Foi na Faculdade de Economia da Universidade do Porto, onde é professor, que o JPN esteve à conversa com Álvaro Santos Almeida. O candidato independente, que conta com o apoio do PSD, à Câmara Municipal do Porto teceu várias críticas ao atual executivo. Para o professor universitário, a união entre o movimento de Rui Moreira e o PS é uma “coligação não natural”. Se for eleito, não considera coligações.
Para já, as prioridades do candidato são o trânsito, a ação social, a habitação e o ambiente. A candidatura só é oficializada a 8 de abril.
O que o motiva a candidatar-se à Câmara Municipal do Porto?
Essencialmente, a perceção enquanto cidadão que tem de viver todos os dias nesta cidade de que as condições de vida se estão a degradar e que podiam ser muito melhores. A minha maior motivação é fazer um Porto melhor, um Porto que seja mais agradável para todos. Não que não seja uma cidade muito agradável e interessante, mas podia ser melhor. E, sobretudo, nos últimos anos, tem piorado. É esse o ritmo que nós queremos inverter.
Fala várias vezes de Rui Rio. Como analisa os mandatos do ex-presidente da CM Porto?
Foi um período em que o Porto cresceu bastante. Em que se preparou a transformação da cidade e do centro histórico num pólo turístico e num destino interessante. Foi durante esse período que se criaram as condições e se lançaram as bases de um processo que depois continuou. Mas foi graças a essas intervenções que se melhorou bastante a cidade.
E conta com o apoio dele?
É uma questão que terá de colocar a ele.
Surpreendeu-o a eleição de Rui Moreira em 2013?
Tendo em conta as sondagens iniciais, sim. Agora, não surpreendeu na medida em que ele se apresentou como herdeiro de uma tradição que depois não cumpriu e não respeitou. Na altura, era apelativo. Mas o que se verificou foi que não respeitou essa tradição e que não cumpriu o programa que apresentou e, portanto, foi uma desilusão desse ponto de vista.
“A coligação é a principal responsável por essa deterioração da qualidade de vida na cidade.”
Considera que a coligação entre Porto, Nosso Partido e PS foi benéfica para a cidade?
Não, não foi. Primeiro, porque foi essa a coligação que governou o executivo municipal nos últimos três anos e, como disse, nesse período a cidade piorou. A coligação é a principal responsável por essa deterioração da qualidade de vida na cidade. Para além disso, é responsável pelo facto do programa com que Rui Moreira se candidatou não ter sido executado, ter sido antes executado o programa do PS. E, ainda por cima, como é uma coligação que não era natural, que não estava prevista e que não foi aquilo em que as pessoas votaram, não funciona. É uma coligação do imobilismo e é por isso que nos últimos três anos nada de relevante para além do marketing aconteceu na cidade do Porto.
Mas há áreas em que considera a atuação do executivo positiva?
Há. No início, o executivo teve uma dinâmica muito interessante na área da cultura. Gostei muito dos primeiros anos deste mandato nessa área. Naturalmente, [o executivo] não faz tudo mal. O problema principal é fazer muito pouco. É um executivo que não atua no interesse dos cidadãos. Para além da cultura, não há assim muito mais em que tenha havido uma atuação positiva. Há muitas coisas que estavam bem e o executivo não estragou, como, por exemplo, o turismo, o que já não é mau. Outras [áreas] estragou claramente, como é o caso do trânsito, que está caótico. A segurança está ainda pior… Em termos de crescimento e dinamismo económico, também houve uma inversão da tendência de crescimento que vinha do tempo do doutor Rui Rio. Portanto, houve aspetos positivos, certamente, mas os negativos são muito maiores.
O que pode trazer de novo enquanto presidente da câmara do Porto?
Uma câmara que funcione. Uma câmara que resolva os problemas dos portuenses, que resolva os problemas de quem vive na cidade e cuja prioridade não seja a imagem. Uma câmara cuja prioridade não seja fazer festas, mas sim garantir que os cidadãos do Porto vivam cada vez melhor.
Diga-nos três áreas a que dará prioridade se foi eleito.
Trânsito. Ação Social. E a terceira, estou hesitante… Habitação ou reabilitação urbana, eventualmente. Mas também o ambiente, em particular, as infraestruturas ambientais, por exemplo, na qualidade das limpezas das ruas e dos jardins… São quatro áreas a que daria prioridade.
E três medidas que aplicaria de imediato?
