No meio da azáfama que é um evento como a Comic Con Portugal, com o “cosplay” e as atividades que atraem multidões, há um espaço na Exponor que permite aos artistas de banda desenhada mostrar aquilo que fazem melhor.

Em várias bancas montadas ao longo de um corredor, estão expostos trabalhos para vários gostos, mas com um denominador: fazem parte do universo que joga a arte de misturar imagens com palavras.

Uma história nascida no Porto

Assina as suas tiras como “Raquel sem interesse”, mas o JPN quis saber mais sobre a autora. Licenciada pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, foi já no mestrado, tirado no Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, que o seu alter ego nasceu. “A Quica surgiu num projeto de mestrado, que eu tirei há coisa de um ano, em Ilustração e Animação”, conta ao JPN.

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Raquel Sem Interesse Foto: Miguel Ângelo

A cidade do Porto tem grande influência nos cartoons da Quica e nas suas “Histórias sem interesse”: “[Ela] vive a vida na cidade, anda de transportes públicos, tem encontros com as pessoas todos os dias”.

Feiras e eventos como a Comic Con são oportunidades únicas para divulgar o trabalho. Isso e as redes sociais, como o facebook. O reconhecimento não é de larga escala, mas consegue colocar as pessoas na pele da sua personagem: “Há pessoas que se identificam com as histórias que eu faço, que gostam e que lêm uma história e começam-se a rir. Já ganho o dia com isso”.

A banda desenhada também é didática

Os livros de banda desenhada são pouco associados a assuntos sérios, mas o conteúdo de uma BD está loge de ser cingir ao universo infantil. Que o diga Julius Ckvalheiyro. O artista brasileiro já lançou dois livros, um sobre a Primeira Guerra Mundial e o outro sobre a Segunda.

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Julius Ckvalheiyro Foto: Miguel Ângelo

“Eu procuro misturar História em quadrinhos com contextualização histórica. Tenho dois álbuns sobre a Primeira e sobre a Segunda Guerra Mundial. Procurei fugir dos clichés a que a gente está acostumada, dos heróis e dos vilões da guerra, uma nação que é salvadora e uma nação que é vilã, e procurei focar no lado do ser humano que está inserido dentro do cenário da guerra”, conta Julius.

Seguindo uma história sempre contextualizada e metodologia científica, os livros de Julius são mostrados às crianças para aprenderem História de forma diferente. “No Brasil, têm sido usados como didáticos, para as crianças, para as escolas. Através da história em quadrinhos, cativa a criança para um tema pesado”, diz Julius, que vê este facto como um “reconhecimento dum trabalho de dez anos”.

“Não há desenhos que não contem uma história”

Parte essencial na criação de uma banda desenhada é o ilustrador. Ricardo Venâncio, que começou a desenhar aos 14 anos, já fez vários trabalhos na área do desenho, mas prefere a banda desenhada, pois é “das poucas formas de arte em que uma pessoa pode fazer praticamente tudo”.

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Ricardo Venâncio Foto: Miguel Ângelo

Ricardo dá aulas de desenho. Aos alunos, ensina que “não há desenhos que não contem uma história”, e define como marcas próprias a “história e personagem, e contar coisas que mais ninguém tenha contado”.

Inspirada pelos seus gostos pessoais e algumas referências do meio, como Craig Thompson, a designer gráfica e ilustradora Raquel Costa cria pequenos quadrados com imagens, algumas delas com citações de personagens que admira. “Quando incluo uma citação, eu tento que capte o espírito da personagem tal como eu a vejo” diz.

Raquel demora entre “5 a 16 horas” com um desenho, usando materiais como guaches e aguarelas, mas já introduziu os seus trabalhos ao meio digital.

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Raquel Costa Foto: Miguel Ângelo

Na opinião de Raquel Costa, eventos como a Comic Con contribuem para a popularização da banda desenhada. Mencionou o Nobel da Literatura de Bob Dylan, para depois dizer que “muito provavelmente a BD terá as portas abertas para ser encarada também como uma forma de literatura”.

Um percurso diferente

Não teve o típico percurso de alguém que gosta de desenho, mas isso nunca diminuiu a paixão de Pedro Mendes. “Na verdade, eu sempre desenhei. No entanto, o meu percurso profissional foi bastante variado. Eu fui fuzileiro, até há bem pouco tempo, mas sempre mantive o gosto pelo desenho, sempre me acompanhou, e era algo que gostava de seguir profissionalmente. Neste momento, já tenho um pé mais na área”, conta o ilustrador.

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Pedro Mendes Foto: Miguel Ângelo

Pedro colabora com o escritor André Mateus na banda desenhada “Hotel Hell”, que classifica como um “desafio diferente”, já que lida com imagens que não são comuns no nosso dia a dia.

E qual é o papel de um ilustrador na relação com o escritor? “Eu recebo o guião e, dependendo de argumentista para argumentista, uns mais específicos, outros menos, mas é-me dada a ideia que eles têm por escrito para eu traduzir em imagens a visão deles. Certas coisas são deixadas ao meu critério, mas algumas são verdadeiramente específicas, como é o caso de um modelo de um carro, um estilo de roupa, coisas desse género”, responde.

Neste primeiro dia, foram também anunciados os vencedores dos “Galardões da BD 2016”, prémios anuais atribuídos pela organização da Comic Con Portugal, com o objetivo de promover jovens talentos nacionais na área.

“Os Vampiros”, de Filipe Melo e Juan Cavia, arrecadaram o Galardão Anual BD e o prémio Excelência na Escrita. Osvaldo Medina, com “Kong The King”, venceu em Excelência na Ilustração; Mosi, com “Altamente #1” venceu nas Curtas de BD e Altarriba e Keko arrecadaram foram distinguidos na categoria Edição de Autores Estrangeiros, com “Eu, Assassino“.

Artigo editado por Filipa Silva