O desfecho definitivo do cinema Batalha foi equacionado e ponderado durante vários anos, quer pela empresa proprietária do edifício, quer pela autarquia do Porto — que mostrava intenção de participar no destino do monumento classificado em 2012. Esta quinta-feira, Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, confirmou ao Público ter chegado a acordo com os proprietários. O Batalha será alugado à autarquia durante 25 anos. A reabilitação é o próximo passo na construção de uma casa de cinema no Porto.

O Batalha assistiu a várias vidas: já foi o Novo Cinema High-Life, recebeu dezenas de eventos e teve até na posse da Associação Comércio Vivo. Poucas foram as vezes em que os projetos eram bem-sucedidos. O gabinete de comércio interrompeu a gestão no cinema em 2009. Os últimos tempos do edifício eram palco de espetáculos pontuais: o mais recente terá sido a passagem de ano, designada “Bye New Batalha!”.

O resto dos dias era a casa de alguns sem-abrigos – os papéis de cartão e os cobertores eram imagens recorrentes na escadaria do Batalha. Esta sexta-feira, Rui Moreira acompanhado pelo grupo de arquitetos, liderado por Alexandre Alves Costa, visitou a futura casa de cinema da cidade e apresentou as novidades.

O autarca referiu que a hipótese de a câmara municipal adquirir o cinema Batalha em definitivo foi colocada em cima da mesa. Porém, as negociações mostraram que o aluguer de longa duração seria mais benéfico para as partes envolvidas. A autarquia terá de pagar cerca dez mil euros mensais à empresa proprietária do Batalha, a sociedade Neves & Pascaud. “Havia uma sensação de perda relativamente ao cinema Batalha. A situação não podia continuar assim. Esta foi a solução encontrada”, acrescentou Rui Moreira.

Tanto o arquiteto Alexandre Alves Costa como o presidente da câmara garantem que a reabilitação do edifício dificilmente estará terminada antes de 2018. “É um trabalho que demorará algum tempo”, justificaram. A decisão terá ainda de ser aprovada na reunião de câmara da próxima terça-feira. Ainda assim, Rui Moreira antecipou que o erário público será suficiente para suportar o custo das obras e do restante investimento no edifício. “Fizemos um contrato de arrendamento perfeitamente razoável”.

“Íamos ao Batalha como quem vai à missa”

Neste momento, Alexandre Alves não “consegue ter ideia nenhuma” para o cinema Batalha, uma vez que foi apenas contactado pelo presidente da autarquia, esta quinta-feira. No entanto, já há decisões firmes quanto a algumas ações de reabilitação. “A linguagem arquitetónica é extremamente inovadora. É indispensável que o Batalha encontre de novo a modernidade. Foi modernidade durante o fascismo, tem de continuar a ser modernidade no século XXI”, esclareceu.

O arquiteto e professor catedrático da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP) relembrou os tempos em que a polícia política durante o Estado Novo, retirou e ocultou algumas das obras presentes no cinema Batalha. O fresco do pintor e artista plástico, Júlio Pomar, o baixo-relevo de Américo Soares Braga e até as iniciais de cinema Batalha (CB) foram alvo da PIDE, um dia antes da inauguração do edifício. “Para eles, CB significava Comité Bolchevista”, referiu Alexandre Alves Costa.

Do lado de fora, Virgílio Freitas, comerciante na Praça da Batalha, não tira os olhos da entrada do cinema. Há 38 anos como patrão de uma loja vizinha, assistiu aos melhores e piores anos do Batalha. “Se o cinema voltar a funcionar, será muito bom para todos à volta”. Para o comerciante, o desfecho incerto do edifício provocava uma “má imagem da zona”, há vários anos.

O arquiteto, acompanhado do colega de profissão Sérgio Fernandez, confessou que as idas ao Batalha na infância gozavam de um ritual semelhante ao de “ir à missa”. Acontecia todos os domingos, inclusive. Para Sérgio Fernandez, um desses amigos, o Batalha foi o local de formação no cinema e na vida. “Foi nesta sala que nos tornamos homens”, afirmou. “No final, será o projeto da nossa vida”, contrapôs o outro.

Para já, Alexandre Alves Costa não avança com ideias para a programação ou datas. No entanto, reconhece que o espaço e o programa têm de encontrar o equilíbrio.

Ao JPN, o arquiteto reconheceu “não estar à espera” de que o futuro do Batalha estivesse nas suas mãos. “Sempre tive esperança que voltasse com cinema, mas não tendo-me como arquiteto”. A casa de cinema do Porto terá uma parceria com a Cinemateca Portuguesa.