A primeira medida que eu aplicaria seria uma reorganização do funcionamento da câmara para que ela consiga abrir-se mais aos cidadãos e responder às suas necessidades. A câmara do Porto era a 26ª câmara do país em termos de transparência, em 2013, quando este executivo tomou posse. No último ranking de transparência municipal, passou para 141º. Ou seja, houve um fechamento da câmara às necessidades dos cidadãos, que tem de acabar. Será por aí que eu vou tomar a primeira medida, aquela que está “mais à mão”, chamemos-lhe assim, que é a de abrir a câmara aos cidadãos, de aumentar a transparência e garantir que os cidadãos do Porto sabem o que se está a passar.
Há mais alguma medida que aplicaria de imediato?
Teríamos de ver que problemas dos cidadãos são os mais urgentes, porque aquilo que será a nossa prioridade é resolver os problemas dos cidadãos. Consoante aqueles que forem os problemas mais urgentes na altura, esses são os que receberão a minha prioridade. Mas, como já disse, há um problema importante que é o trânsito, que merece uma atenção especial.
Neste momento, o turismo tem um peso muito relevante na economia da cidade. É possível ser melhor ou a cidade já atingiu um limite nesta área?
Eu não diria que atingiu um limite. A cidade tem um bom dinamismo na área do turismo, felizmente. Porque, se não fosse esse dinamismo, estaríamos muito mal. O turismo tem essa vantagem, dá um contributo extremamente positivo e fundamental. Não podemos, ou não devemos, esperar que haja menos turismo do que há, porque isso teria um impacto negativo na vida da cidade. Agora, o que nós não podemos é tornar o turismo como a única razão de ser da cidade. É uma parte importante, que tem de ser não só defendida, como alimentada e acarinhada. Mas não pode ser mais importante do que a qualidade de vida de quem cá mora e, por isso, temos de arranjar um equilíbrio entre as duas coisas.
Como pretende estimular a economia da cidade?
Em primeiro lugar, com uma câmara que responda às necessidades, uma câmara que não crie complicações. Pelo contrário, que facilite a vida das empresas que querem investir no Porto. Em segundo lugar, há alguma margem de manobra no domínio da fiscalidade e da parafiscalidade, ou seja, impostos e taxas, que tentaremos aproveitar para incentivar as empresas a optar pelo Porto, em vez de optar por outros destinos para os seus investimentos. E depois, acima de tudo, acarinhar as empresas que já estão no Porto para que elas não saiam da cidade, como infelizmente tem acontecido com muitas empresas nos últimos anos.
“Nós não podemos ter os bairros como ilhas, territórios isolados do resto da cidade.”
A CM Porto tem sob a sua alçada a gestão de mais de 40 bairros e agrupamentos habitacionais. Que mudanças prevê como necessárias no campo da habitação social?
A habitação social é uma área vasta e, como disse, é uma das áreas a que eu daria prioridade. O que é fundamental no caso dos bairros é que se consiga um equilíbrio. Nós não podemos ter os bairros como ilhas, territórios isolados do resto da cidade. O modelo ideal seria um modelo em que a transição não era notada por um visitante desconhecido, que não se aperceberia que tinha entrado num bairro. Não é isso que acontece em muitos bairros hoje, em que rapidamente se percebe que há ali um mundo à parte. Primeiro, temos de tentar eliminar essa separação e tentar integrar os bairros no tecido urbano do Porto sem que haja essa barreira, que não é física mas que é óbvia, que separa a vida dentro dos bairros da vida fora dos bairros. Para isso, é preciso uma integração social que, primeiro, assente no rigor, não no facilitismo: as pessoas têm de perceber que os bairros são deles. Como são deles, têm de tratar bem deles. Segundo, os bairros não podem ser zonas de exclusão social. As pessoas que lá moram não podem sentir que estão num mundo à parte e que estão condenadas, têm de sentir que têm as mesmas oportunidades que todos os outros.
Ao final de três décadas, começaram as obras no Bolhão…
Começaram as obras, não, que eu estive lá na semana passada e não havia obras nenhumas.
Deu-se início ao processo. Acha que está a ser bem gerido por parte da câmara?
Não, porque estamos em 2017 e as obras ainda não começaram. Para além disso, o projeto a que neste momento, foi dado início, é um processo demasiado longo. Vai implicar o afastamento dos comerciantes do Bolhão por, pelo menos, dois anos, o que pode pôr em causa o conceito e a mística do Bolhão, de tal maneira de que daqui a dois anos aqueles comerciantes já não têm nenhuma ligação aos seus fregueses e aos seus clientes. E aquela que era a ligação entre comerciantes, edifício e visitantes fica destruída por este afastamento. Esse é um risco importante, que existiria sempre, mas que seria menor se se tivesse avançado mais cedo e com uma duração menor.
Já teceu críticas acerca da nova linha Rosa do Metro do Porto. Não concorda com esta opção?
