Catarina Martins esteve no Porto para falar sobre o Orçamento do Estado para o proximo ano. À margem da sessão, que decorreu a 11 de novembro no Teatro Helena Sá e Costa, o JPN questionou a bloquista sobre os grandes objetivos do partido em matéria orçamental. No caso específico do Ensino Superior, a líder do Bloco de Esquerde entende que o Governo tem de fazer mais para combater três problemas: propinas altas, envelhecimento do corpo docente e precariedade na investigação. O documento está ainda em debate no parlamento. A votação final gobal está marcada para 29 de novembro.
JPN: Na negociação com o governo, foram feitas diversas propostas pelo BE. Qual era o vosso principal objetivo?
Catarina Martins: O nosso objetivo principal é continuar a recuperação dos rendimentos do trabalho, portanto, assegurar que quem recebe o seu salário vê-o aumentar. Ou por via fiscal, porque os salários do setor privado não é o Estado quem os decide, não é? O nosso principal enfoque é recuperar salários e pensões, recuperar emprego e combater a precariedade, para que a recuperação de salários chegue a toda a gente. Depois, também recuperar o nível de prestações sociais, para quem precisa de apoio se não têm emprego ou por causa de uma situação particular, para que possam receber um pouco mais.
Que aspetos positivos vê o Bloco de Esquerda no novo Orçamento?
O fim da sobretaxa do IRS, o pagamento por inteiro dos salários da Função Pública, com o fim integral dos cortes, o aumento do abono de família, dos apoios à deficiência e a divulgação da componente solidária para idosos e o aumento extraordinário das pensões.
E apresenta alguma crítica às medidas que serão impostas em 2017?
Nós vamos gastar em juros da dívida 8 mil milhões de euros e em toda a escola pública apenas 6 mil milhões de euros. Se nós não pagássemos juros este ano, podíamos aumentar em 50% o orçamento da Saúde, mais o orçamento da Educação, mais o orçamento da Cultura. O que isso não faria pelo nosso futuro? Portugal continuar sem renegociar a dívida significa que nunca mais temos os meios necessários para investir no nosso país e para conseguirmos o emprego, a qualidade que estamos a precisar.
Considera que não está a ser feito o devido investimento nos setores na Saúde, Educação e Cultura?
Sim, qualquer pessoa que vai a uma escola sabe quanto falta, qualquer pessoa que vai a um hospital sabe que faltam muitas coisas e há muito tempo que não há investimento, quer dizer que o problema só vai aumentar. Os equipamentos envelhecem e não são substituídos e, portanto, para nós a urgência é essa. Porquê? Porque sem escola para todos e de qualidade, o país não tem desenvolvimento. Todos nós precisamos de aceder à Saúde com qualidade. Sem a Cultura não há qualificações, não há capacidade de inovação, não há capacidade para ter um outro futuro e, portanto, para nós investir nesses setores fundamentais não é só [investir] para quem precisa deles agora, mas também para termos uma ideia de desenvolvimento de futuro para o nosso país.
A Comissão Europeia referiu que o OE aponta apenas para uma ligeira melhoria do saldo estrutural face a 2016. Considera que isto é suficiente para atingir os resultados esperados?
Sem a reestruturação da dívida pública, o nosso país não tem meios para o crescimento económico de que precisa. E a União Europeia continua a dar conselhos idiotas ao nosso país, porque até agora mandou sempre cortar no que era preciso: cortar na saúde, na educação, nos salários, nas pensões e com isso o nosso problema da dívida só cresceu cada vez mais. E, portanto, a União Europeia não tem um mínimo de credibilidade. Precisamos de ouvir menos a União Europeia e mais quem vive neste país.
E acha que o governo português vai ouvir mais ou menos a União Europeia?
Acho que não está a ser fácil, mas há uma ligeira alteração, só que não chega, precisamos de mais.
Em relação ao Ensino Superior, o reforço anunciado pelo Governo é suficiente para incentivar um setor tão castigado nos últimos anos?
Na nossa opinião, não, não chega. Eu sei que há, em algumas áreas, algumas alterações. Mas nós temos um enorme problema chamado propinas e as propinas excluem pessoas que querem estudar, porque não têm possibilidades económicas para as pagarem. E temos um outro problema chamado envelhecimento do corpo docente, ou seja, o facto de não se contratarem pessoas novas significa que temos universidades cada vez mais envelhecidas e não temos um cruzamento de conhecimentos, de experiência, de vontade de várias gerações. Só assim é que a ciência pode evoluir e pode se desenvolver. E, finalmente, o problema da enorme precariedade, nomeadamente, dos investigadores, bolseiros, etc., que têm uma pequeníssima alteração na resposta que lhes é dada. Mas, de facto, continuam a não ter os contratos de trabalho de que precisam e está uma imensa precariedade e nós precisamos de investigadores que estão concentrados na sua investigação e não com medo de não terem como viver no dia seguinte.
Como pensa o BE resolver os problemas que referiu?
Nós gostaríamos de congelar as propinas. Essa é a proposta que nós temos na especialidade do Orçamento. Fizemos algumas propostas sobre a autonomia das instituições do Ensino Superior para lhes permitirem tomar decisões com mais capacidade e temos algumas medidas para permitir alguma contratação e, nomeadamente, vinculação de precários e de precárias, mas são muito tímidas e demoram o seu tempo. Em todo o caso é um caminho que estamos a investir muito.
Artigo editado por Filipa Silva