A Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP) estreou este ano letivo uma Academia de Andebol para crianças dos 4 aos 15 anos, com o apoio da Associação de Estudantes e do Centro de Investigação (CIFI) da faculdade.
O projeto pretende dar aos estudantes de desporto um lugar para evoluíram como futuros treinadores, bem como criar a consciência da prática de exercício físico nos mais novos e levar mais adeptos à modalidade.
A transferência prática de saberes
Luísa Estriga é professora de andebol na FADEUP e coordenadora principal da Academia de Andebol. “A ideia já vem sendo cozinhada há algum tempo”, conta. Aliada a José António Silva, também docente na faculdade, decide criar um projeto para fazer frente à necessidade de melhor acompanhar os alunos que se preparam para treinar equipas.
Ao longo do curso, os estudantes são colocados em clubes desportivos da cidade, onde estagiam. Mas José Silva diz que, dentro dos clubes, “nem sempre o acompanhamento que eles têm é suficiente”. Assim, decidiram criar um lugar onde “houvesse espaço para eles experimentarem o treino em diversas situações, para cometerem erros e corrigi-los” sob supervisão, acrescenta o professor.
A iniciativa arrancou no primeiro semestre do ano letivo, onde os oito estudantes de uma unidade curricular de andebol foram convidados pelos docentes a percorrer algumas escolas primárias do Porto a dar aulas de andebol. Beneficiando das instalações da FADEUP, em janeiro, o projeto passa a ser desenvolvido num dos pavilhões da faculdade, onde participam crianças dos 4 aos 15 anos.
“Isto é um laboratório vivo, para as crianças e para os nossos alunos”, diz José Silva.
Paulo Costa tem 20 anos e está atualmente no terceiro ano da licenciatura em desporto, na FADEUP. Já conta vários anos ligado à modalidade. Como membro ativo no projeto, Paulo confessa que tem ganho mais experiência como treinador desde o início e que isso pode definir o seu desempenho num futuro emprego. O aluno confessa achar a iniciativa um motor para o aumento do número de pessoas ligadas ao andebol. “A nível de praticantes, acho que quantos mais projetos assim houver, mais depressa as pessoas alinham nesta modalidade”, afirma.
Na turma de Paulo, que integra a equipa de alunos-formadores da Academia, está Miguel Vieira, de 21 anos. O aluno diz que “no início, não estava a achar o papel de treinador tão interessante”, por “ter passado tantos anos como atleta”. Mas confessa que “esta experiência tem mudado isso”.
Luísa Estriga relembra que o papel dos professores neste projeto passa apenas por serem “facilitadores dessa aprendizagem”.
De alunos para pequenos aprendizes
Ensinar a modalidade a crianças pode ser um desafio, mas a coordenadora principal da Academia de Andebol diz que há apenas um objetivo: “queremos que joguem andebol. Não interessa se são pequeninos, grandes, gordos, altos, se têm ou não poder económico e social”.
O Diogo tem 8 anos e faz parte da Academia há cerca de dois meses. Assim que o pai descobriu a iniciativa, propôs-lhe entrar e não hesitou na resposta. “Gosto de andebol e quero aprender cada vez mais. Para mim, é o melhor desporto de todos”, confessa.
Os pais esperam nas bancada. A Joana, de 14 anos, contabiliza agora o quarto mês de treinos. Na escola, ganhou o gosto pelo andebol, mas entrou na Academia para aperfeiçoar as suas capacidades. “Temos que trabalhar bastante para conseguir o que queremos, ou não chegamos lá”, conta.
Do lado dos treinadores, a tarefa também pode ser complexa. Paulo Costa confessa que não é fácil recuar no conhecimento que já leva da modalidade para ensinar as bases, mas sabe que o papel de treinar passa por esse exercício.
Luísa Vieira já soma 15 anos como professora na FADEUP e tantos outros como treinadora e atleta de andebol fora da cidade. Anos mais tarde, resolveu voltar. A professora de andebol recorda a presença de alguns maus treinadores que passaram por ela e que a fizeram regressar com a “missão de ensinar aos outros com um sentimento muito forte de sentido de vida”.
A coordenadora sublinha as diferenças entre a Academia e os clubes tradicionais. Uma média de três a quatro crianças por treinador resulta numa atenção maior e mais personalizada. “A prática deles é muito estudada, porque cada aluno tem um pequeno grupo de trabalho. A atenção e dedicação é muito maior. Para além da supervisão”, revela.
Para Luísa, num clube tradicional impera a lógica do rendimento em detrimento da preocupação com a formação, o que por vezes não permite a qualidade do crescimento.
“O desporto é feito de homens para homens”
Como mulher, a antiga treinadora e atual professora de andebol da FADEUP revela algumas dificuldades encontradas pelas mulheres na modalidade. Luísa Estriga considera que o desporto, no geral, está desenhado para o sexo masculino e que “é difícil uma mulher ter igualdade de oportunidades em comparação com os homens”.
Em conversa com o JPN, deixa alguns relatos de alunas que se sentiram descriminadas nos clubes onde exerceram o papel de treinadoras. “Elas são treinadoras em equipas onde não existe competição. A partir do momento em que há competição, elas são substituídas por um homem. É mais fácil uma mulher ter uma boa carreira como treinadora numa equipa feminina. Mas também é muito mais fácil para um homem conceber uma boa carreira numa equipa feminina do que é para uma mulher”, revela. Algumas das alunas acabam até por desistir da continuidade na profissão.
Apesar do cenário, Luísa mostra-se otimista: “Devagarinho, lá chegaremos”. Na equipa da Academia, metade das crianças presentes são do sexo feminino.
Quanto ao futuro da Academia de Andebol, o coordenador José António Silva diz que “vai ser o público-alvo que vai aparecer” que o vai determinar. No entanto, Luísa Estriga reforça o caráter laboratorial da iniciativa, esperando que, a longo prazo, a experiência permita concretizar estudos de medição de esforço físico, analisar métodos de jogos e o desenvolvimento dos jovens na modalidade.
Artigo editado por Filipa Silva