Se me explicarem o que vai mudar na cidade do Porto com isso, de profundo, talvez eu mude de opinião. Mas, neste momento, ainda ninguém me conseguiu explicar. O que nós sabíamos é que havia uma necessidade e havia muita gente a defendê-lo, incluindo o atual presidente da câmara, de construir uma linha de metro na zona ocidental do Porto. O cidadão Rui Moreira bateu-se ativamente por essa linha, no que esteve bem, porque, de facto, era uma linha fundamental. O que não se compreende é que a Metro do Porto e a câmara aceitem que esse eixo estruturante da cidade seja abandonado em troca de uma linha que não é uma linha, são duas estações, porque as outras já existem. Não vai haver um automóvel a deixar de ir para o Porto por causa dessa nova linha Rosa.
O que faria de diferente?
A partir de agora, não é fácil porque a decisão já está tomada. Se fosse antes, certamente que me bateria contra a opção do governo para que não fosse escolhida uma linha que tivesse maior frequência, visto que foi esse o critério usado. Escolheria sim uma linha que resolvesse os problemas da cidade e essa era, claramente, a linha do Campo Alegre.
E relativamente à questão da descentralização. Qual acredita ser o rumo a tomar em relação às CCDR e às áreas metropolitanas?
Eu defendo o princípio da subsidariedade, ou seja, que o poder de decisão deve estar o mais perto possível dos cidadãos. Logo, há necessidade de haver um grande conjunto de decisões que está ao nível do município, mas há também outras decisões que estarão ao nível de um meio intermédio, entre o município e o governo central. Isto porque há questões como o transporte na área metropolitana do Porto que não podem nem devem apenas ser decididos por municípios mas sim por todos os que são afetados. A partir do momento em que se considera que tem de haver uma comissão de coordenação como instrumento intermédio entre governo central e municípios, ela tem de ser eleita pelo povo da região afetada por essa eleição. Mas é eleita pelo povo, não indiretamente via municípios.
“Só nas ditaduras é que não há regionalização.”
Portanto é favorável a um processo de regionalização?
A regionalização é uma característica que não só está na Constituição, como também a vemos em qualquer país desenvolvido. Só nas ditaduras é que não há regionalização. Só nas ditaduras é que o poder central tem medo da existência de poderes regionais que vão pôr em causa o seu totalitarismo. Portanto, a regionalização é uma forma de democracia. É um imperativo da democracia.
Rui Moreira considera a Universidade do Porto a melhor instituição da cidade. Partilha desta visão?
Sendo professor da Universidade do Porto, mau era se não pensasse assim. Não sei se é a melhor instituição da cidade, mas sei que é a melhor universidade do país e é certamente um dos pontos fortes da cidade do Porto, com capacidade de ser uma fonte de conhecimento e formação. É certamente um atrativo e um pólo de dinamismo na cidade que nós temos de saber aproveitar melhor do que tem sido.
O caso Selminho foi possivelmente o caso mais sensível do mandato de Rui Moreira. Considera que o presidente geriu bem o caso?
Tem de haver transparência em tudo. Se há dúvidas, têm de ser esclarecidas. É tudo o que tenho a dizer sobre isso.
Durante o mandato de Rui Moreira, houve vários episódios que revelaram falta de unidade da bancada do PSD. O mais evidente foi aquele protagonizado por Ricardo Valente, que acabou como vereador com a pasta da Economia. Como é que analisa o comportamento dos vereadores do PSD neste mandato?
O PSD é um partido plural. Não sou militante do PSD e, portanto, não me vou pronunciar sobre a vida interna do partido.
Mas considera que beneficiou a coligação?
A única coisa que digo sobre isso é que o executivo atual não é o executivo que o Porto precisa. O Porto tem a possibilidade e tem o direito a ter um executivo que seja capaz de resolver os problemas dos cidadãos e, portanto, este executivo, com a sua composição atual ou a sua inicial, não é um bom executivo.
Se não for eleito, vai ficar como vereador?
Sem pelouro na oposição, sim.
Admite coligações pós-eleitorais?
Uma das razões pelas quais este executivo não funciona é que assenta em coligações não naturais. Portanto, eu dificilmente vou contribuir para agravar o problema com mais coligações não naturais.
Como pensa derrotar Rui Moreira?
Apresentando aos cidadãos do Porto um projeto alternativo, que seja capaz de melhorar a vida desses cidadãos. É essa a nossa estratégia, é mostrar que temos soluções para os problemas e que essas soluções são capazes de fazer com que os cidadãos do Porto vivam melhor.
Artigo editado por Filipa Silva