Tudo acontece ao Porto de Nuno Espírito Santo. Conferências de imprensa transformadas em aulas. Uma galinha preta a passear no relvado. Penálti desperdiçado. Meia-dúzia de oportunidades flagrantes não concretizadas já com o adversário reduzido a dez. E mais de quinhentos minutos sem molhar a sopa. O filme parecia querer repetir-se. Bastou um júnior saltar do banco para silenciar tudo isto. O FC Porto venceu o Braga na noite de sábado por 1-0 e mantém-se na luta pelo campeonato.

Quebrar o enguiço? Nem de penálti

O Braga chegava ao Dragão com um ponto à maior. Tinha quatro ausências forçadas (Ricardo Ferreira, Velázquez, Mauro e Pedro Santos) e mexeu nos três setores: Artur Jorge entrou para o eixo defensivo, Vukčević esteve no meio-campo e Stojiljković acompanhou Hassan no ataque. Do lado portista, Nuno Espírito Santo trocou apenas Alex Telles por Layún. Rui Pedro, que se estreara pelos seniores a meio da semana, entrou na ficha de jogo, ao contrário de Depoitre.

O FC Porto manteve o desenho e a superioridade nas oportunidades criadas. E também a falta de eficácia, qual predicado dos últimos jogos. Diogo Jota inaugurou o festival de falhanços na primeira parte. Óliver demorou a entrar no jogo, mas ainda deixou fogachos do que melhor sabe fazer: aos 35’ rasgou a defesa arsenalista e descobriu André Silva com espaço. Artur Jorge desinteressou-se da bola, fez penálti e acabou expulso.

O Braga ficou em inferioridade numérica quase uma hora, mas teve em Carlos Marafona uma fonte extra de inspiração. O guarda-redes voou para a esquerda e negou o pontapé rasteiro do camisola dez. E vão dois castigos máximos esbanjados para André Silva. É o jogador que mais penáltis falhou até ao momento no campeonato. Já diz a sabedoria popular: quando as coisas estão mal, estão mesmo mal. É a lei de Murphy, em estado puro.

Os portistas aproximaram-se ainda mais da área adversária. José Peseiro baixou Vukcevic para central, até Rosić ter os motores aquecidos. Ótavio saiu com queixas – lesão na parede abdominal, de acordo com a informação divulgada pelo clube – e uma exibição pobre na criatividade. No fecho da primeira parte, Marafona, a meias com o poste, evitou uma cabeçada certeira de Felipe.

Para grandes males, grandes remédios

É complicado descrever o ataque bracarense no Dragão. Poucos argumentos para discutir a batalha. Iniciativas de contra-ataque tremidas. Perigo nulo. Casillas teve, de facto, uma noite demasiado tranquila.

O jogo só foi realmente equilibrado nos primeiros vinte minutos. A partir daí teve um único sentido. O Porto tomou as rédeas. E na etapa complementar triplicou-as. André Silva (58’), Brahimi (65’ e 79’) e Maxi (75’) tentaram colocar a bola dentro da baliza. Mas ficaram-se pelas tentativas. À falta de acerto juntava-se a intranquilidade, dentro e fora do campo. E um ímpeto intermitente. Motivo? As constantes interrupções provocadas por Marafona, que ameaçava tornar-se no homem do jogo. O verbo “ameaçar” foi escolhido com cuidado. É que o destino resolveu terminar a história com drama, em honra a Hitchcock.

O ator chama-se Rui Pedro. Tem dezoito anos e apareceu pela primeira vez em cena para a liga. Jogou apenas quinze minutos. Tempo suficiente para ser atrevido, aproveitar o trabalho de Jota e picar a bola sobre Marafona. Ao cair do pano. Nos últimos suspiros. Como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Rui Pedro tirou a camisola. Os suplentes invadiram o relvado. Os adeptos portistas explodiram. Nuno saltou com Maxi. E Luís Gonçalves, diretor-geral para o futebol, verteu lágrimas. Todos confundiram raiva com alívio, mais de sete horas e meia sem festejar qualquer golo. A solução para os problemas estava, afinal, em casa.

O FC Porto parecia condenado ao quinto jogo consecutivo sem marcar. Ganhou, um mês exato depois da última vitória, frente ao Club Brugge. Teve um herói improvável, recuperou o terceiro lugar e ainda reduziu diferenças para o líder Benfica, que perdeu com o marítimo na sexta-feira.
Também não sofre golos há cinco jogos consecutivos, o melhor registo nos últimos vinte e um meses. Ótimos tónicos para preparar a receção ao Leicester e a visita à Feira, logo em semana de dérbi lisboeta. Não ficou tudo bem. Mas também não está tudo mal.

“Não nos vamos render”

Nuno Espírito Santo mostrou-se “feliz essencialmente pelos jogadores e principalmente pelo Dragão”. Em declarações à SportTV, o treinador referiu que os jogadores “precisavam deste momento para se libertarem e acreditarem no que é feito”. Acrescentou que “ainda falta muito campeonato” e quarta-feira já se disputa outra competição. “Vamos com a mesma ideia: ganhar e ser dominadores. Não nos vamos render. É assim que a equipa cresce”, sustenta.

Convidado a comentar as emoções vividas nos últimos minutos, Nuno garante: “Traduz o que o Dragão sentiu, depois de 30 remates, tantas ocasiões que não conseguimos. É o momento de alívio, de alegria. Precisávamos todos desta vitória: o clube, os jogadores e essencialmente os sócios do Dragão, que estiveram aqui do primeiro ao último minuto a apoiar a equipa”.

“Foi por dois minutos e meio”

José Peseiro considera que o jogo teve duas caras. “De onze para onze, jogámos o jogo pelo jogo no Dragão. Depois há um jogo em que, com dez, tivemos que ser guerreiros, tivemos que nos sacrificar, sem conseguir ter bola como gostaríamos”, argumenta.

A expulsão de Artur Jorge condicionou a estratégia bracarense. O treinador do Braga aceita a decisão, embora não tenha ficado totalmente convencido. Contudo, a missão passou sempre por “agredir, poder provocar alguma coisa e depois defender bem, porque o Porto estava a dar muita largura e profundidade no jogo, no último terço, a colocar muita gente no processo ofensivo”.

Peseiro elogia “um trabalho tremendo” da equipa, que encalhou a dois minutos e meio do fim.

Ficha de jogo
Competição: Liga NOS (12ª jornada)
Estádio: Dragão, Porto
Golos: Rui Pedro (90+5’)
Cartões Amarelos: André Silva (16’), André Pinto (36’) e Carlos Marafona (60’)
Cartões Vermelhos: Artur Jorge (35’)

Equipa de Arbitragem
Árbitro: Carlos Xistra (AF Castelo Branco)
Árbitros Assistentes: José Braga e Jorge Cruz
Quarto Árbitro: Pedro Campos

FC Porto
Onze inicial: Iker Casillas; Maxi Pereira, Felipe Monteiro, Iván Marcano (C) e Miguel Layún; Danilo Pereira, Jesús Corona, Óliver Torres e Otávio Monteiro; André Silva e Diogo Jota
Suplentes utilizados: Yacine Brahimi, Héctor Herrera e Rui Pedro
Treinador: Nuno Espírito Santo

SC Braga
Onze inicial: Carlos Marafona; Baiano, André Pinto (C), Artur Jorge e Marcelo Goiano; Wilson Eduardo, Xeka, Nikola Vukčević e Ricardo Horta; Ahmed Hassan e Nikola Stojiljković
Suplentes utilizados: Lazar Rosić, Djavan e Rui Fonte
Treinador: José Peseiro