibe dois desenhos que um utente lhe ofereceu como forma de agradecimento e reforça com um sorriso a felicidade que a preenche.
Já para Emily a “alta rotatividade” foi um impedimento para conversar com os utentes, contudo o que mais reteve foi a “união dos voluntários em contornar todas as dificuldades”.
As expectativas foram superadas e os sorrisos transparecem realização pessoal. Por fim, despedem-se e em vez de adeus ouve-se: “Até quarta”.
Artigo editado por Filipa Silva