Os Deolinda presentearam os portuenses com uma atuação ritmada e intensa. Numa viagem pelos quatro álbuns já lançados, a banda apresentou as suas mais diversas facetas. Passando por músicas mais calmas como “Não sei falar de amor” e transitando para melodias frenéticas como “A velha e o DJ”, não faltaram os grandes sucessos, como “Fado Toninho” e “Fon Fon Fon”.

Numa noite chuvosa e pouco convidativa, o público rapidamente fez sentir a sua presença nas portas do coliseu. Entre pessoas de diversas gerações, foi apenas uma questão de tempo até que os lugares destinados a cada um começassem a ser preenchidos. Ao fim de 10 minutos, as cadeiras desocupadas eram praticamente inexistentes.

Com a sala composta, restou aguardar pelo começo do espetáculo. O relógio marcava as 21h45 quando era anunciado o nome da banda. O público, já a vibrar por saber que o início estava próximo, aplaudiu efusivamente a banda à medida que os elementos foram entrando. E se os aplausos já abafavam qualquer outra manifestação sonora, as primeiras palavras de Ana Bacalhau – “Olá Porto!” – fizeram o recinto tremer, tão grande que era o rejúbilo dos portuenses.

A banda celebra dez anos com uma digressão pelos coliseus. Foto: Maria Campos

Foram os tons mais calmos que abriram o concerto. À boleia de “Não sei falar de amor” e de “Fado castigo”, a vocalista – que se apresentou com um vestido vermelho – apostou logo de seguida numa melodia mais ritmada, com “O fado não é mau”. Os espetadores, sempre atentos, acompanharam com palmas.

Bem ao seu género, Ana Bacalhau não deixou de interagir com o público em diversos momentos. “Sei que os senhores muito provavelmente preferiam estar noutro sítio”, numa clara alusão ao clássico Porto-Sporting, que decorria simultaneamente. O público soltou gargalhadas e Ana manteve o espírito: “Mas pelo que sei até vos está a correr bem, não é?”. Ainda tendo como “alvo” o público masculino, a cantora aproveitou para mostrar o seu lado mais brincalhão – “Perdoa-se aos senhores a consulta do telemóvel”, disse.

Uma viagem pela carreira dos Deolinda

Estava na altura de apresentar algumas músicas do segundo álbum, denominado “Dois Selos e Um Carimbo”. É apresentado neste disco o traço característico do típico português, pelo que a referência a Pedro da Silva Martins – compositor da banda – não podia ficar de fora. A vocalista falou um pouco sobre o percurso da banda e mencionou algumas datas importantes, como 2006 (o ano de estreia). A canção “Não tenho mais razões” arrancou bastantes aplausos do público e Ana Bacalhau, dançando ao som da melodia, contagiou os presentes que começaram a acompanhar o ritmo.

Pedro Silva Martins foi mencionado por Ana Bacalhau pela importância que teve em vários álbuns. Foto: Maria Campos

Nesta viagem pelos álbuns da banda, era altura de pedir boleia a “Mundo Pequenino”. “Semáforo da João XXI” trouxe, de seguida, a faceta mais espontânea da vocalista. É com “Doidos” que Ana Bacalhau declara “não sei porquê, mas esta música é sempre a que tem menos palmas, vamos ver se vocês contrariam a tendência”. O baterista Sérgio Nascimento mereceu um destaque por parte da cantora, dado que foi uma presença constante na elaboração deste álbum.

Se o público, com os seus aplausos, não fosse suficiente para mostrar à banda que a atuação não poderia estar a ser melhor, as músicas do disco – “Outras Histórias” – só iriam confirmar essa tendência. “Corzinha de verão” arrancou uma das maiores ovações da noite e o plano orquestrado por Ana Bacalhau, com a música “Berbicacho”, não podia ter corrido melhor. A ideia de dividir a plateia em dois, com uma das partes a cantar o refrão e a outra a responder com onomatopeias revelou uma sincronia surpreendente. “Que afinadinhos, foi incrível!”, declarou a vocalista.

Findada a passagem pelos quatro álbuns, era altura de rever algumas músicas que marcaram o percurso da banda. Ana Bacalhau tinha prometido no início do concerto que o iria fazer, e assim fez. Quando chegou a vez de “Avó da Maria” foi com timidez que o público reagiu às perguntas da cantora, que queria saber se estavam na sala “mães de Marias e avós de Marias”. No entanto, “A velha e o DJ” mostrou um lado completamente distinto a que a banda nos habituou, com uma música eletrónica e acelerada. O público respondeu, mexendo com veemência as lanternas que tinham sido disponibilizadas no início.

Os clássicos não desiludiram o público

Depois do efeito luminoso, estava na altura de ouvir mais um “gigante”. Desta feita, “Seja agora” mereceu mais manifestações de contentamento. Noutra intervenção, Ana Bacalhau pediu a ajuda do público para cantar a melodia. Quando foi notório que o público feminino dominou o primeiro “ensaio”, a vocalista reiterou a expressão já referida anteriormente – a “surdez seletiva” dos homens, o que fez arrancar gargalhadas do lado masculino. A segunda tentativa provou que as palavras da cantora tiveram efeito e, assim, assistiu-se à coordenação entre sexos.

“Movimento perpétuo associativo” não podia faltar e foi a música com que a banda se despediu do público. Aquela que é já tida, por muitos, como uma música de intervenção para os mais jovens. Num movimento praticamente em uníssono, os espetadores levantaram-se e aplaudiram o grupo musical.

Ouviu-se “só mais uma” por parte de algumas pessoas, expressão que se foi alastrando a toda a sala. Os Deolinda responderam com um regresso para dois “encores”. Ana Bacalhau tinha pedido que o coliseu “abanasse”, e, quando se percebeu que a música escolhida era “Fon Fon Fon”, a receção do público não podia ter sido mais positiva.

A vocalista fez questão de animar o público em dia de clássico Porto-Sporting. Foto: Maria Campos

Os últimos clássicos foram acompanhados ao ritmo das palmas do público, com “Um contra o outro” e “Fado toninho” e apercebeu-se, desde logo, o carinho especial tido por estas músicas, que são a imagem de marca da banda.

Ana Bacalhau e os seus colegas fecharam com a melancolia de “Dançar de olhos fechados”. A vocalista apresentou os elementos que compõem o grupo e, quando Pedro da Silva Martins mencionou o nome da cantora, ouviram-se gritos de êxtase de algumas pessoas, e todos se levantaram, uma última vez, para a derradeira homenagem à banda.

Os Deolinda continuarão em digressão pelo país, mas a contar pela fantástica receção que tiveram neste regresso aos coliseus, dir-se-á que a probabilidade de a banda regressar num futuro próximo é grande.

Texto editado por Rita Neves Costa